As promessas que Dilma já não cumpriu e as que ela não vai cumprir
A Folha deste domingo trouxe uma reportagem impressionante de Gustavo Patú sobre “os governos” Dilma. Escrevo, assim, no plural porque, afinal, eu acreditei no que ela e Lula disseram durante a campanha: ela governou com Lula, foi a grande gerente, no tempo em que ainda não havia virado “rainha” (ver texto acima). Antes que comente […]
A Folha deste domingo trouxe uma reportagem impressionante de Gustavo Patú sobre “os governos” Dilma. Escrevo, assim, no plural porque, afinal, eu acreditei no que ela e Lula disseram durante a campanha: ela governou com Lula, foi a grande gerente, no tempo em que ainda não havia virado “rainha” (ver texto acima). Antes que comente o texto de Patú, algumas considerações sobre jornalismo.
Antigamente, um texto com esses dados seria candidato a manchete. A Folha escolheu a crise no Egito. Vá lá. Talvez eu tivesse feito o mesmo. Incompreensível é que a questão tenha merecido só uma menção lá no pé da página. Patú é bom na sua área, bastante técnico. No caso do texto, talvez técnico demais, o que dilui o impacto político do que noticia. Mas a radiografia, para quem lê tudo com atenção, impressiona. Querem ver? Seu texto segue em preto. De vez em quando, faço algumas intervenções em azul.
*
Atrasos herdados da administração anterior e a necessidade de cortar investimentos para equilibrar as contas do governo ameaçam algumas das principais promessas da campanha eleitoral da presidente Dilma Rousseff.
Acho que a expressão “administração anterior” dá um viés excessivamente “despolitizante” ao texto. Não há “administração anterior” no sentido político da expressão, certo? O eixo da campanha eleitoral é que passaríamos do governo Lula-Dilma para o governo Dilma. Como vocês verão, não são só as promessas de campanha que estão ameaçadas. A agora presidente Dilma, quando ministra Dilma, não entregou o que prometeu.
Manter em dia o cronograma de realizações significa construir, só neste ano, 3.288 quadras esportivas em escolas, 1.695 creches, 723 postos de policiamento comunitário, 2.174 Unidades Básicas de Saúde e 125 Unidades de Pronto Atendimento, além de centenas de milhares de moradias subsidiadas para a população de baixa renda.
Vejam com é fácil fazer obra com saliva no horário eleitoral gratuito, que nós pagamos…
As metas constam do planejamento oficial que embasou a elaboração do Orçamento deste ano – até hoje não sancionado pelo Planalto, o que reduz a virtualmente zero a possibilidade de liberar dinheiro público para novos projetos.
Fora os compromissos de apelo popular mais imediato, há ainda R$ 7 bilhões destinados a novas obras em rodovias, ferrovias, portos, irrigação e saneamento, igualmente incluídas na segunda etapa do Programa de Aceleração do Crescimento, batizada de PAC 2.
Completar um mês sem iniciar investimentos é usual para um começo de administração, mesmo no caso de um governo de continuidade. A equipe econômica, porém, já prepara o terreno para uma demora maior.
É preciso combinar dois objetivos: o fiscal – bloquear despesas e elevar os recursos para o abatimento da dívida pública, desde 2009 abaixo do prometido – e o gerencial – encerrar a lista de obras e projetos prioritários inacabados, grande parte deles coordenados pela própria Dilma nos tempos de ministra-chefe da Casa Civil.
Como se nota, uma informação relavantíssima está aqui, devendo, quem sabe, num texto mais adequadamente “politizado” e “politizante”, estar lá no alto. As promessas eleitorais e as previsões orçamentárias foram feitas ignorando-se tudo o que não foi entregue. E não é pouca coisa.
Em um cenário de recursos escassos, as obras já em curso ganham primazia, como já indicaram a Fazenda e o Planejamento. Mais delicado politicamente seria citar pelo nome os candidatos a serem preteridos.
