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Diretor do Instituto Serrapilheira: “Brasil hoje não valoriza cientistas”

Em conversa com VEJA, Hugo Aguilaniu, Cristina Caldas e Natasha Felizi discutiram o atual estado da ciência no país e o que nos impede de avançar no ramo

Por Sabrina Brito Atualizado em 11 ago 2021, 15h18 - Publicado em 11 ago 2021, 11h49

O Instituto Serrapilheira é a primeira instituição privada e sem fins lucrativos de fomento à ciência no Brasil. Fundada por João e Branca Moreira Salles, a organização já apoiou mais de 120 projetos de pesquisa e 53 de divulgação científica desde sua criação, em 2017. No total, foram investidos cerca de 40 milhões de reais, oriundos de um fundo de 350 milhões criado por João.

VEJA conversou com Hugo Aguilaniu, diretor-presidente, Cristina Caldas, diretora de ciência, e Natasha Felizi, diretora de divulgação científica do Instituto. Eles comentaram os obstáculos impostos aos pesquisadores brasileiros, o que impede a ciência brasileira de estar na linha de frente no cenário mundial, entre outros assuntos.

Qual o papel do Instituto Serrapilheira atualmente?

Hugo Aguilaniu: Queremos identificar novos cientistas de ponta em todas as áreas da pesquisa. Preferimos escolher um número seleto de pessoas e concentrar nossos recursos nelas em vez de pulverizá-los. Queremos investir cada vez mais em pesquisadores ousados e inovadores, que ataquem questões complexas. A notícia boa é que temos pessoas incríveis e capacitadas no Brasil todo, capazes de bater papo com os melhores cientistas do mundo.

Cristina Caldas: Nosso carro-chefe é encontrar pesquisadores fora da curva. Todos os anos, recebemos entre 400 e 600 propostas, as quais revisamos internacionalmente, e acabamos apoiando cerca de 12 pessoas anualmente, com um investimento de 200 a 700 mil reais. Além dos recursos, colocamos essas pessoas em redes, onde podem conhecer e contatar cientistas de todas as áreas. Alguns dos assuntos estudados pelos nossos pesquisadores são sistemas dinâmicos na matemática, a diversificação de plantas nos biomas brasileiros e a robustez da Floresta Amazônica frente ao desmatamento e a queimadas.

Natasha Felizi: A divulgação científica também é um pilar do Instituto. Financiamos projetos de jornalismo e de mídias como modo de impulsionar a disseminação de informações e dados importantes e verificados. Um dos nossos projetos envolve um despacho diário aos assinantes que detalha o que cientistas de renome estão discutindo nas redes sociais, o que pode ser muito interessante para a sociedade.

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A pandemia impulsionou a ação de instituições como o Serrapilheira?

Hugo Aguilaniu: A pandemia foi ruim para todos, inclusive para os cientistas. A política do governo atual é extremamente deletéria em relação à produção de conhecimento, e a ciência não é exceção. A pandemia trouxe, sim, mais destaque ao nosso papel, o que é uma infelicidade. O desengajamento do governo com a ciência é trágico, e acabou aumentando a nossa visibilidade de uma forma ruim. Queríamos ser visíveis junto com a ciência de qualidade, não com um governo negacionista. A pandemia levou a ciência ao centro do debate público, e resta ver quanto tempo isso vai durar. Temos eleições chegando, e esperamos que a ciência seja um assunto reconhecido pelos candidatos.

Natasha Felizi: A crise de saúde expôs o debate científico, e ainda não sabemos se isso aumentou ou diminuiu a credibilidade da ciência, porque vimos muita polarização. Mas vimos que a pandemia acelerou alguns aspectos desejáveis da divulgação científica, com o aparecimento de nomes que serviram como fonte confiável de informação em tempos tão confusos, como Atila Iamarino. As pessoas finalmente perceberam a necessidade de uma atuação estruturada da divulgação científica.

O que impede a ciência brasileira de ser a mais avançada do mundo?

Hugo Aguilaniu: Com certeza existe a falta de um investimento robusto. O Brasil é um dos pouquíssimos países do mundo que registra quedas no investimento em ciência em relação ao PIB, o que é catastrófico e vem acontecendo há cerca de quatro anos. Outro fenômeno é a falta de reconhecimento: hoje, o pesquisador brasileiro não é reconhecido. Atualmente, o Brasil não valoriza os cientistas. Em outros locais, eles são vistos como pessoas capazes de levar o país para frente. Além disso, precisamos mudar a nossa visão de nós mesmos. A primeira reação de pesquisadores brasileiros frente a acadêmicos de renome mundial é se sentir pequeno, incapaz de interagir com qualidade — o que não é verdade.

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Cristina Caldas: Outro empecilho é a forma como o Brasil distribui estímulos aos cientistas. Hoje, ganha-se bolsas com base no número de artigos publicados em revistas científicas de qualidade, o que liga a carreira à quantidade mais do que à qualidade. É preciso mencionar ainda que, no Brasil, o ambiente é muito difícil, burocrático, não internacionalizado. Leva muito tempo para que recursos internacionais cheguem até aqui. Precisamos de um novo marco regulatório que abranja a flexibilidade do trabalho científico nos dias de hoje.

Onde é mais importante investir agora no Brasil, entre os ramos da ciência?

Hugo Aguilaniu: Talvez seja a ecologia. O Brasil precisa de pessoas que entendam bastante de biologia e ecologia para entender melhor os nossos ambientes. É muito mais difícil entender o funcionamento dos ecossistemas tropicais do que levar o homem à Lua. Compreender esse campo é muito estratégico para o Brasil.

Cristina Caldas: O país pode contribuir muito com a ecologia. Nós estamos sentados em cima dessa imensa biodiversidade com mecanismos que ainda desconhecemos e cujo poder é enorme.

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