Saldo mortal
O caso Marielle é o emblema escandaloso do descalabro da segurança pública no Rio
Em março, ocorreu o assassinato a tiros da vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ) e do motorista Anderson Gomes. Em novembro, oito meses depois, o ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, veio a público explicar a demora em solucionar o crime: duas testemunhas — o ex-policial militar e miliciano Orlando Curicica e outra que permanece anônima — levantaram “gravíssimas acusações a agentes públicos do Rio de Janeiro”. Trocando em miúdos: havia uma articulação criminosa de policiais, políticos e milicianos — e os envolvidos no esquema, obviamente, vinham fazendo de tudo para obstruir a solução do caso. As suspeitas dos investigadores são de que uma disputa de terras dominadas por milícias na Zona Oeste, onde Marielle pretendia fazer uma regularização fundiária, tenha motivado o assassinato. O vereador Marcello Siciliano (PHS-RJ) e o próprio Curicica — preso em 2017 por porte ilegal de arma — são os principais suspeitos de encomendar o crime. Na esteira das investigações, a Polícia Civil soube de um plano para matar o deputado federal eleito Marcelo Freixo, que comandou a CPI das Milícias, em 2008, e era amigo e aliado da vereadora assassinada.
O caso Marielle é o emblema escandaloso do descalabro da segurança pública no Rio. Nem a intervenção federal, comandada pelo general Braga Netto desde fevereiro, mudou o quadro. Houve queda no número de roubos e furtos em relação a 2017, mas os registros de mortes violentas subiram 10%. No que se refere a homicídios perpetrados por policiais, foi registrado aumento de 50%. Os dados nacionais também são desanimadores: 26 000 pessoas foram assassinadas no país somente no primeiro semestre 2018, o equivalente a uma média de 4 350 mortes por mês, e a taxa de resolução desses crimes permanece absolutamente irrisória: 6%. Nos estados mais violentos (Roraima, Rio Grande do Norte, Ceará e Acre), a média de assassinatos em cada 100 000 habitantes aproxima-se de trinta, o triplo da média verificada nos países da África, segundo dados da Organização Mundial da Saúde. O saldo, portanto, é um desalento só: o incremento da força policial pode aumentar a sensação de segurança, mas a presença policial não diminuiu a violência.
Publicado em VEJA de 26 de dezembro de 2018, edição nº 2614