Discursos um tanto fora do lugar
Por Renata Veríssimo, no Estadão. Volto depois: O ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Miguel Jorge, afirmou, nesta quinta-feira, 17, que as empresas ineficientes e obsoletas morrerão com o processo do câmbio valorizado. Segundo ele, será um processo parecido com o que ocorreu há mais de dez anos, quando a inflação começou a cair […]
O ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Miguel Jorge, afirmou, nesta quinta-feira, 17, que as empresas ineficientes e obsoletas morrerão com o processo do câmbio valorizado. Segundo ele, será um processo parecido com o que ocorreu há mais de dez anos, quando a inflação começou a cair e o sistema financeiro ficou em grande dificuldade.
“Eu acredito que um número mínimo de empresas, as mais velhas, as mais obsoletas, as que não investiram, as que têm problemas de velhos equipamentos podem morrer nesse processo, que é normal em todo o setor da economia, como aconteceu com os bancos que morreram no fim do período de inflação”, disse Miguel Jorge, que participou da reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social.
Segundo o ministro, naquele momento, os bancos ficaram quase “nus” e as ineficiências apareceram. “Com esse dólar desvalorizado, as ineficiências do setor produtivo agora estão aparecendo. São ineficiências que temos de enfrentar como foi no caso do sistema financeiro”, disse.
Ele lembrou que vários bancos grandes e importantes fecharam ou foram vendidos porque não tinham se adaptado ao processo de queda da inflação. Miguel Jorge citou os casos dos bancos Mercantil, Nacional e Econômico. “Algumas empresas morrerão com este processo do câmbio”, ressaltou.
Banco CentralAo ser questionado se o País estaria preparado para enfrentar um câmbio de R$ 1,95 por dólar, o ministro respondeu: “precisa estar preparado para isso”. Ele destacou que embora tenha havido uma valorização do real, as exportações aumentaram em abril. “Por mais paradoxal que pareça, está sendo feita uma revisão das exportações este ano para um pouco mais do que estava previsto no início do ano”, disse.
Para o ministro, está havendo uma compensação, já que alguns setores podem se beneficiar do aumento das importações mais baratas de equipamentos e insumos de produção. Disse também que a desvalorização do dólar é um problema enfrentado em todo o mundo e que os países emergentes sofrem um pouco mais que os já capacitados. Para o ministro, nenhum banco central no mundo pode conter esta desvalorização.
Voltei
O ministro Miguel Jorge é um homem inteligente, sensato e anda de acordo com, como dizer?, a história dos ciclos econômicos quando afirma que algumas empresas acabam desaparecendo mesmo… É, é assim que as coisas acontecem. Mas não acho que deva se candidatar a substituto de Henrique Meirelles. É um cargo, me parece, mais difícil.
O que quero dizer com isso? Que os ministros têm áreas. Se não fica bem a Meirelles falar, sei lá, sobre o comportamento do setor calçadista, acho imprudente que o do Desenvolvimento Econômico reaja, digamos, com essa dureza à reclamação, bastante compreensível, de alguns setores da economia. Será que os que estão reclamando o fazem por nada, à espera só de benefícios e de prebendas?
Acredito que eventuais medidas para evitar que determinados setores sejam especialmente atingidos pela valorização do real deveriam estar sob os cuidados de Miguel Jorge, não de Guido Mantega. Mais: Miguel Jorge fez o que nem Meirelles faz: conjecturas sobre o valor do dólar. Indagado se pode chegar a R$ 1,95, diz que é preciso que o país se prepare para isso. Não serei eu a lembrar a Jorge que existe especulação… Como disse um expoente do mercado financeiro com quem falei ontem, “nunca foi tão fácil”. Acho que não. Mesmo.
Não! Eu não quero um ministro do Desenvolvimento que fique falando mal da política econômica. Aliás, qualquer um que faça isso tem de ser demitido —governo é governo e deve ter uma linha. Mas eu tenho certeza: Miguel Jorge não faria mal nenhum, a não ser eventualmente à sua vaidade, se dissesse duas coisas:
– Tenho a certeza de que o Brasil vai se adaptar às novas circunstâncias do mercado;
– Não me cabe especular sobre a cotação do dólar. É por isso que o câmbio é flutuante.
E pronto.