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Rio olímpico, um recordista de assaltos

Apesar dos 40 bilhões de reais investidos na segurança em dez anos, Estado registrou no primeiro semestre de 2016 o maior número de roubos da história

Por Leslie Leitão Atualizado em 4 ago 2016, 19h15 - Publicado em 4 ago 2016, 14h32

Muito além de qualquer possibilidade de um ataque terrorista, a grande preocupação das autoridades envolvidas no planejamento da segurança durante a Olimpíada do Rio de Janeiro está nas ruas de uma cidade à beira do caos. Dados divulgados na semana passada retratam com precisão o terror vivido pelos cariocas em seu cotidiano pré-olímpico. Os seis primeiros meses do ano estabeleceram um lamentável recorde: jamais, em toda a história, o Rio teve tantos assaltos. Foram 97.100, uma média de 534 por dia, ou um a cada três minutos.

Esses números oficiais do Instituto de Segurança Pública (ISP) representam também um aumento de 59,9% no total de roubos em relação ao mesmo período de 2006, por exemplo, último ano antes de o delegado federal José Mariano Beltrame assumir o comando da secretaria de Segurança. Detalhe: Beltrame teve em mãos uma quantidade de dinheiro para investimentos na pasta jamais registrados. Até o final deste ano, serão mais de 40 bilhões de reais nesta década de poder – média de 4 bilhões a cada ano. Para se ter uma ideia, antes de sua chegada, o investimento anual em segurança não chegava a 2 bilhões de reais.

A sensação de insegurança de um cidadão pode ser medida em vários aspectos, mas principalmente nos números de homicídios, assaltos (contando vários tipos diferentes desses eventos) e nos latrocínios (as mortes em tentativas de roubo). Na estatística de assassinatos está a última bandeira que Beltrame tenta balançar para defender sua administração. Apesar de a redução não ser uma exclusividade do Rio (São Paulo, por exemplo, reduziu de 7.274 para 3.962 de 2006 pra cá), é fato que os crimes contra a vida baixaram na cidade olímpica. No primeiro semestre de uma década atrás, houve 3.210 casos, enquanto neste mesmo período de 2016 foram 2.470. O problema é que o gráfico, que já teve forte queda neste quesito, voltou a subir. O número atual, por exemplo, já é o segundo pior desde 2010.

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Os dados referentes a assaltos não deixam dúvida sobre o erro de planejamento da secretaria de segurança pública estadual. Somente no item roubo a transeunte o número saltou de 22.192 no primeiro semestre de 2006 para 44.712 em 2016, ou seja, um crescimento de 101%. Neste mesmo período os roubos a estabelecimentos comerciais cresceram 37%, enquanto os assaltos a ônibus (como o de ontem, em que 40 passageiros atravessaram a cidade reféns de dois bandidos) subiram 36,6%.

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Os ataques a motoristas também tiveram um salto, fazendo o número de carros roubados alcançar a marca de 19.647 este ano – média diária de 108 veículos, 10% a mais que dez anos atrás. O dado que mais impressiona, no entanto, é o de roubo de cargas. Os caminhões tornaram-se alvos de quadrilhas cada vez mais audaciosas, especializadas e numerosas. De 2.203 no primeiro semestre de 2006, os números chegaram a 4.140 em 2016, um aumento de 87%. “Como o tráfico expandiu seus territórios após as instalações das UPPs, eles investiram em outras modalidades criminosas. E o governo não promoveu ações efetivas para conter essa escalada ascendente do roubo de cargas, mesmo sabendo da origem do problema”, diz o diretor de segurança do Sindicato das Empresas do Transporte Rodoviário de Cargas e Logística do Rio de Janeiro, coronel Venâncio Alves de Moura.

O número de latrocínios também vem atingindo índices insuportáveis. Os 113 casos registrados neste ano configuram a segunda pior marca desde 2006, com um a menos do que o recorde de 2009 e cinco a mais do que 2006.

No caso do Rio de Janeiro, especificamente, há outras duas especificidades do cotidiano que também ajudam a aumentar a sensação de pavor na população: as balas perdidas e os constantes tiroteios. Nesses dois itens, apesar das promessas do governo, o ISP não produz uma estatística oficial. Mas é possível dimensionar o quanto os confrontos armados aumentaram pelo número de tentativas de homicídio, que chegaram a 3.030 de janeiro a junho deste ano, registrando mil casos a mais do que uma década atrás. Um detalhe curioso é que, apesar do aumento expressivo neste quesito, as apreensões de armas despencaram 30,8% nesses anos (de 6.768 para 4.685).

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Até mesmo dentro das favelas que a secretaria de segurança classifica como pacificadas o cenário diário é de confrontos intensos. No primeiro semestre de 2008 (o último ano pré-UPP), houve 114 tiroteios nessas favelas. No mesmo período de 2015 (desde então não há dados disponíveis), foram 523. Na quarta-feira, no Complexo do Alemão, o delegado da Delegacia de Combate às Drogas (Dcod), Felipe Curi, foi baleado no peito durante uma operação, mas passa bem. Nesses territórios, somente este ano nove policiais já morreram e, desde o início do projeto UPP, 38 foram assassinados e quase 400 ficaram feridos.

Foi numa dessas regiões que bandidos capturaram, ontem, três turistas suecos que fotografavam o Complexo do Lins. Eles acabaram libertados. Quase simultaneamente, no fim da tarde de quarta, a delegação da China de basquete masculino ficou em meio ao fogo cruzado do Complexo da Maré, que conta com uma Companhia Destacada da PM e um batalhão dentro da favela.

Apesar de as estatísticas escancarem o cenário caótico do Rio às vésperas dos Jogos Olímpicos, o secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, ignorou as perguntas feitas pelo site de VEJA. Para a Polícia Militar, responsável exatamente pelo policiamento ostensivo, não é o momento de falar sobre o assunto. Na última terça-feira  a cúpula da corporação resolveu conceder uma entrevista coletiva e os seis coronéis que estavam à mesa, entre eles o comandante-geral, Edison Duarte, se recusaram a responder perguntas sobre o tema.

“É hora de falar apenas sobre nosso planejamento olímpico”, afirmou o porta-voz da PM, coronel Oderlei Santos. No pronunciamento, os PMs anunciaram que durante os Jogos o patrulhamento será reforçado com mais 3.500 homens, elevando o número total de PMs nas ruas para mais de 14.900 diariamente. Depois que o sonho olímpico acabar, os cariocas voltarão a conviver com a dura realidade.

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