Rio+20 começa também para os índios
Kari-Oca vai reunir 1.800 índios brasileiros e vindos de outros países para cobrar demarcações de terras e preservação da cultura indígena
“Bem-vindo à Rio+20”, anunciou um índio da etnia Terena para cerca de quarenta outros rostos pintados de preto e com penas, que acabavam de chegar ao Rio de Janeiro vindos do Mato Grosso do Sul para participar da Kari-Oca, após 48 horas de ônibus. A aldeia foi instalada em Jacarepaguá para a Cúpula dos Povos, um evento paralelo à Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20.
“Foi uma viagem cansativa, mas nós viemos para dizer ao mundo que somos ignorados pela sociedade e pelo governo. Nós lutamos pela demarcação de terras indígenas”, proclamou Antonio Terena, de 22 anos, usando jeans e camiseta, mas com um cocar grande, feito de pequenos pedaços de madeira. Todos os membros da tribo adotaram como sobrenome o nome de sua etnia.
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Vinte e um guerreiros da região amazônica do Xingu chegaram antes, há duas semanas, para instalar as grandes cabanas de palha onde ficarão durante a Cúpula dos Povos, que colocará em questão a “economia verde”, defendida pela conferência oficial. A chuva dos últimos dias tem dificultado o trabalho e o terreno ainda está muito enlameado. Os guerreiros também construíram todas as estruturas de madeira para os “Jogos Verdes”, competições esportivas indígenas que eles desejam transformar em “jogos mundiais”.
“A ONU debate sustentabilidade, mas este é um argumento teórico para continuar a devastar a natureza. É inútil falar de economia verde se os índios não têm terra”, afirma o cacique Marcos Terena, 52 anos, do Comitê Intertribal, encarregado de organizar a Kari-Oca.
Cerca de 400 índios de vinte etnias como os guaranis, tikunas, tukanos, gaviões, kaiapós, xavantes e bororos – entre muitos outros – são esperados na aldeia. Eles serão acompanhados por 1.200 índios do Canadá, Estados Unidos, Colômbia, Nicarágua, entre outros que vão participar das atividades e debates no Parque do Flamengo, onde acontecerá a Cúpula dos Povos.
Por iniciativa de 200 organizações ambientalistas e movimentos sociais em todo o mundo, este será um espaço de protesto contra o “capitalismo verde”, um termo que engana, segundo eles, e que “apenas designa um outro estágio da acumulação capitalista”. A Kari-Oca vai sediar debates sobre assuntos controversos, tais como créditos de carbono – que os índios são contrários – e as reservas minerais preciosas localizados em territórios indígenas.
Os debates vão culminar na produção de um documento a ser apresentado à ONU em 17 de junho, antes da cúpula dos 116 chefes de Estado e Governo, que será realizada de 20 a 22.
“Em 1992, durante a Cúpula das Nações Unidas anterior, nós nos esforçamos para fazer com que todos tomassem consciência da importância do meio ambiente. Desta vez, vamos além disso, mostraremos o nosso conhecimento e tradições”, explica Carlos Terena, 57 anos.
Neste sentido, nesta quarta-feira à noite, um “fogo sagrado” será aceso pelos índios para atrair bons espíritos antes da cúpula. “Nós acenderemos como faziam os nossos antepassados, esfregando pedaços de madeira uns nos outros”, ressalta Carlos, que disse estar “preocupado” com o futuro do planeta, mas continua otimista: “Desenvolvimento e preservação da natureza é possível, mas deve ser um desenvolvimento menos agressivo e com menos lucro”.
(Com AFP)
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