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‘Não durmo sem uma arma’, diz secretário de Assuntos Fundiários

Responsável pela reforma agrária, Nabhan Garcia defende armas no campo, promete fechar escolas do MST e diz que não negociará com o movimento.

Por Hugo Marques Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 16 jan 2019, 15h12 - Publicado em 16 jan 2019, 10h45

Presidente licenciado da União Democrática Ruralista (UDR), Luiz Antônio Nabhan Garcia, 60 anos de idade, esperava ser ministro da Agricultura, mas acabou nomeado pelo presidente Jair Bolsonaro para o cargo de secretário Especial de Assuntos Fundiários, um posto de segundo escalão. Na segunda-feira 14, ele recebeu VEJA durante uma hora e meia em seu gabinete, na Esplanada dos Ministérios, em Brasília. Na conversa, defendeu o novo decreto de posse de armas, disse que não aceitará negociar com o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, a quem tachou de organização criminosa, e prometeu até mesmo fechar as escolas do MST: “São fabriquinhas de ditadores”. Apresentando-se como “ministro Nabhan”, também afirmou que pretende rever a demarcação da reserva indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima. A seguir, os principais trechos da entrevista:

O decreto sobre armas pode aumentar a violência no campo? Pelo contrário. Eu vou entrar na casa de uma pessoa para cometer um crime sabendo que ela está armada? Só se eu for burro. Na minha casa eu não durmo sem arma. A partir do momento em que o assaltante for abatido, de forma legal, em ato de legítima de defesa, os outros bandidos vão pensar duas vezes antes de agir.

Quantas armas o senhor tem? Tenho as armas que a lei me permite ter. Você acha que sou ingênuo de tornar público quantas são? Uma vez, a Polícia Federal invadiu a minha fazenda, usou quinze viaturas e encontrou quatro, cinco armas lá dentro. Depois me devolveu tudo, porque estavam todas devidamente registradas.

O senhor defende a ideia de que o fazendeiro responda a bala as invasões de terra? Cada cidadão sabe o que tem de fazer. Está previsto na legislação o chamado desforço imediato. É um direito meu reagir quando estou na minha casa, com a minha família e percebo que minha propriedade e a minha própria integridade física estão ameaçadas.

O senhor, então, não condena o fazendeiro que reage? Vocês, repórteres, são, em maioria, tendenciosos. Você vai lá e bota uma frase: ‘o ministro da Secretaria de Assuntos Fundiários defende que o fazendeiro ande armado e mande bala’. Essa questão de defender a propriedade com o desforço imediato é muito pessoal. As pessoas precisam de ter muito cuidado para não virarem alvo de uma armação, porque eles (sem-terra) são doutores no assunto.

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Que tipo de armação? Às vezes, o fazendeiro, na iminência de ser morto, de ver um filho assassinado ou ter a sede da propriedade queimada, vai lá e mata um sem-terra. O que acontece no outro dia? O sujeito que morreu vira mártir, e o que atirou passa a ser o vilão, vira réu, pega trinta anos de prisão. Está tudo invertido.

Como o senhor pretende tratar a questão da invasão de terras? Temos de mudar o Código Penal e o Código Civil, para que a pena seja muito maior. Não dá para um sujeito invadir uma propriedade, fazer o que faz e nem sequer ser preso. É preciso agravar a pena para o chamado esbulho possessório (ato de invadir um terreno com violência ou ameaça grave) e punir com rigor o cárcere privado de proprietário, a destruição dos bens, os incêndios etc. Quero discutir isso com o Congresso. Não dá pra eu chegar lá e falar: “Quero vinte anos de cadeia”.

Nas últimas três décadas, mais de 350 000 famílias foram assentadas. Todos esses processos serão revistos? Claro que serão revistos. O sujeito que está produzindo terá a escritura da propriedade, receberá uma política séria de financiamento e contará com a mão do governo a favor dele. Já quem não produziu, não prestou contas e mantém um gleba ociosa perderá o lote. Quanto você acha que custa um assentamento do começo ao fim? Uma fortuna.

O lema dos sem-terra é ocupar, resistir e produzir. Resistir é papo furado. É coisa de bolivariano. Estão só se ferrando.

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Qual a opinião do senhor sobre as 2 mil escolas do MST? Não dá para o Brasil admitir em pleno século XXI fabriquinhas de ditadores. Não dá para admitir escolas de marxistas, de leninistas, de bolivarianos, que ensinam crianças a invadir e cometer crimes. Vamos fechar as escolas e punir os responsáveis pela doutrinação. Aliás, isso tem de ser qualificado como crime. Crime de lesa-pátria.

Com base em qual lei o governo fechará escolas do MST? O MST é  uma organização ilegal, não poderia estar promovendo educação. É uma organização que não respeita a lei, não respeita o estado democrático de direito e não respeita o direito à propriedade. Uma organização que pratica o crime das invasões, de vandalismo, de ameaça, de cárcere privado. Uma organização que tem algumas lideranças envolvidas em crime de desvio de verba pública. Como que, diante de tudo isso, essa gente pode criar escola? Eles não estão qualificados para criar escola nenhuma. Usam de associações, de subterfúgios, para ensinar princípios de ditaduras tiranas, como são os casos de Cuba, Venezuela, Nicarágua.

João Pedro Stédile, líder do MST, chamou o governo Bolsonaro de ‘neofascista’. O Stédile deveria estar fazendo companhia para o Lula em um presídio. Ele fez parte de um governo que foi derrotado da forma mais democrática possível, pelo povo. Faz parte de um governo que levou o Brasil a 14 milhões de desempregados. Um homem que fala em fazer revolução vermelha, com um exército de bandidos, de foras da lei, não tem qualificação moral para falar de ninguém.

