Igrejas pressionam pelo ministro ‘terrivelmente evangélico’ no STF
Nos bastidores, líderes atuam para que a primeira vaga seja de um religioso, mas João Otávio Noronha subiu na cotação entre os que disputam a cadeira
À medida que o segundo semestre avança, a disputa por uma vaga no Supremo Tribunal Federal (STF) se acirra nos corredores do poder, em Brasília, mesmo mais vazios por conta da pandemia. A lista de candidatos só cresce. O movimento passou a preocupar bastante o segmento, que garante, nos bastidores, que o primeiro indicado – para a vaga do decano Celso de Mello a partir de novembro – terá de sair de sua lista: os evangélicos pentecostais e neopentecostais.
“Nós aguardamos que o ministro ‘terrivelmente evangélico’ será nomeado nessa primeira vaga. O compromisso público do presidente Jair Bolsonaro conosco é em relação à primeira vaga do STF. A segunda ele pode botar católico, um militar, quem quiser… Aí, na verdade, é com ele. A primeira foi o compromisso público dele conosco. Em diferentes eventos, Bolsonaro falou sobre isso. A primeira vaga será para um terrivelmente evangélico. Ele falou que era a primeira e nós vamos cobrar isso dele”, afirmou um eminente integrante da bancada gospel no Congresso Nacional.
Durante o mandato presidencial, que terminará em 2022, Bolsonaro terá direito de nomear um ministro para a vaga de Celso de Mello neste ano e outro com a aposentadoria de Marco Aurélio Mello, em julho de 2021. Ocorre que o nome evangélico mais cotado para o posto, o do ministro da Justiça, André Mendonça, vem perdendo força nas últimas semanas, seja pelo escândalo dos dossiês, seja pelo fato de que a concorrência do lado de fora do segmento gospel tem crescido vertiginosamente.
Para além da nomeação de um ministro terrivelmente evangélico, hoje existem nomes como o de Jorge de Oliveira, Secretaria-Geral da Presidência, o de João Otávio de Noronha, ex-presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), além de mais um ministro da corte, o magistrado Luís Felipe Salomão. Todos correm por fora do meio religioso, ganhando robustez – algumas candidaturas traem o peso de decisões que muito agradaram Bolsonaro.
A disputa tem sido vista assim. Sendo o que mais conquistou confiança do presidente nas últimas décadas, Jorge de Oliveira é tão próximo da família que pode esperar a segunda vaga. João Otávio de Noronha foi o primeiro magistrado a conceder prisão domiciliar para Fabrício Queiroz, ex-faz-tudo da família presidencial, e está sedento para ser nomeado. Já o ministro Luís Felipe Salomão tem feito o caminho de enviar seguidos emissários ao Palácio do Planalto.
Mas, em meio a isso, está a pressão dos evangélicos, que acrescentaram na lista, por exemplo, o nome de Humberto Martins, que assumiu a presidência do STJ, é devoto da fé cristã protestante e se aproximou do filho Zero Um, Flávio Bolsonaro. “Há uma preocupação muito grande no segmento com relação a isso e existem movimentações de juristas evangélicos, vários, para colocar o nome à disposição, e entendo que os evangélicos vão pressionar daqui até o final de outubro para o presidente realmente poder ter uma série de nomes para escolher. Isso está sendo feito sim nos bastidores. Mas Bolsonaro vai ser cobrado publicamente”, afirma outro integrante da bancada evangélica.
Segundo apurou a coluna, a ideia é que pastores reforcem, em seus canais nas redes sociais e até nos púlpitos das igrejas, que o compromisso é a nomeação para a primeira vaga, ainda este ano, e não para uma das vagas que surgirão no decorrer do mandato. Na visão da ala evangélica no Congresso, o presidente não teria vencido a eleição sem apoio do segmento, especialmente no primeiro turno. E estão, mais uma vez, cobrando a fatura, que já rendeu benefícios fiscais do governo aos templos.
“Essa vaga deste ano é para um evangélico. Pode ter certeza que a primeira vaga será para um evangélico. O Bolsonaro tem muitos defeitos, mas uma das virtudes é cumprir o que fala. Ele falou isso em público em vários lugares, não foi uma vez só”, lembra um desses integrantes da bancada no Congresso ouvidos pela coluna. O presidente terá uma tarefa difícil pela frente. Não chega a ser uma “Escolha de Sofia” porque, por mais difícil que seja, a tendência é o governo ganhar ao indicar um nome para a mais alta corte do país. Mas se deixar os evangélicos de fora neste ano, certamente Bolsonaro descobrirá que os líderes religiosos podem ser tão truculentos quanto ele mesmo. O comando será o de guerra.