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Professor, advogado e militante do movimento negro, ele é o reitor da Faculdade Zumbi dos Palmares, em São Paulo, instituição pioneira de ensino no Brasil que ajudou a fundar em 2004.
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Nós queremos respirar: câmeras digitais contra câmaras de gás

O Brasil precisa exigir e obrigar o uso de câmeras digitais em todo o efetivo das policias públicas e privadas do país

Por José Vicente 3 jun 2022, 13h55

O assassinato do cidadão negro Genivaldo de Jesus Santos na câmara de gás improvisada da Policia Rodoviária Federal no mesmo dia do aniversário de George Floyd é um convite à reflexão sobre como a sociedade constrói falsas prioridades sobre como pessoas e instituições verdadeiramente se posicionam diante das brutalidades e selvagerias praticadas pela insanidade dos agentes e instituições do estado. Convida também para uma análise genuína de como o racismo contra os negros brasileiros deturpa a realidade, constrange os fundamentos da República e da dignidade humana, subverte princípios da Justiça; e, principalmente, silencia e imobiliza os bons.

Nos Estados Unidos, negros, brancos, velhos e jovens foram as ruas por mais de uma semana em pleno auge da pandemia do coronavírus para denunciar a violência e crueldade daqueles policiais e do Estado. Empresas se levantaram para denunciar o racismo, personalidades públicas, artistas e esportistas exigiram medidas governamentais e responsabilização dos policiais – e até o próprio presidente Trump criou uma medida executiva determinando reformulações nos procedimentos de abordagem das forças policiais. Os policiais foram presos, denunciados e apenados. Um deles, o policial branco Derek Chauvin, foi sentenciado a 22 anos de prisão.

No Brasil, ninguém foi para as ruas, as empresas se calaram, os artistas e personalidades emudeceram, policiais não foram sequer presos, ainda que cometendo um crime em flagrante. A Policia Rodoviária Federal confirmou o assassinato, mas justificou que ele ocorreu pelo uso de equipamento de pequeno potencial ofensivo. E, justamente por isso, os policiais continuaram candidamente desenvolvendo suas atividades, agora administrativas e, depois, ainda os gestores indiretamente responsáveis ainda foram promovidos, transferidos para atividades mais glamourosas nos Estados Unidos.

Nem OAB, nem CNBB, nem MP. Nem ANJ, nem AGU, nem TCU, ninguém repudiou e exigiu a prisão, a demissão da cúpula da PRF em Brasília e do comando da PRF em Sergipe. Nem o Ministro da Justiça foi exonerado ou teve a dignidade de pedir exoneração, como ocorreria em qualquer outra democracia seriamente comprometida com os valores da cidadania e a moralidade política em qualquer parte do planeta.

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Quem salvou a democracia e quem está garantindo nossa caminhada rumo a civilização nos Estados Unidos e no Brasil foram as pessoas simples, que com a coragem e suas câmeras digitais dos celulares publicaram para o mundo o que o Brasil insiste em não querer ver: que nossas polícias cada vez mais militarizadas e ornamentadas com signos de guerra são violentas, cruéis e matam as pessoas simples, pobres e negros de forma brutal na presença de todos, e em plena luz do dia.

Foram elas, as câmeras, que celebraram a verdade dos fatos, evitaram as tergiversações policiais e obrigaram que o poder público a garantir a aplicação isenta da Justiça. Elas garantiram a imortalidade de Floyd e agora a memória de Genivaldo. E poderão nos salvar da letargia, da omissão e da nossa indiferença com a dignidade alheia. O gás da câmara da Policia Rodoviária, ainda que entorpeça nossos sentidos, não pode evitar que tenhamos discernimento suficiente para perguntar e responder: por que a Policia Rodoviária Federal mata negros inocentes nas favelas cariocas e em câmaras de gás? Por que usam fuzis com mira laser, toucas ninjas e trajes de guerra? Por que os policiais não foram presos em flagrante conforme determina a lei? Por que, ao final, a Policia Rodoviária Federal não se limita a cuidar do policiamento das rodovias federais?

As câmeras que salvaram Floyd e Genivaldo podem salvar mais vidas e toda a sociedade brasileira. Para que os joelhos, mata-leões e câmaras de gás das forças policiais e da Policia Rodoviária Federal impeçam que negros e brancos possam respirar livremente e em segurança, elas precisam ser destruídas e deixar de existir. Por isso, o Brasil precisa exigir e obrigar o uso de câmeras digitais em todo o efetivo das policias públicas e privadas do país. Precisa também obrigar o uso exclusivo de armas não letais em operações de patrulhamento e interação com o público, e proibir o uso de uniformes de tropas de assalto pelos órgãos policiais. E proibir o uso indevido e desviante da Policia Rodoviária em operações conjuntas com demais forças policiais nos morros e comunidades. Nós queremos respirar e as câmeras digitais poderão nos ajudar.

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