Ditadura trans: de discriminados a discriminadores e antimulheres
É duro, mas temos que reconhecer que integrantes de uma camada vítima de preconceito extremo mostra intolerância e agressividade
Imaginem jovens do topo da elite branca que chamam de “lixo” um imigrante curdo que fugiu de seu país ainda criança quando Saddam Hussein lançou a brutal repressão à minoria no Iraque.
Foi isso que aconteceu com Nadhim Zahawi, secretário da Educação do governo conservador e ex-responsável pela bem sucedida operação para coordenar a criação, a distribuição e a aplicação em massa de vacinas contra a covid.
Ele precisou sair sob proteção de seguranças de uma palestra dada na Universidade de Warwick, a convite da Associação Conservadora.
Cerca de trinta ativistas gritavam que “Zahawi é transfóbico” e o chamaram de “tory scum”, ou lixo conservador.
Entre os manifestantes estava Joel Cooper, filho de altos figurões do Partido Trabalhista. Se o governo mudar, sua mãe, Yvette Cooper, será secretária do Interior. Seu pai, Ed Balls, ocupou o cargo equivalente ao de ministro da Fazenda.
Elegantemente, Zahawi disse que “este estudante foi muito educado comigo. Ele apresentou um argumento razoável a respeito de como as escolas podem ajudar crianças que eu teria prazer em debater. O direito dele à liberdade de expressão também é vital”.
Os vídeos mostram o contrário. Além de ser do Partido Conservador – e milionário criador do instituto de pesquisas YouGov -, o pecado de Zahawi, entre outros, foi dizer que mulher é um ser humano adulto do sexo feminino.
No ambiente atual de intensa rejeição às bases do sexo biológico, isso é um crime sem tamanho. Em nome da inclusão de mulheres trans e homens idem (que continuam dotados do aparato destinado a gerar bebês), chegamos ao extremo oposto em que mulheres biológicas não podem reivindicar esta condição básica.
Zahawi também criticou a “perda de uma acadêmica do calibre” de Kathleen Stock, professora de filosofia que deixou a Universidade de Sussex por causa de uma campanha estudantil contra ela.
Os problemas da professora começaram depois que ela defendeu uma posição que é vista como anátema: espaços onde as mulheres se despem ao dormem não devem abrir acesso irrestrito a mulheres trans que ainda “são do sexo masculino, com genitais masculinos, inclusive as que são sexualmente atraídos por mulheres”.
Kathleen Stock é uma “lésbica de esquerda”, o que não aliviou em nada sua situação. Ao contrário, no universo paralelo que reina nas fronteiras queer, muitas lésbicas são acusadas de discriminação por não sentirem atração sexual por mulheres trans. Ela ainda é incluída na categoria Terf, um xingamento feio: é o acrônimo em inglês para feministas radicais que excluem os trans.
Tem mais alucinações: há mulheres biológicas que têm atração só por outras mulheres, mas se sentem constrangidas a fazer sexo com mulheres trans dotadas e usuárias de seus pênis.
A BBC fez uma reportagem sobre uma mulher que, com medo de ser chamada de Terf, concordou em ir para casa com uma trans, mas não quis saber de mais nada quando viu seu pênis. Não adiantou: a pessoa a estuprou.
Detalhe quase inacreditável: por orientação de seu comitê de diversidade, a BBC mudou o pronome dito pela vítima. Em lugar de “ele” (he/him) usou o plural (they/them). Em português, o equivalente seria empregar elx, uma variação inventada para evitar a flexão de gênero. Ficou assim: “Eu era muito jovem e tinha sofrido lavagem cerebral com a teoria queer, acreditando que (elx) era mulher. Mesmo que cada fibra do meu ser gritasse contra, aceitei ir para casa com (elx). (Elx) usou a força quando mudei de ideia ao ver seu pênis e me estuprou”.
Qualquer pessoa minimamente civilizada concorda que cada um tem o direito de viver a própria vida como quiser e ser tratado com o respeito devido a todos os seres humanos. Não é preciso um grande esforço para entender que os trans podem sofrer discriminações terríveis.
Mas também é evidente que discriminados se transformaram em discriminadores ao negar às mulheres biológicas a sua própria condição, a ponto de eliminar a palavra “mulher” de documentos oficiais, exigindo que sejam tratadas como “pessoas com colo de útero” e outros absurdos. Chega-se assim ao ponto em que estupradores que se declaram do gênero feminino são tratados de “elas”.
O comediante Ricky Gervais demonstrou, humoristicamente, a insanidade dessa forçação de barra num trecho de seu especial para a Netflix em que fala de “mulheres à moda antiga, as que tinham útero” e ironiza as que reclamam, nos casos de violência sexual praticada por trans, que “ele me estuprou”.
“É ‘ela me estuprou’, sua **** burra”.
É claro que estamos falando aqui de uma minoria da minoria da minoria. Existem problemas complexos, como admitir mulheres trans (com a genitália intacta) em espaços como alas femininas de hospitais e prisões. Em abril, uma presidiária trans foi condenada a sete anos por estuprar na área dos chuveiros da notória penitenciária de Riker’s Island, em Nova York, outra presa, mulher biológica.
Não há respostas fáceis, mas eliminar, agressivamente, a palavra e o conceito de “mulher” não é uma delas.
Curiosamente, as mulheres trans querem ser chamadas de mulheres, sem acréscimos. Mas a mesma palavra aplicada a mulheres biológicas é considerada preconceituosa.
Para quem acha deprimente os preconceitos – e os contra-preconceitos -, veio uma história da Ucrânia sobre um casal queer, Olexandr Zhuhan e Antonina Romanova. Eles foram voluntários da Força Territorial, que faz tarefas de apoio aos militares que combatem os invasores russos, e estavam voltando para mais um turno de três meses na frente de combate.
Antonina pede para ser chamada de “ela”, uma combinação original para quem tem barba e cabelo raspado. E conta: “Não sofri agressão nem bullying. Foi um pouco estranho para eles, mas com o tempo, começaram a me chamar de Antonina e alguns até usavam o pronome ela”.
Antonina e Olexandr usam, abaixo da bandeira ucraniana na manga do uniforme, um escudo de unicórnio, símbolo adotado pela turma LBGTQI que está na guerra. Um símbolo do qual podem se orgulhar.