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Favorito ao Oscar, Nomadland, de Chloé Zhao, retrata América desencantada

A cineasta faz do filme um documento poético de um país sem âncora

Por Isabela Boscov Atualizado em 26 abr 2021, 09h40 - Publicado em 16 abr 2021, 06h00

Atingida em cheio pela crise de 2008, três anos depois a U.S. Gypsum, mineradora de gipsita e fábrica de placas de gesso instalada em Empire, Nevada, não só fechou suas portas; tendo demitido seus funcionários e retomado suas casas, cancelou o código postal da cidade. Com toda atividade econômica extinguida, Empire virou uma cidade fantasma (em 2016, quando a operação da mina foi retomada, mas em níveis muito inferiores aos de antes, passou a ser algo um pouco menos drástico — uma sombra). É nesse contexto verídico que a diretora Chloé Zhao introduz Fern, a protagonista de Nomadland (Estados Unidos/Alemanha, 2020), que acaba de estrear nos cinemas do país que estejam abertos. Zhao é não apenas a favorita ao Oscar de direção como, juntamente com a inglesa Emerald Fennell, de Bela Vingança (leia resenha aqui), estabelece um marco: pela primeira vez nos 93 anos da premiação, duas mulheres concorrem nessa categoria (vale lembrar que a única mulher a sair vitoriosa até aqui foi a americana Kathryn Bigelow, em 2010, por Guerra ao Terror).

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Interpretada por Frances McDormand, ganhadora do Oscar de melhor atriz em 2018 por Três Anúncios para um Crime e em 1997 por Fargo, e de novo concorrendo à estatueta, Fern é uma personagem ficcional, mas não inventada. Recém-enviuvada e despejada de Empire, ela é um rosto para as devastações econômicas periódicas e para o fenômeno muito americano da vida nômade. Na estrada com uma velha van que reformou como pôde, Fern cruza com outras pessoas (à exceção do personagem de David Strathairn, todas reais, interpretando versões de si mesmas) em situação igual à sua, por motivos diversos — dificuldades financeiras, traumas emocionais, inconformismo ou inadequação, desejo de independência ou de aventura.

Em comum, todas essas personagens têm o desencanto com o que ficou para trás. “Lendo o livro-reportagem de Jessica Bruder do qual parti, entendi que aquela colagem de histórias traduzia um sentimento coletivo de perda por parte de toda uma geração de americanos”, disse Zhao a VEJA. Mas o que a diretora encontra nelas também, inesperadamente, é contentamento: seja qual for a razão pela qual essas pessoas ficaram ou se puseram à deriva, é evidente que a vida sem endereço obriga ao ajuste entre o que se tem e o que se quer. Com minúcia bem-humorada, Zhao investiga a rotina dos nômades: passar frio, penar para achar um lugar no qual seja permitido à van pernoitar, ter de usar um balde como banheiro, caçar empregos temporários. Em um trecho do filme, um simples pneu furado vira um problema do tamanho de uma montanha para Fern; em outro, ela quer ir embora mas não tem coragem de deixar sozinha no acampamento Swankie (Charlene Swankie), uma idosa que é um osso duro.

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Swankie, que enfrenta um câncer, sem querer aponta para Fern algumas das compensações: a vastidão das paisagens do Oeste e Meio Oeste, a rede quase invisível mas firme de solidariedade entre os nômades, a libertação daquelas amarras que vêm com a segurança. Em duas ocasiões, Fern tem a oportunidade de voltar à vida regular. Em ambas, com trepidação e para sua própria surpresa, rejeita absolutamente a chance. “Fern perdeu a identidade dela de esposa de alguém, amiga de alguém, vizinha de alguém, funcionária de alguém. Sua cidade inteira se foi. O que resta a ela é se encontrar de uma maneira diferente — por meio do movimento”, diz Zhao.

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BUSCA - Zhao e Jandreau no set de Domando o Destino: o país do deslocamento – (Searchlight Pictures/.)

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Nascida e criada em Pequim em uma família ligada há gerações ao cultivo do arroz, transplantada para um internato inglês na adolescência e dali, afinal, para Nova York, Zhao, de 39 anos, hoje se considera americana. Mas, ao mesmo tempo que se submerge nessa América interior, a vê com o olhar desarmado dos estrangeiros. Em seu filme anterior, o magnífico Domando o Destino (no original, The Rider, de 2017), ela aplicava a abordagem de Nomadland, a dos não atores que encenam uma versão de si mesmos (“é mais fácil quando não são pessoas habituadas a calcular a própria imagem nas redes sociais”), à história de Brady Jandreau, caubói de Dakota do Sul impedido de voltar aos rodeios por causa de um acidente. Se a busca de Fern é geográfica, a de Brady é íntima: ele é tão integrado ao seu lugar que se confunde com ele — mas a identidade original lhe foi roubada, e o jovem precisa encontrar outra sem arrancar suas raízes. Na cultura americana, o deslocamento é uma essência, e ninguém a tem examinado com tanto apuro quanto Chloé Zhao.

Publicado em VEJA de 21 de abril de 2021, edição nº 2734

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