Divisão entre palestinos complica crise
Por Marcelo Ninio, na Folha:Em meia hora de conversa com uma delegação de deputados europeus, na elegante sala de espera de seu gabinete, em Ramallah, o toque do celular obriga Salam Fayad a se desculpar três vezes. “Lamento, mas vou ter que atender.”Após um diálogo curto, de respostas monossilábicas, o primeiro-ministro palestino explica aos convidados, […]
Em meia hora de conversa com uma delegação de deputados europeus, na elegante sala de espera de seu gabinete, em Ramallah, o toque do celular obriga Salam Fayad a se desculpar três vezes. “Lamento, mas vou ter que atender.”
Após um diálogo curto, de respostas monossilábicas, o primeiro-ministro palestino explica aos convidados, com semblante fechado: “Estou sendo atualizado ao mesmo tempo sobre Gaza e Ramallah. A situação é muito tensa”.
Fayad recebe os parlamentares no novo e superprotegido prédio em que chefia o governo palestino, justamente no momento em que terminam as orações de sexta-feira nas mesquitas de Ramallah e de outras cidades da Cisjordânia e a polícia se prepara para mais uma série de demonstrações contra os ataques na faixa de Gaza.
A preocupação de Fayad com as duas “frentes” reflete o dilema que a Autoridade Nacional Palestina (ANP) enfrenta desde a vitória eleitoral do Hamas, em 2006, e que assumiu feições ainda mais problemáticas desde o início da ofensiva de Israel contra os fundamentalistas.
“A situação é catastrófica do ponto de vista humanitário”, diz Fayad no encontro com os parlamentares, o qual a Folha presenciou. “A destruição da infraestrutura de Gaza é sem precedentes. Vocês podem imaginar a raiva das pessoas. Ao mesmo tempo, temos que impedir que o caos se instale.”
Economista respeitado, com formação em universidades americanas e passagens por Banco Mundial e FMI (Fundo Monetário Internacional), Fayad foi nomeado primeiro-ministro em junho de 2007, depois que uma miniguerra civil em Gaza deu proporções geográficas à divisão política palestina. Desde então, o laico Fatah controla a Cisjordânia, e o islâmico Hamas, a faixa de Gaza.
Cessar-fogo
Candidato independente nas eleições de 2006, que provocaram um terremoto na região ao dar a vitória ao Hamas, Fayad é visto como um administrador competente, sem laços políticos com nenhuma das facções.
Mas no cenário de desconfiança que tomou conta da política palestina, independência e neutralidade parecem coisa do passado. Apontado para um cargo que o Hamas conquistou nas urnas, Fayad não perdoa a recusa dos fundamentalistas em aceitar o cessar-fogo proposto pela ONU.
“É perturbador. Diante da extensão de destruição em Gaza, o mais importante agora deveria ser um cessar-fogo imediato, que pudesse salvar vidas”, diz Fayad, que também não poupa críticas a Israel. “Se Israel tivesse cumprido os acordos assinados, não estaríamos nesta situação.”