Os trechos que apontam Bolsonaro como mentor da tentativa de golpe
A preocupação do ex-presidente, segundo o relatório, era com a eficácia do plano, não com sua legalidade ou moralidade
Recentemente, uma frase dita por Jair Bolsonaro após seu indiciamento chamou atenção não por negar as acusações, mas por evidenciar sua preocupação com a viabilidade de um golpe. O comentário, proferido antes da divulgação completa do inquérito da Polícia Federal, sugere mais uma reflexão sobre a possibilidade de realizar um ato inconstitucional do que uma rejeição clara e direta da ideia de golpe.
“Se alguém viesse conversar sobre golpe comigo eu ia dizer: ‘Tá, tudo bem, e o after day? Como fica o mundo perante nós?”. Ou seja, o líder da extrema direita brasileira estava preocupado com o dia seguinte da intentona golpista, e não em rechaçar a proposta de um crime grave de abolição violenta do Estado democrático de Direito.
Detalhes do inquérito da PF, especificamente mencionados em trechos do documento, corroboram essa interpretação que ele mesmo, por descuido, externou a jornalistas após o seu indiciamento.
É que documentos mostram que a preocupação de Bolsonaro era esta mesmo: não a imoralidade de um golpe, mas sua possível execução eficaz.
Na página 653, o inquérito esclarece que houve discussões sobre um decreto que, se implementado, poderia levar à ruptura institucional. Há destaque para uma citação que indicava a expectativa de que isso ocorresse ainda naquela semana, vinculando diretamente a decisão a Bolsonaro, que ainda “dependia da decisão do presidente da República”.
Na página 840, a narrativa é reforçada, apontando que Bolsonaro planejou, ajustou e elaborou um decreto que previa a ruptura institucional, tentando consumar um golpe em 15 de dezembro de 2022, o que não se concretizou por circunstâncias alheias à sua vontade.
Além disso, a página 883 ressalta que a resistência de figuras-chave dentro do governo, como o comandante do Exército, foi fundamental para que a tentativa de golpe não fosse consumada.
Nesses três momentos, a PF evidencia que, enquanto Bolsonaro construía a viabilidade do golpe, elementos dentro das estruturas de poder atuavam ativamente para impedir essa quebra da ordem democrática.
Foram eles — militares como o general Marco Antônio Freire Gomes — que impediram a tentativa de destruir a democracia brasileira.
Mas, segundo a PF, Bolsonaro organizava justamente o “after day”, ou o dia seguinte, por intermédio de seus fiéis seguidores dentro do governo, para dar ares de legalidade à trama golpista.
As idas e vindas das minutas golpistas serviriam para isso. Criar documentos falsos para dar a falsa impressão para a sociedade de que houve fraude nas eleições também. A ideia era forjar uma fraude nas urnas, conseguir apoio popular para “eleições livres” e, com isso, legitimar o golpe como algo “dentro das quatro linhas”. Pelo bem do país, não deu certo.