O melhor, para quem escreve, é sentir a reação dos leitores. Sempre no mesmo padrão de (relativo) preconceito. Quando se critica Lula, a gente é coxinha. Se falar mal de alguma reforma do governo, ou dos coxinhas, é petista. Paciência. Não tem jeito. Lembro quando fazia conferência na Assembleia Legislativa de Pernambuco. No meio da fala um cidadão, que se dizia ecologista, pediu a palavra. Concedi, claro. Ele me deu as costas (era só um aparte!) e, olhando para a plateia, começou: “Uns dizem que sou da CIA. Mas não sou da CIA. Outros dizem que sou da KGB. Mas não sou da KGB. E se não sou da CIA, nem da KGB, eu sou o quê?” Foi quando alguém, no meio da plateia, gritou: “És um idiota!!!!”. O barulho foi tanto que o coitado não conseguiu continuar. Bem feito. É quase meu caso. Não sou da CIA, nem coxinha, nem da KGB, nem petista, escusas. Só alguém que pensa com ampliação. Sem os limites impostos por lugares comuns, conveniências pessoais ou teses politicamente corretas.
Nesse escrever, tenho sempre apoio no amigo Fernando Pessoa (Ricardo Reis, Ode de 02/8/194): “E deixemo-nos crer/ Na inteira liberdade/ Que é a ilusão que agora/ Nos torna iguais aos deuses”. Por mais incompreensível que isso possa parecer, hoje. Outro dia escrevi artigo, Trágicas Vírgulas, sobre o novo lema proposto para Temer – O Brasil voltou 20 anos em 2. E os leitores se manifestaram, como sempre, muitos, e sempre de forma interessante. Mostrando que todos sofrem, de alguma forma, com virgulas e pontos. Seguem alguns exemplos:
• Ana Maria Machado, da ABL. “No caso do Fernando Henrique (Eu não sou contrário à privatização da Petrobrás), o que salvou a verdade foi que havia uma gravação, onde nitidamente era mais que vírgula. Era ponto, marcando uma pausa nítida e mudança de entonação: Eu não. Sou contrário à privatização da Petrobrás.”
• Cristovam Buarque, Senador. “Também sofri com ponto. Nas vésperas da eleição de 1998, dei uma entrevista ao Correio Braziliense onde disse: Não quero ficar conhecido como governador dos pobres ou dos ricos, mas de toda a família brasiliense. O jornal publicou: Não quero ficar conhecido como governador dos pobres. Mas de toda a família brasiliense. O meu opositor retirou a segunda frase e distribuiu a primeira, jogada aos milhares desde helicópteros. Perdi a reeleição”.
• José Mauro, escritor. “Certamente você conhece este teste, aplicado a quem pretenda ser virgulólogo. Eis a frase: Se o homem reconhecesse o valor que tem a mulher cairia a seus pés. Pois é. Ponha vírgula após TEM, e terá um significado; ponha vírgula após MULHER e… São muitos exemplos, né não?”.
• Margarida Cantarelli, presidente da APL, lembrou “Um Tratado Internacional, celebrado entre Brasil e Bolívia, que passou 20 anos para ser executado por causa de uma vírgula. Ressuscitou, não está aqui! Ressuscitou não, está aqui!”.
• Bartyra Soares, iluminada poetisa da APL. “Eis mais um: Matar o rei, não é crime. Matar o rei não, é crime”.
• Sem esquecer um tratado sobre gramática do ilustre desembargador Josué Sena, em belo soneto: “Imorrível, sendo advérbio mal,/ O adjetivo para uso,/ Na frase, do artigo, no sentir difuso,/ Não seria mau?/ Na vírgula, estou mal, confuso,/ Logo ela, tão essencial,/ Perdão, ó nosso idioma ancestral,/ Do Lácio e Luso./ Sim?, imorrível, essa grega pitonisa,/ Enganou o macedônio grande/ O General genial das falanges,/ Pobre, febril Alexandre,/ O sino triste de Matosinho plange,/ A vírgula é traiçoeira, avisa”.
José Paulo Cavalcanti Filho. jp@jpc.com.br