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O duelo entre o currículo político e o prontuário policial vai decidir o destino do cacique capixaba

A trajetória de Theodorico Ferraço pode ser abreviada pelas investigações sobre o envolvimento do atual presidente da Assembleia Legislativa e sua mulher com uma quadrilha que enriqueceu desviando royalties do petróleo

Por Júlia Rodrigues
24 jan 2013, 06h37

Inaugurado em 1967, quando conseguiu uma vaga na Assembleia Legislativa do Espírito Santo, o currículo político de Theodorico Ferraço, hoje com 75 anos, é ornamentado por quatro mandatos como prefeito de Cachoeiro de Itapemirim, três como deputado federal e mais três como deputado estadual. A coleção de cargos vistosos é tão impressionante quanto o prontuário, que inclui 23 processos em tramitação no Tribunal de Justiça, 13 dos quais por improbidade administrativa.

A última anotação na folha corrida começa a tornar improvável a materialização do sonho perseguido há meses: reeleger-se presidente do Legislativo, que comanda desde março do ano passado. Neste janeiro, em companhia da mulher, Norma Ayub, 52, prefeita de Itapemirim entre 2004 e 2012, Ferraço entrou na mira da Operação Derrama, arquitetada pela Polícia Civil e pelo Tribunal de Contas.

Solta nesta quinta-feira, Norma ficou confinada por cinco dias no Centro de Detenção Provisória Feminino de Viana, em Vitória, onde dividiu uma cela com duas presas e, segundo amigos e parentes, não teve direito ao uso de sabonete e desodorante.

Pai do senador peemedebista Ricardo Ferraço, Theodorico Ferraço vem adiando há tempos a transferência para o filho da chefia do clã. Visto por adversários como um Odorico Paraguaçu do Espírito Santo, o patriarca septuagenário pertence à espécie política cujos integrantes preferem atuar como protagonista na cena regional a ser mais um coadjuvante na paisagem federal.

Ferraço candidatou-se a mais um mandato no comando do Legislativo graças a uma mudança na Constituição estadual, aprovada pelos colegas, que removeu um trecho que proibia a reeleição do presidente. Mas o favoritismo começou a ser minado pelas aparições constantes no noticiário político-policial. O governador Renato Casagrande, até recentemente partidário da inscrição de uma chapa única na eleição da Mesa Diretora, agora foge do tema. A ideia pode ter sido fulminada pelo PT, que acaba de retirar o apoio a Ferraço.

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A Operação Derrama, desencadeada há cerca de um mês, desmontou uma quadrilha que extorquia multinacionais instaladas no estado e desviava dos cofres públicos parte do dinheiro arrecadado com os royalties do petróleo.

Para surpresa de quem tem alguma intimidade com a história de crimes impunes protagonizado por políticos do Espírito Santo, já são dez os administradores municipais apresentados a uma cela. O número pode crescer significativamente: o que se se descobriu pode ser a ponta do iceberg que esconde bilhões de reais obtidos com a exploração das jazidas marítimas.

Rodrigo Antonio

Exequiel Souza, 47, morador do Calafate: uma das vítimas da pobreza extrema.
Exequiel Souza, 47, morador do Calafate: uma das vítimas da pobreza extrema. (VEJA)
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As evidências de que algo está muito errado são visíveis a olho nu. Quem visita Itapemirim não consegue enxergar um orçamento milionário por trás da paisagem escurecida por incontáveis carências. Sobram moradores pobres, falta assistência social e as filas dos postos de saúde se estendem pelas calçadas. Na chamada comunidade do Calafate, por exemplo, a água encanada chegou há dois meses, muitas residências são desprovidas de energia elétrica e a maioria das crianças abandona a escola para ajudar os pais no corte da cana.

Os números atestam que a origem dos problemas está na péssima gestão dos formidáveis recursos que vêm do mar. A 128 quilômetros de Vitória, Itapemirim figura entre as cidades mais beneficiadas pela extração do petróleo: em 2012, o dinheiro dos royalties chegou perto dos R$ 180 milhões.

Essa fortuna passa ao largo das reais necessidades dos 31 mil habitantes da Itapemirim que sobrevivem em lugares ignorados por Norma e Ferraço ─ que governou de fato a cidade enquanto a mulher foi inquilina do gabinete reservado ao prefeito. O preço do esquecimento foi cobrado nas urnas de outubro passado. Estevão, o Amigo do Coração, candidato do PMDB com o apoio do casal, foi derrotado por 130 votos de diferença por Dr. Luciano, do PSB, primo de Norma e um de seus mais ferozes opositores.

Inconformados com o inesperado fracasso, o casal conseguiu que até o promotor de Justiça se engajasse no esforço destinado a impedir a posse do vencedor. Dr. Luciano teve contestadas as contas de campanha e foi acusado de comprar votos. Norma estava tão certa de que ganharia esse segundo turno disputado em tribunais que prometeu desfilar nua pelas ruas da cidade caso o primo se instalasse no gabinete que lhe pertenceu. Até agora a promessa não foi cumprida.

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Como a Operação Derrama está sob segredo de Justiça, seguem desconhecidas a extensão e a gravidade das maracutaias. O que já se sabe, contudo, é suficiente para colocar em risco a reeleição sonhada pelo presidente da Assembleia. Theodorico Ferraço pode acabar descobrindo que ficou mais complicado permanecer em liberdade que continuar no cargo que ocupa. O duelo entre o currículo e o prontuário vai decidir o destino do cacique capixaba.

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