Indicações ao Oscar 2017
Prepare-se: você vai ouvir alguém anunciar La La Land mais de vinte vezes durante a festa
Vai ser daqueles anos em que a cerimônia de entrega fica até monótona: com quatorze indicações (no que se iguala aos recordistas Titanic e A Malvada), La La Land não tem concorrente à altura no Oscar deste ano. Além da estatueta de melhor filme, deve levar as de direção (para Damien Chazelle), roteiro original, fotografia, desenho de produção, figurino, mixagem de som, trilha sonora e canção – para City of Lights, que concorre com outra de La La Land, Audition. Ou seja, nove prêmios (e, somando os anúncios dos indicados aos anúncios dos vencedores, isso significa que você deve ouvir essas três palavrinhas 23 vezes durante a noite de 26 de fevereiro). O de melhor ator não deve levar: Ryan Gosling mais Viggo Mortensen, Denzel Washington e Andrew Garfield deverão perder o Oscar para Casey Affleck, de Manchester à Beira-Mar. Emma Stone também está na lanterninha da categoria de melhor atriz, na companhia ilustre de Meryl Streep: a questão é para quem ela vai perder – se para a favorita (neste momento) Natalie Portman, de Jackie, ou se para Isabelle Huppert, de Elle, ou ainda se para Ruth Negga, de Loving, uma atriz nascida na Etiópia e criada na Irlanda que está em ascensão vertiginosa.
Mas então é isso? Os outros oito indicados a melhor filme estão ali só para fazer figuração?
Não, de forma nenhuma. La La Land disparou na frente porque traz qualidades que se tornam cada vez mais raras na produção americana – frescor, originalidade, encanto, imaginação, vontade de correr riscos. Mas cada um dos competidores está lá por um motivo diverso. Até o Último Homem é, na minha opinião, superestimado – mas, com seu total de seis indicações, inclusive para diretor, significa um perdão decidido da indústria a Mel Gibson por suas transgressões passadas; ele já pode se considerar de volta ao rebanho. Depois do bafafá do #OscarsSoWhite em 2016, neste ano quatro dos indicados contam histórias de personagens negros (Estrelas Além do Tempo, Cercas e Moonlight) ou, em um caso, de indianos (Lion). A tradição do drama clássico vem bem representada em Manchester à Beira-Mar, e outra tradição, a do western, ganha uma estupenda revisão contemporânea em A Qualquer Custo. Quem fecha a conta é a bela ficção científica A Chegada – e aí a Academia ficou devendo, e devendo feio, uma indicação a Amy Adams.
Agora repare: à parte A Chegada, que teve financiamento grande, todos os outros filmes são produções independentes ou das divisões alternativas dos estúdios. Há dois jeitos de ver a coisa. De um lado, pode-se identificar nas indicações de 2017 uma vitória do cinema feito na raça, com orçamento modesto e convicção. De outro lado, há que se constatar que a lista é, também, uma derrota do cinema de estúdio: é tanto filme de super-herói (e por que nem considerar Deadpool?), tanta sequel e prequel, que os grandes estúdios simplesmente desaprenderam a propor material original com alguma consistência. Não é um acaso que A Chegada seja a exceção: é o único título com algum contorno autoral a sair dessas linhas de montagem super-financiadas no ano passado. Os executivos de cinema vivem se queixando de que o público foge de tudo que não seja megaprodução com marca conhecida. La La Land e os outro oito indicados a melhor filme provam que não é bem assim: banque um diretor que sabe onde tem o nariz – e deixe-o seguir seu próprio nariz –, e não são nada más as chances de que a plateia queira acompanhá-lo.