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O grande irmão vê tudo: no país de Xi, até tatuagens são controladas

Além de proibir desenhos corporais em jogadores de futebol, governo chinês espiona Twitter e Facebook e paga influencers estrangeiros

Por Vilma Gryzinski 3 jan 2022, 08h03

Ser rico já foi glorioso, quando Deng Xiaoping liberou o espírito animal do mercado para dar o fenomenal salto à frente da economia chinesa. Hoje, os ricos estão de farol baixo na China.

O governo de Xi Jinping está interferindo nada delicadamente no mercado, que se nunca foi livre, já teve mais autonomia.

Para não perder o controle e também manipular os sentimentos das camadas menos privilegiadas – 600 milhões de pessoas que ainda não “chegaram lá” e ainda vivem num universo de baixa renda, na faixa de 1 600 dólares por ano -, Xi Jinping promove um reajuste em larga escala, que alcança todas as esferas do país.

Economicamente, o projeto tem um slogan bonito, “Prosperidade para todos”. Em nome de controlar as desigualdades, inevitáveis quando alguns geram mais renda do que outros, vários dos “excessos” naturais da economia de mercado estão sendo contidos com a tradicional mão de ferro. Empresas do ramo financeiro que iam fazer oferta pública de ações desistiram da ideia, certamente não por iniciativa própria. As grandes construtoras sob risco de falência por endividamento impagável estão rapidamente se adaptando ao novo ambiente.

O grande reajuste tem também um aspecto moralizante, de retomada dos “valores revolucionários”. Cantores e artistas foram aconselhados a não imitar demais o visual e o comportamento dos vizinhos mais influentes nessa esfera, os sul-coreanos.

Nada é tão insignificante que escape ao olhar atento do grande irmão chinês. Jogadores da seleção nacional de futebol foram proibidos de fazer novas tatuagens. Os que já as têm, devem removê-las. O órgão que regula os esportes disse que está “estritamente proibido” recrutar novos jogadores tatuados.

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Proibir futebolistas de se tatuar é quase como impedi-los de fazer gols, mas esta é a realidade: um regime de partido único e forte pode tudo. Até proibir qualquer tipo de manifestação que evoque o espírito natalino, em nome da rejeição a tudo que não seja ligado à cultura tradicional chinesa. Aconteceu no último Natal e  afetou principalmente chineses que estudam inglês em escolas de idiomas e entrem em contato com as festividades cristãs – ou puramente consumistas, outro atrativo.

Aliás, as aulas particulares também foram proibidas, em nome de diminuir as desigualdades entre estudantes cujos pais podem bancar o reforço extracurricular e os sem recursos para isso. Um setor inteiro foi simplesmente varrido do mapa – o prejuízo foi calculado em 120 bilhões de dólares.

O alcance dos métodos de controle atinge níveis inacreditáveis. Os órgãos de inteligência monitoram manifestações de chineses no exterior que expressem a mais mínima oposição ao regime pelo Twitter ou o Facebook. Ambos não existem na China, mas são usados por chineses em outros países.

O New York Times publicou uma reportagem impressionante, com relatos de duas jovens chinesas que fizeram comentários favoráveis ao movimento pela democracia em Hong Kong.

Uma delas, estudante na Austrália, filmou o policial que convocou o pai dela à delegacia e, pelo celular dele, falou que deveria encerrar sua conta no Twitter. “Quando você voltar para a China, venha imediatamente aqui”, ameaçou. O pai, intimidado, encerra rapidamente a ligação quando colocado em contato com a filha.

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Outro método chinês: patrocinar influencers estrangeiros, americanos ou de outras nacionalidades, que escrevem blogs sobre viagens e apresentam uma visão em tudo favorável ao regime, inclusive sobre a situação dos uigures, a minoria étnica obrigada a praticar uma forma sancionada pelo estado da religião muçulmana.

A pandemia, que continua provocando lockdowns localizados, e o freio no mercado podem criar uma situação inusitada este ano: os Estados Unidos, com 4,6% de aumento do PIB, cresceriam mais do que a China, com 4,3%, segundo um dos prognósticos que estão sacudindo as visões habituais.

Um crescimento mais moderado é ruim para países que exportam commodities para a China – incluindo, claro, o Brasil, que mandava para 64% das exportações de petróleo, mais 59% dos minério de ferro, antes do atual crescimento menos exuberante.

“Nossa ideia é deixar algumas pessoas e algumas regiões ficarem ricas antes, para depois ajudarem a empurrar as regiões mais atrasadas”, disse Deng Xaoping em 1986.

Xi Jinping e a máquina partidária que o sustenta podem achar que está na hora de aumentar a “ajuda”. Ou, simplesmente, que a prosperidade individual havia chegado ao nível em que começa a colocar ideias sobre liberdade de forma geral na cabeça das pessoas.

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De qualquer maneira, as consequências para a China e para o mundo são gigantescas. As experiências históricas mostram que o igualitarismo geralmente reparte a miséria e não promove  prosperidade para todos, como diz hoje o slogan mais repetido na China, mas Xi Jinping até agora tem se mostrado um mestre na arte do pensamento estratégico. Se está proibindo até tatuagens é porque vê nisso vantagens políticas. Os incomodados que usem camisa de manga comprida, como alguns jogadores já estão fazendo.

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