Por Luiz de França
Ainda não será no aniversário dos 455 anos de São Paulo, no próximo dia 25, que a maior cidade da América Latina ganhará de presente parte do seu centro restaurado. Mais de três anos depois do lançamento do projeto Nova Luz, que previa a recuperação de uma parte degradada da zona central, também conhecida como “cracolândia”, apenas duas das 23 empresas habilitadas ao recebimento de incentivos fiscais mudaram para a região, que engloba uma área de 218.000 metros quadrados. Segundo o secretário municipal de Coordenação das Subprefeituras, Andrea Matarazzo, serão necessários mais cinco anos para a finalização do projeto. “Ninguém reconhecerá a região depois disso. Ela voltará a ter o esplendor que tinha”, promete.
De acordo com o secretário, o projeto emperrou por causa da burocracia de desapropriação dos imóveis. Para simplificar o trâmite e dar rapidez ao processo, a prefeitura encaminhou para a Câmara dos Vereadores um projeto de concessão urbanística, que deverá ser votado em fevereiro e passará para a iniciativa privada o poder de desapropriar a área. A empresa vencedora, a ser licitada, poderá negociar os terrenos diretamente com os proprietários dos imóveis e executará algumas obras como contrapartida, definidas no projeto urbanístico. “A lei vai agilizar as desapropriações e vai ser mais vantojoso para os proprietários dos terrenos, que poderão negociar um valor maior do que faria se o fizesse com a prefeitura”, garante o secretário.
Até o momento, 57 imóveis foram demolidos nas 23 quadras compreendidas entre as avenidas Rio Branco, Duque de Caxias, Mauá, Cásper Líbero, Praça Alfredo Issa e avenida Ipiranga. Também está previsto para fevereiro o início das obras de infraestrutura em 16 ruas da região, com um custo de 13,7 milhões de reais para a mudança do calçamento, adaptações de acessibilidade e cabeamento subterrâneo. “Como grande parte das empresas interessadas são da área de tecnologia, precisamos adaptar a região para as necessidades delas”, diz Matarazzo.
Tráfico – Conforme o projeto, uma empresa habilitada é obrigada a investir na construção ou reforma do imóvel com o direito de ser ressarcida com a isenção do IPTU por 5 anos e ter redução do ISS para 2% por 10 anos. Mas quem passa pelas ruas sujas do centro, ainda utilizadas como reduto de traficantes e viciados em drogas, não coloca muita fé nos planos iniciados na gestão do ex-prefeito José Serra. “Não podemos confundir as pessoas, dependentes químicos que perambulam pela região, com o projeto Nova Luz. O projeto não é de cura dos dependentes químicos. Isso é uma questão de saúde pública.” Segundo o secretário, essa é uma situação que irá sendo resolvida à medida que a novas empresas começarem a se estabelecer na área trazendo consigo toda uma cadeia de outros serviços, como restaurantes e bares.
Entretanto, experiências de recuperação de áreas centrais degradadas em outras cidades ao redor do mundo já mostraram que não são eficientes quando não há uma preocupação das autoridades em ocupar a região com moradias. “É importante mesclar o uso de áreas restauradas para não limitar a ocupação por horários e dias determinados. É uma maneira de fazer com que região tenha vida própria”, diz o arquiteto e urbanista especialista em recuperação e conservação Olympio Augusto Ribeiro.
Kitinetes – Apesar da área em questão não ser completamente desprovida de moradores locais, o projeto Nova Luz prevê a construção de dois prédios residenciais do CDHU na rua dos Gusmões. “A iniciativa é válida, mas não deve contemplar apenas a população de baixa renda. É preciso estimular a ida de outras classes sociais com a recuperação de prédios antigos sem a perda de suas características.” Ribeiro critica alguns projetos de transformação de hotéis e prédios antigos residenciais em kitinetes, que estão sendo realizados por algumas incorporadoras na região. “Talvez a longo prazo isso prejudique o projeto de recuperação se as pessoas perceberem que perderam qualidade de vida e poderiam estar morando em outros lugares com mais espaço e uma qualidade de vida melhor”, afirma.
De acordo com dados do Sindicato da Habitação (Secovi-SP), o número de imóveis novos lançados no centro de São Paulo, que inclui a região do bairro da Luz, foi de 2.788 unidades entre o início de 2007 e novembro de 2008. Esses novos lançamentos seriam, na opinião do secretário de Coordenação das Subprefeituras, Andrea Matarazzo, um sinal da retomada do centro. Mas, para convencer a iniciativa privada a investir na recuperação de uma área deteriorada também é necessário que o governo dê o exemplo. Pensando nisso, a prefeitura pleneja transferir alguns órgãos para o local. A Guarda Civil Municipal (GCM) já está na região. Pelo menos outros dois órgãos deverão ser levados para lá: a Empresa de Tecnologia da Informação e Comunicação do Município (Prodam) e a subprefeitura da Sé.
Outros projetos – Se tudo der certo, São Paulo terá no seu 460º aniversário uma Luz repaginada com pelo menos 12 empresas de tecnologia e sistemas, como a IBM e a Microsoft, três empresas de call center, uma agência de publicidade, uma gráfica e cinco companhias de investimentos imobiliários. Segundo a Microsoft, a empresa tem a intenção de expandir sua área de Serviços e Desenvolvimento de Software para a região em 2010, data prevista para conclusão das instalações. Os detalhes serão definidos a partir do desenvolvimento do processo, ao longo dos próximos meses.
Atualmente, São Paulo tem pelo menos três outros projetos de revitalização em andamento, como a restauração da Praça Roosevelt, que está quase um ano atrasada, a revitalização das calçadas do centro e a vitalização da região do Parque D. Pedro. A prefeitura afasta a possibilidade de cortes no orçamento por conta da crise financeira mundial – afinal, esses planos já têm recursos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (Bid) ou verbas próprias já alocadas.