O senhor não vai dialogar com o MST? Este é o recado que recebi do presidente da República: estarei em sérios problemas se receber os foras da lei do MST, que não têm nem personalidade jurídica. O MST não tem CNPJ. Onde eles fizeram cursos, em Cuba, na Nicarágua, com as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), ensinaram que o correto é ficar na clandestinidade. Você já viu organização criminosa na legitimidade? Será que o PCC (Primeiro Comando da Capital) tem CNPJ? O Comando Vermelho tem CNPJ?

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O senhor não está se apegando a um aspecto formal, o do CNPJ, para virar as costas a um movimento combatido pela UDR? A UDR não tem nada a ver com esta história. A UDR é uma entidade legítima, que sempre promoveu a defesa do direito à propriedade, e nunca sofreu processo por agressão. Como posso dialogar com o Zé Rainha, que está condenado a 32 anos de cadeia por inúmeros crimes? Como posso dialogar com o Stédile, um sujeito que ameaçou pôr seu exército vermelho nas ruas para defender Dilma, para defender Lula?

Como a secretaria tratará povos indígenas e quilombolas? De forma técnica, dentro da lei. Nada mais será feito na base do tapetão, da pressão, da ameaça. Por exemplo: essas propriedades indígenas que estão na esfera administrativa ou mesmo na esfera judicial sem trânsito em julgado serão todas revistas.Você sabe que está cheio de laudo antropológico falso, que há atuação de ONGs com interesses escusos, que há atividades econômicas clandestinas em várias áreas indígenas.

O governo pretende rever a demarcação da reserva indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima? Estamos estudando a possibilidade de reverter dentro dos parâmetros legais. Na quinta-feira vou a Roraima. A situação no estado é catastrófica: 46% do território são terras indígenas demarcadas, 26% são parques nacionais e 80% das áreas restantes são de preservação ambiental. Há um frigorífico moderno em Roraima que está quase parado, não tem matéria-prima, não tem boi.

Com base em que lei o governo pode revogar a demarcação de Raposa Serra do Sol?  É uma situação que está sendo estudada para ver onde houve falhas, erros e procedimentos que fogem dos princípios legais. Se eu passo uma escritura para você e você descobre daqui a cinquenta anos que esta escritura era falsa, que a assinatura era falsa, que o laudo era falso, isso é passível de revisão. Para isso, teremos de fazer um levantamento sério. Há muitas situações em que foram feitos estudos ideológicos, estudos tendenciosos. Todo o processo fundiário será revisto de forma transparente, isenta e imparcial.

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O governo pretende interferir na ligação entre setores da Igreja e movimentos que lutam por reforma agrária? O governo não deve nem tem como se meter nessa relação. Agora, ele não pode aceitar que uma organização como a Pastoral da Terra, vinculada à Igreja Católica, dê ordens num ministério, como fazia antes. Se a Pastoral da Terra eventualmente promover, incentivar invasões, praticar atos de incentivo e de apologia do crime, será responsabilizada. Não tenha dúvida disso. Não acredito que a Igreja permitirá isso.

Esse raciocínio também vale para o Conselho Indígena Missionário (CIMI)? O CIMI tem todo o direito e a prerrogativa de fazer o trabalho com a comunidade indígena. Agora, se ficar comprovado que participou de invasão, que fomentou práticas criminosas, também será responsabilizado civil e criminalmente. As ONG’s que façam o papel delas. ONG’s, não façam apologia do crime. ONG’s, não desviem verbas públicas. ONG’s, não interfiram na administração pública. Neste governo, ninguém possui alvará de impunidade.

O senhor é favorável ao Pronaf, programa que destina mais de 20 bilhões de reais ao ano para o financiamento da agricultura familiar? Agricultura familiar não é minha área, mas sou contra o programa. Dinheiro público não é para ser jogado na lata do lixo. Dinheiro público não é para ser objeto de corrupção. Um país com tantos problemas como o nosso, com deficiências na saúde, na educação, com gente morrendo por falta de remédio, não se pode destinar dinheiro para encher o rabo de políticos.

E dinheiro para refinanciar as dívidas do agronegócio? Acho que não tem que ter tratamento diferenciado para ninguém, mas há situações em que comprovadamente, por questões técnicas, isso é necessário. Por exemplo: quando há uma frustração de safra por motivo de força maior. Aí o agronegócio precisa contar com a ajuda do governo. Agora, a chave do cofre é para quem trabalha e produz, não é para os amigos do rei.

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O que deve mudar na legislação da reforma agrária? Na questão sobre desapropriação, há exigências que são um pouco severas. Hoje, o proprietário de um imóvel rural, para cumprir a chamada função social, tem de atingir os índices do GUT, que é o grau de utilização da terra, e os índices exigidos pelo GEE, que é o grau de eficiência e exploração. Esses números são estabelecidos por um conselho e, na prática, está havendo uma cobrança muita alta para a propriedade ser considerada produtiva. Existem situações adversas para os produtores.

Em que casos pode ocorrer essa flexibilização? Quando há, por exemplo, quebra na produção de soja. Há lugares em que as secas são constantes, em que veranicos comprometem a safra, em que o boi não fica gordo. Como é que você vai exigir um índice de produtividade de 80% no semiárido? É preciso uma elasticidade nisso aí.

 

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