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O governo Bolsonaro

Haverá como dosar políticas liberais com o intervencionismo estatal em áreas vitais?

Por Gaudêncio Torquato
Atualizado em 30 jul 2020, 20h13 - Publicado em 28 out 2018, 14h00

Este texto sai pouco antes do resultado do pleito e está sujeito às intempéries do clima eleitoral, à gangorra das pesquisas e aos ventos do Senhor Imponderável das Neves. Pelas últimas consultas, não há tempo para estreitar a distância de votos que o separa do petista Fernando Haddad.

Sob essas ressalvas, faremos alguns apontamentos, a partir da vitória eventual de Jair Bolsonaro. A propósito, as observações poderiam ser dirigidas também ao candidato petista.

Primeiro, a mudança de patamar. Ele há de entender que será governante de todos os brasileiros, e isso exige altruísmo, compromisso cívico de tentar juntar os cacos quebrados na campanha e que teve como ferramenta uma linguagem desabrida e radical, defendendo um legado de terror, tortura e medo.

Se não resgatar a chama de pacifismo e bom senso, e continuar sob a expressão de expurgo de contrários – ameaçou líderes adversários -, poderá correr sangue pelas ruas.

Combate às mazelas de nossa cultura política – mandonismo, caciquismo, nepotismo, grupismo, enfim, fisiologismo – não combina com populismo. Conter custos, cortar cargos comissionados, atenuar a burocracia, reduzir o número de ministérios, são medidas que exigem coragem na esteira daquilo que prometia Tancredo Neves: “Meu primeiro decreto terá um único artigo- É proibido gastar”.

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Urge andar sobre o fio da navalha, escolhendo quadros técnicos qualificados e, ao mesmo tempo, atendendo demandas políticas. O presidencialismo de coalizão contempla repartição de poder. Mesmo assim, impõe-se o dever de preservar a operacionalidade da máquina, livrando-a de pressões de partidos e grupos.

Desafios enormes estão à vista: como compatibilizar a visão nacionalista dos militares, de um Estado forte e preservação de empresas estratégicas, e o anseio do Estado mínimo, de gosto do mercado, com conglomerados privados querendo abocanhar nacos das estatais? Haverá como dosar políticas liberais com o intervencionismo estatal em áreas vitais? Até onde Paulo Guedes poderá privatizar sem romper o casulo do nacionalismo militar?

Áreas sensíveis às massas estarão entre as prioridades, como a segurança. O choque que o novo presidente promete oferecer –, “bandido bom é bandido morto” –, tem condições de ser empregado? Essa questão envolve situações complexas, como forças mais bem preparadas (novas modalidades?), inteligência, maiores recursos, balanceamento entre ações preventivas e ofensivas, eficiente patrulhamento nas fronteiras etc. Por mais “atacante” de combater a bandidagem, não se espere melhoria no curto prazo.

O consumidor, o anônimo das ruas, o habitante das margens esperam por um bolso mais recheado, o sustento da família, condições de adquirir remédio, comida, livros da filharada, transporte, as coisas do sofrido cotidiano. Seriam atendidos antes de serem convocados pelos movimentos sociais?

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Vale enfatizar que as oposições, a partir do PT, estarão de olho nas curvas do novo governo. Querem ganhar fôlego e voltar a lutar pelo poder. Derrapadas eventuais ou atrasos no cronograma das ações serão motivo para a agitação das ruas.

Que Deus ajude o país!

Gaudêncio Torquato é jornalista, professor titular da USP e consultor político

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