O exemplo de maiores proporções é o da segunda etapa do programa habitacional Minha Casa, Minha Vida, que pretende viabilizar a construção e a aquisição de 2 milhões de casas e apartamentos até 2014.
Há R$ 12,7 bilhões autorizados no Orçamento de 2011 para a iniciativa, de longe o maior volume destinado a um programa de caráter não permanente nem obrigatório.
Mas, ainda que escape dos cortes a serem anunciados até março, a verba terá de acomodar também R$ 9,5 bilhões em despesas que ficaram por ser executadas da primeira etapa do Minha Casa – na qual as moradias efetivamente concluídas não chegaram a um quarto do 1 milhão contratado no papel.
O “não chegam a um quarto”, que eu saiba, significa algo em torno de 15%. Vale dizer: Lula e Dilma prometeram entregar um milhão de casas (inicialmente, até 2010; depois, sem data definida) e deixaram de cumprir 85% do prometido. Na campanha, dobraram o delírio: 2 milhões. Isso quer dizer que, até 2014, Dilma terá de construir os dois milhões de casas da campanha eleitoral e as 850 mil do mandato passado…
O mesmo acontece com as novas Unidades de Pronto Atendimento, os prontos-socorros 24 horas que estrelaram a plataforma petista para a saúde. Os recursos reservados para iniciar as 500 UPAs programadas até 2014 terão de disputar espaço com a conclusão das outras 500 que deveriam ter sido entregues até 2010. Pelos dados do Ministério da Saúde, apenas 91 UPAs estavam em funcionamento até o início de dezembro.
Você pode não ter entendido direito, então vou destacar: o governo Lula havia prometido entregar 500 UPAs até 2010. Entregou 91 — 18%. Tendo Dilma prometido mais 500, então está devendo agora 909!!!
Sintomaticamente, a bancada governista no Congresso ajudou a promover, sem alarde, um corte de 15% nos recursos para as UPAs e a construção de postos UBS (Unidades Básicas de Saúde) durante a tramitação do projeto de lei orçamentária.
Isso porque a Saúde seria uma prioridade absoluta. Vocês não cansaram de ver o povo feliz nas UPAs da Dilma, certo?
Maior ainda, de quase 35%, foi a redução da verba para a construção e adequação de quadras esportivas nas escolas de ensino médio, ação também classificada como prioritária, incluída no PAC 2 e repetida na campanha eleitoral.
Outro complicador é que todas essas metas – incluindo a construção de creches e de postos de policiamento – dependem da participação de governos estaduais ou prefeituras para elaboração de projetos, cessão de terrenos e custeio das unidades.
Pois é, essas são dificuldades que não apareceram agora e que sempre fizeram parte da equação. A creche serviu de mote para João Santana vender Dilma como a “mãe do Brasil”, depois que ele foi governado pelo pai.
Como não existe a grana, o marqueteiro decidiu transformar a “mãe” na rainha da Inglaterra.
Essa é uma matéria exclusiva para assinantes. Se já é assinante, entre aqui. Assine para ter acesso a esse e outros conteúdos de jornalismo de qualidade.
Essa é uma matéria fechada para assinantes e não identificamos permissão de acesso na sua conta. Para tentar entrar com outro usuário, clique aqui ou adquira uma assinatura na oferta abaixo
Informação de qualidade e confiável, a apenas um clique. Assine VEJA.
Impressa + Digital
Plano completo da VEJA! Acesso ilimitado aos conteúdos exclusivos em todos formatos: revista impressa, site com notícias 24h e revista digital no app, para celular e tablet.
Colunistas que refletem o jornalismo sério e de qualidade do time VEJA.
Receba semanalmente VEJA impressa mais Acesso imediato às edições digitais no App.
Digital
Plano ilimitado para você que gosta de acompanhar diariamente os conteúdos exclusivos de VEJA no site, com notícias 24h e ter acesso a edição digital no app, para celular e tablet.
Colunistas que refletem o jornalismo sério e de qualidade do time VEJA.
Edições da Veja liberadas no App de maneira imediata.