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Reinaldo Azevedo

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Blog do jornalista Reinaldo Azevedo: política, governo, PT, imprensa e cultura

Clivagem: Lula divide o país entre pobres e pobres

Há uma reportagem interessante na Folha deste domingo. Mais pelo que acaba escondendo do que pelo que acaba revelando. Ficamos sabendo, em texto de Flavia Marreiro e Rafael Cariello que “são os eleitores com renda familiar de até dois salários mínimos que garantem a liderança do presidente Luiz Inácio Lula da Silva diante de Geraldo […]

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 6 jun 2024, 08h30 - Publicado em 8 out 2006, 08h18
Há uma reportagem interessante na Folha deste domingo. Mais pelo que acaba escondendo do que pelo que acaba revelando. Ficamos sabendo, em texto de Flavia Marreiro e Rafael Cariello que “são os eleitores com renda familiar de até dois salários mínimos que garantem a liderança do presidente Luiz Inácio Lula da Silva diante de Geraldo Alckmin (PSDB)”. E continua o jornal: “Se Lula, no total de entrevistados, tem 50% das intenções de voto contra 43% das preferências para Alckmin, ele no entanto só mantém a dianteira em apenas uma das quatro faixas de renda pesquisadas. Entre os que têm renda mais baixa, o petista registra 59% das intenções de voto, contra 34% para Alckmin. Já entre os eleitores que compõem a faixa dos 2 aos 5 salários mínimos, o tucano aparece com 49%, e Lula, 45%. Entre 5 e 10 salários mínimos, o candidato do PSDB tem 51%, e o do PT, 41%. Na faixa dos que têm renda de mais de 10 salários, Alckmin aparece com 69%, contra 24% de Lula.” A tentação de dizer que Lula é o candidato dos pobres, e Alckmin, dos ricos, é enorme.

Trata-se de uma empulhação formidável — não da reportagem, mas de interpretações que andam por aí. Imaginem vocês: um salário mínimo vale R$ 350. Na faixa dos que ganham 2,5 mínimos — a fabulosa soma de R$ 875, antes dos descontos —, a liderança já é do candidato tucano. Não, calma! Falemos dos “ricos” que ganham cinco mínimos (R$1.750, o suficiente para morar em dois cômodos na periferia): Alckmin lidera com 10 pontos percentuais de vantagem.

Desconsidera-se que no total dos que ganham “ATÉ” dois mínimos, estão os beneficiários do Bolsa Família, que chega 11 milhões de famílias — estima-se que perto de 40 milhões de pessoas. Quantas são eleitoras? Esse voto vale menos? Não. Mas é preciso qualificar o debate. Onde parece haver o candidato dos “ricos” contra o candidato dos “pobres”, há o candidato dos pobres, sim, mas também da indústria da miséria, contra o candidato dos “ricos”, sim, mas também dos pobres. O texto da Folha, que procura ser seco e informativo, não evita a tentação e crava: “De certo modo, Lula tinha razão ao dizer que pode ‘andar pelas pernas’ do povo.” É…, só “de certo modo”, mas muuuuuuito de “certo modo”. A menos que passemos a chamar “ricos” a massa de assalariados que recebe, por exemplo, R$ 1 mil por mês (antes dos descontos…).

Os números servem antes para evidenciar a falsa clivagem que Lula criou no Brasil, típica de modelos de governo populistas, com forte sotaque autoritário — esta segunda parte se percebe menos, embora eles tentem; é que são atrapalhados. A matéria serve a reflexões mais amplas. Já demonstrei aqui, em outras ocasiões, como o “modelo Lula” contribuiu para elevar o poder de compra dos salários mais baixos, mas como condenou, igualmente, o país à mediocridade. Com o crescimento pífio, diminuem as chances de os pobres “andarem pelas próprias pernas”, já que são obrigados a sustentar o “peso Lula”. Tornam-se cativos da assistência.

Esse é o modelo que a esquerda aplaude. Eu nunca duvidei que um esquerdista autêntico quer mesmo é escravizar os miseráveis. O jornal lembra que Lula nega querer dividir o país entre pobres e ricos. Eu acho que Lula fala a verdade. Até agora, o que ele conseguiu foi dividir o país entre pobres e pobres. Os muito ricos, especialmente os com-banco, estão com o PT. São tão poucos que não aparecem nas estatísticas. Nada ilude tanto a verdade quanto uma mentira posta em números. Para ler mais, clique aqui, aqui e aqui.

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