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Por que a China impede até poderosos como Nancy Pelosi de ir a Taiwan?

A resposta mais simples é: porque tem a força. Ou seja, até os Estados Unidos seguem uma política de ambiguidade em relação à ilha

Por Vilma Gryzinski 3 ago 2022, 07h46

Para quem não fica grudado dia e noite no noticiário, é difícil entender as pressões e até as ameaças que a China fez aos Estados Unidos por causa da visita da presidente do Congresso, Nancy Pelosi, a Taiwan.

Quem fica, sabe que a China impôs ao mundo sua política de exclusão da ilha na qual, em 1949, as forças nacionalistas derrotadas na guerra civil pelos comunistas se refugiaram.

Na época, e por décadas subsequentes, a situação era inversa: Chiang Kai Shek, o líder nacionalista, continuou a ser reconhecido como o legítimo chefe de governo da China e a Ilha Formosa, assim chamada por navegadores portugueses que nela desembarcaram em 1516, representar o país na ONU.

Gradualmente, a situação foi mudando e a realidade se impôs. O regime comunista tinha o controle sobre o território de 9,5 milhões de quilômetros quadrados e os protestos dos nacionalistas de Taiwan – extensão: 36 mil quilômetros quadrados – não mudariam isso. Em 1972, os fatos foram consumados com a visita de Richard Nixon que normalizou relações com a China. Para compensar os aliados rejeitados, o Congresso Americano aprovou várias leis estabelecendo a ajuda militar maciça para Taiwan e o “não país” tem uma garantia implícita de defesa. Hoje, apenas quinze países, todos pequenos ou irrelevantes, reconhecem a ilha como sede da República da China.

A política americana de ambiguidade funcionou durante o tempo em que a China comunista esperou para levar adiante seu plano de “reunificação” – e para juntar o poder econômico e militar possibilitado pelas reformas de Deng Xiao Ping, que liberaram o empreendedorismo sob tutela do estado.

Hong Kong, “devolvida” pelos ingleses em 1997, contra garantias de manutenção de um status especial de respeito a liberdades públicas – deu no que deu – e Macau, o território onde os portugueses já eram quase inexistentes, em 1999, foram os primeiros passos. O próximo, todo mundo sabe e a China não faz questão nenhuma de esconder, ao contrário, é Taiwan, que tem 23 miIlhões de habitantes e um PIB per capita de deixar a matriz comunista babando de inveja – 25 mil dólares, ou 53 mil pelo critério de paridade de poder aquisitivo.

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Como a China pode “reabsorver” Taiwan sem provocar uma guerra, que muito possivelmente arrastaria os Estados Unidos?

Ninguém sabe responder esta pergunta, levada a um estado de ebulição pela decisão de Nancy Pelosi, a terceira pessoa na estrutura de poder dos Estados Unidos na condição de presidente da Câmara dos Deputados, de visitar Taiwan com uma delegação de liderados.

Pelosi foi corajosa ou temerária, expondo seu país a uma situação de alto risco num momento em que a guerra da Rússia contra a Ucrânia já deixa o mundo todo em estado de alerta, pelo risco de contaminação entre as duas superpotências nucleares?

O próprio presidente Joe Biden foi contra, indiretamente. “Acho que os militares acham que não é uma boa ideia no momento”, disse, sem coragem de assumir uma posição clara.

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Num momento raro, Biden coincidiu com Donald Trump, o campeão das sanções econômicas contra a China. “Ela só vai piorar as coisas”, espetou Trump.

Dois de seus principais ministros, quando era presidente, apoiaram Pelosi entusiasticamente. “Nancy, eu irei com você. Estou banido na China, mas não na Taiwan que ama a democracia. Te vejo lá”, tuitou o ex-secretário de Estado Mike Pompeo.

O ex da Defesa, Mark Esper, foi menos exuberante, mas igualmente incisivo: “Acho que se a presidente quer ir, deve ir”.

Uma pessoa que presida a Câmara dos Deputados dos Estados Unidos é mais importante do que um cônsul era em Roma e a ideia de que a China imponha condições a esse nível soa absurda. A ameaça feita por Xi Jinping  – “Quem brinca com fogo…” etc etc – parece mais escandalosa ainda.

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O fato é que, pelos princípios da realpolitik, Nancy Pelosi não deveria ter ido a Taiwan. Thomas Friedmann descreveu no New York Times a visita como “arbitrária e frívola”, com risco de detonar toda a contenção da China em relação à guerra na Ucrânia.

Pelos princípios dos Estados Unidos como defensores da liberdade e da democracia, ela fez muito bem em ir. Nem sempre a política externa deve obedecer apenas a interesses pragmáticos, principalmente a de uma superpotência que também “vende” valores.

Mas Pelosi não pode ignorar os riscos envolvidos. Além da guerra na Ucrânia, o momento é especialmente sensível para Xi Jinping, que precisa lustrar a imagem de líder forte depois dos problemas econômicos provocados pela política de covid zero, com lockdowns que se perpetuam. Em outubro, ele pretende sair ungido, mais uma vez, do vigésimo congresso do Partido Comunista.

É claro que, quando os representantes entram em sessão, já está tudo resolvido antecipadamente, mas a tensão pré-congresso aumenta a possibilidade de que Xi se sinta na obrigação de dar uma demonstração de força que saia dos parâmetros tacitamente aceitáveis.

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É aí que mora o perigo.

As manobras militares que começam amanhã são as mais intimidadoras já feitas pela China, inclusive com avanço sobre as águas territoriais taiwanesas. É um jogo ao qual Taiwan já se acostumou, mas sempre tem a possibilidade de uma surpresinha chinesa.

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