Stress relacionado a status social provoca alterações genéticas em macacos
Pesquisa mostrou que os animais de hierarquia inferior têm seus sistemas imunológicos comprometidos
Um novo estudo científico mostrou pela primeira vez que a posição social ocupada por macacos e o stress ligado a esse status provocam alterações genéticas afetando funções do sistema imunológico.
Saiba mais
EXPRESSÃO GENÉTICA
Toda célula em qualquer ser vivo, de bactérias a baleias, contém instruções gravadas no DNA que comandam as funções do organismo. Cada gene regula uma proteína. Isso determina a função da proteína: de quebrar açúcares a ajudar o sangue a coagular após um corte. É a expressão genética que diz às proteínas o que, como, e quanto fazer. O mesmo gene pode se expressar de forma diferente em diferentes estágios de desenvolvimento das células ou conforme o tipo de célula. Ou seja, o mesmo gene em uma célula muscular tem uma função diferente no cérebro, produzindo proteínas na primeira e não agindo na segunda.
Pesquisadores chegaram a essa conclusão ao comparar macacas de nível hierárquico dominante com suas companheiras de posições sociais inferiores. Essa análise mostrou diferenças significantes na expressão genética do sistema imunológico e em outras funções do animal. Quando uma fêmea ascendia socialmente, a expressão de seus genes sofria alterações em poucas semanas, sugerindo que mudanças sociais podem influenciar rapidamente na regulação genética.
A pesquisa, liderada por Jenny Tung, da Universidade de Chicago, foi realizada com grupos formados por macacas Rhesus do Centro Nacional de Pesquisa de Primatas de Atlanta, dos Estados Unidos. Como na natureza, o próprio grupo fez uma organização hierárquica definindo os animais com prioridade na competição por comida, água e pela limpeza realizada por seus companheiros. Em cativeiro, essa hierarquia é determinada pela ordem de introdução ao grupo, onde o novato é geralmente aquele que ocupa o mais baixo status.
De acordo com Tung, na natureza, a hierarquia é herdada das mães e, nesse caso, as fêmas geralmente não abandonam os grupos no qual nasceram. Como em cativeiro a ordem de inserção dos animais definiu o posicionamento social, os pesquisadores puderam associar a alteração do status com as mudanças genéticas.
A comparação de 49 macacas de distintos níveis sociais revelou mudanças na expressão de 987 genes, sendo 112 deles relacionados ao sistema imunológico. Esse resultado reforça dados de que macacos de hierarquia inferior e com stress crônico têm seu sistema imunológico comprometido. De maneira menos precisa, esse estudo pode ter ligação com estudos feitos em humanos que relacionam o baixo nível socioeconômico com alto stress social e elevado risco de doenças.
Essa expressão genética percebida no experimento foi tão significativa que permitiu que os pesquisadores previssem de forma precisa o nível social dos animais com base apenas no perfil genético. Esse resultado possibilitou a realização de um segundo teste para verificar se a expressão genética refletiria em mudanças não planejadas no nível hierárquico.
CONHEÇA A PESQUISA
Título original: Social environment is associated with gene regulatory variation in the rhesus macaque immune system
Onde foi divulgada: revista PNAS
Quem fez: Jenny Tung, Yoav Gilad, Luis Barreiro and Kateyln Michelini, Zachary Johnson, Vasiliki Michopoulos, Donna Toufexis, Mark Wilson, Kasper Hansen of Johns Hopkins
Instituição: National Institutes of Health (EUA)
Dados de amostragem: macacas Reshus
Resultado: Alterações no nível hierárquico dos macacos provocam mudanças genéticas, especialmente no sistema imunológico desses animais.
“Foi um evento de sorte no experimento”, explica Yoav Gilad, professor de genética humana na Universidade de Chicago de Ciências Biológicas. “Quando dois animais eram removidos das gaiolas por motivos diversos e novos eram introduzidos aos grupos, isso resultava em ascensão social de alguns macacos. Nós pudemos tirar proveito dessa troca para ver se nossa classificação ainda era válida”.
Analisando amostras de sangue desses macacos, antes de depois das mudanças, os pesquisadores conseguiram usar a expressão genética para prever com sucesso a mudança de ranking de seis de um total de sete macacos. O resultado mostra que as mudanças de expressão genética socialmente induzidas não são estáveis, mas podem mudar rapidamente com o ambiente social.
Mudanças reversíveis – Os autores alertam que os experimentos usaram macacos em cativeiro, e enfatizam que a relação entre o stress e a regulação genética na natureza pode não ser a mesma. “A influência de fatores sociais na genética humana ainda precisa ser testada, e esse seria um trabalho difícil”, afirma Gilad. O pesquisador diz ainda que o stress social, de fato, influencia a saúde humana e que a pesquisa demonstra algum otimismo nesse sentido. “Uma mensagem encorajadora para os humanos é o fato de que os efeitos são mutáveis, reversíveis e mudam em uma escala realmente grande quando a hierarquia muda”, diz Gilad. “Seja lá o que causa o stress no ambiente social, você pode consertá-lo.”