O DNA humano é 97%-99% idêntico ao dos orangotangos, gorilas, chimpanzés e neandertais. Isso implica que, ao analisar as sequências de DNA, ocasionalmente você verá componentes individuais do DNA que diferem entre si.
Talvez seja difícil compreender as alterações dispersas e incomuns dentro do material genético, composto por 3 bilhões de componentes separados. Mas, para melhor visualizar isso, basta perceber as diferenças na aparência e nas características, por exemplo, entre humanos e chimpanzés. Apesar de seus programas genéticos serem 99% idênticos, os óvulos fertilizados de humanos e chimpanzés devem evoluir para formas de vida tão diversas para se adaptarem bem aos seus ambientes únicos.
Conrad Hal Waddington, um famoso biólogo do desenvolvimento britânico e pai da epigenética moderna, foi o primeiro a apresentar explicações conceituais sobre como os aproximadamente 200 tipos diferentes de células envolvidos no desenvolvimento embrionário, apesar de todos terem a mesma constituição genética, contribuem de maneiras distintas, no menor tempo possível, para o desenvolvimento bem-sucedido do complexo feto humano, individualmente adaptado e preparado para as próximas condições e desafios ambientais.
Isso porque existem mecanismos epigenéticos que atuam no DNA e são herdados de célula para célula e ao longo das gerações. Esse mecanismo contribui para a anotação e suborganização de todo o material genômico. Ele o divide em seções ativas e silenciosas, que regulam o resultado do conteúdo genético de uma célula e determinam a funcionalidade e o fenótipo (conjunto de características que o indivíduo possui no meio ambiente) específicos de cada tipo celular.
Além disso, ao longo das últimas três décadas, foram reunidas extensas evidências na literatura científica que indicam que esse mecanismo epigenético serve como uma ponte de comunicação, traduzindo os requisitos variáveis de um ambiente hostil para um uso modificado do material genético, a fim de formar o fenótipo adaptado.
Para além do contexto da epigenética na evolução humana, também vale observar os fatores externos que podem influenciar a expressão gênica sem alterar a sequência do DNA e que essa relação tem várias implicações importantes, por exemplo, relacionadas com a natureza, o meio ambiente, a ecologia e a sustentabilidade.
De modo comparativo, mas do ponto de vista evolutivo, podemos relacionar estes aspectos com uma espécie de “Epigenética ESG”, da mesma forma que se impõe no mundo contemporâneo às empresas um conjunto de padrões e boas práticas que visam a definir se é socialmente consciente, sustentável e corretamente gerenciada. Trata-se de uma forma de medir o desempenho de sustentabilidade de uma organização — Environmental (meio ambiente), Social e Governance (governança) –.
Do ponto de vista estritamente da epigenética, também atuamos como uma ponte entre os organismos e seu ambiente, onde ocorrem interações complexas que podem moldar a biologia e a diversidade da vida.
Essa compreensão pode ser vital para promover práticas de conservação e desenvolvimento sustentável. Sem desmerecer as organizações empresariais, é relevante pensarmos como espécie humana, a partir dos inúmeros benefícios para a medicina, para o bem-estar e, de forma ainda mais ampla, para toda a área da saúde.
* Marcelo Bendhack é médico urologista, uro-oncologista e presidente da Associação Latino-americana de Uro-oncologia (Urola)