Pandemia, um ano depois: o impacto na saúde mental dos médicos
Não só o atendimento ao paciente em si, mas a atualização constante sobre novos protocolos, técnicas, medicamentos etc, pode ser extenuante
Não foi a pandemia do novo coronavírus que desencadeou a piora na saúde mental e emocional dos médicos no Brasil e no mundo. Antes, muito antes, uma boa parte dos médicos e profissionais da saúde já apresentava sintomas e transtornos depressivos, ansiedade e estresse.
De modo geral, e segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), no Brasil, cerca de 12 mil pessoas tiram a própria vida por ano, quase 6% da população. No mundo, são cerca de 800 mil de suicídios anuais. O Brasil só perde para os EUA. A cada 46 minutos um brasileiro tira a própria vida. No entanto, a OMS afirma que o suicídio tem prevenção em 90% dos casos.
Entre profissionais de saúde, a taxa de suicídio é de três a cinco vezes maior do que na população em geral. A exaustão pode ser fruto da cobrança inerente à profissão, ao dia a dia do trabalho ou ainda por questões individuais e sociais.
Sim, a pandemia agravou a pressão sobre os médicos, que passaram a ter inúmeras demandas, atendimentos extenuantes, não só entre os que estão linha de frente no combate à covid-19, mas também para profissionais de diversas especialidades, seja no ambiente hospitalar, nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) ou nas clínicas particulares.
Além do atendimento ao paciente, que é a parte mais visível do trabalho, médicos e demais colegas da área da saúde têm que se manter atualizados sobre novos protocolos, procedimentos, técnicas, cirurgias, medicamentos. Essa atualização é constante, até porque dependemos disso para acompanhar o que é mais seguro e efetivo para o paciente. E, não é raro, não só acompanhar, mas também desenvolver e participar de estudos, projetos, pesquisas, análises. Esse é um trabalho igualmente extenuante, mas que geralmente não é visível para a sociedade.
Vale ressaltar ainda que a pandemia jogou muito mais luz às atividades dos médicos e dos profissionais de saúde. Colocou holofotes e lupas, e ampliou com destaque a conduta, os métodos, as práticas exercidas por esses profissionais. Até com certa razão, a sociedade, cada vez mais interessada em tudo que envolve a saúde no Brasil, tem debatido exaustivamente isso, sobretudo na arena das redes sociais.
Apesar da importância do debate, muita gente não compreende bem os meandros da medicina, tem pouco conhecimento e embasamento técnico e científico. A sensação é que temos 212 milhões de especialistas em medicina e saúde analisando a tudo e a todos cotidianamente.
Vale a pena incentivar essas discussões, bem como admitir críticas, que podem ajudar a melhorar a performance de qualquer profissional, e isso inclui médicos e outros profissionais de saúde. No entanto, que se respeite e se tenha cuidado, critérios e conhecimento de causa para não emitir opiniões sem responsabilidade ou embasamento.
Há que se pensar ainda isoladamente no indivíduo. Algumas pesquisas apontam que aqueles que estão na linha de frente do combate ao novo coronavírus têm até 95% mais chance de desenvolver depressão. É preciso compreender que eles são seres humanos e podem adoecer também.
Apesar da urgência da Covid-19, dos intermináveis e cansativos atendimentos, sobretudo nas UTIs, não se pode negligenciar o lado emocional desses profissionais. Não há razão para criar estigmas e preconceitos quanto à saúde mental deles. Às vezes, estão sobrecarregados e pressionados pelo acúmulo de funções, o que afeta diretamente a produtividade.
Além dos sinais de depressão e ansiedade, precisamos ficar muito atentos ao estresse, que é prejudicial à saúde e pode trazer danos físicos e mentais. Por isso, nunca foi tão necessário conciliar a vida pessoal e profissional, manter hábitos saudáveis, ter tempo e espaço para o lazer, para uma boa leitura e ainda mais para atividades físicas.
Sem medo, sem tabu e sem preconceito, ao perceber sinais de desestabilização da sua saúde mental, procure ajuda especializada, uma terapia ou outro tratamento que melhor se ajuste às suas necessidades. Porque para poder ajudar os outros é preciso se ajudar. E, mesmo em meio ao caos, é possível encontrar harmonia.
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