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J. Monteiro: “Na vida real, bandido não é daquele jeito”

Três anos após o encerramento das investigações, policial que foi consultor de Assalto ao Banco Central conta como foi o roubo ao BC de Fortaleza

Por André Vargas
18 jul 2011, 12h57

Em uma manhã de sábado, em 6 de agosto de 2005, quatro homens sujos de terra atravessaram um túnel de 75 metros de extensão e entraram no piso reforçado do cofre do Banco Central, no centro de Fortaleza (CE). Por três meses eles fizeram parte de um bando de 36 pessoas – a maioria homens – que escavou o túnel a partir de uma casa na vizinhança, onde funcionava uma empresa de fachada. Sem disparar alarmes, dar um tiro ou despertar suspeitas, os assaltantes levaram 164,7 milhões de reais do BC, a maior parte em notas de 50 reais. O golpe só seria descoberto quarenta horas depois, na segunda-feira.

Foi o maior assalto do século XXI e o segundo maior da história – perde para um em Londres, em 1987, em que foram levados 113 milhões de dólares. A história ainda atiça a imaginação três anos após as investigações serem encerradas, com 122 pessoas presas. E transformou-se em Assalto ao Banco Central, filme dirigido por Marcos Paulo, que vai estrear nos cinemas em 22 de julho. Também foi lançado o livro Assalto ao Banco Central (Editora Agir, 220 páginas, 29,90 reais), escrito pelo roteirista Renê Belmonte e pelo consultor José Gomes Monteiro Neto, o J. Monteiro, policial federal e escritor. A obra não fez muito sucesso entre os colegas de Monteiro por ter se valido de muita ficção para dar fluência à trama.

Do total roubado, a PF conseguiu recuperar apenas 50 milhões reais – 30 milhões em imóveis e bens. Com mais de 100 milhões ainda sumidos – suspeita-se que boa parte enterrado -, o assalto ao BC de Fortaleza ainda não é um caso encerrado para muita gente. No início de junho, quando o filme já estava pronto, agentes recapturaram, em São Paulo, um dos mentores e financiadores do golpe. Seu nome não foi divulgado. Bem mais conhecido, o prefeito do município cearense de Boa Viagem, Antônio Argeu Nunes Vieira, foi condenado em primeira instância a 49 anos de prisão por ter ser um dos financiadores do assalto.

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Acervo digital VEJA: “O maior roubo do Brasil”

“Tem muito bandido que fala que participou daquilo. É conversa. O caso está fechado”, diz um dos agentes, que não quis se identificar. Chamado de L., ele participou das investigações desde o princípio. “Livros e o filme inventam muito”, reclama. Equilibrado entre a ficção e a realidade, J. Monteiro aposta na carreira paralela de escritor enquanto atua nos preparativos para a segurança da Copa de 2014 e das Olimpíadas de 2016. “Era muita gente para um filme de uma hora e meia”, diz, citando os mais de 200 investigados. “Antes, só faziam livros e filmes sobre bandidos no Brasil. Agora a polícia está aparecendo”, conta.

Abaixo, a entrevista concedida por J. Monteiro ao site de VEJA:

Como o senhor entrou para o cinema e para literatura? Como a produção do filme ia usar o emblema da Polícia Federal para rodar Assalto ao Banco Central, era preciso autorização. Conheci o pessoal e eles me chamaram para ser consultor.

Que tipo de consultoria? Os atores não conhecem os jargões e os procedimentos da Federal. Não sabem nem como um policial segura uma arma. Eles precisavam de um policial do lado.

Mas como é que você pulou disso para o livro baseado no roteiro que deu origem ao filme? Quando surgiu a ideia de tornar o roteiro um livro, comecei a dar sugestões. Falei com o roteirista Renê Belmonte e as coisas funcionaram. Há uns anos, fiz a adaptação do roteiro do longa Federal para livro. O filme estreou este ano.

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Em um caso tão grande dá para contar tudo o que aconteceu? Foi o maior assalto da história do Brasil, o maior do século XXI e o segundo maior da história. Algo que repercutiu no mundo todo. São tantos os detalhes e tantas as pessoas. A investigação produziu um inquérito gigantesco com mais de 200 indiciados. Eram três os grupos que fizeram o assalto. Eles trabalhavam em turnos cavando o túnel. Era muita gente para colocar em um filme de ação de uma hora e pouco de duração.

Então Assalto ao Banco Central tem muita liberdade ficcional? Procuramos aglutinar as características dos principais criminosos em alguns personagens para fechar um grupo de apenas umas dez pessoas.

O que foi mantido? A estrutura central da trama. O assalto, o túnel, o dinheiro, as datas, algumas características de personagens. Até colocamos alguma corrupção policial no meio. Já o livro traz algumas biografias que não cabiam no livro. Ampliamos o contexto da história, mesmo com ficção, mostramos o que aconteceu e como era o tipo de gente que praticou o assalto.

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Como foram os sequestros praticados por policiais? Na vida real, policiais e criminosos sequestraram suspeitos para pedir resgate. O filme aborda alguns policiais civis de outros estados que foram para Fortaleza para praticar extorsão. Dos sequestros a gente não falou.

A polícia não recuperou nem a metade dos 165 milhões de reais. O que aconteceu? Não falo aqui em nome da PF, mas o que a instituição e o chefe da investigação acreditam é que todos os que participaram do assalto, direta ou indiretamente, estão presos ou mortos. Mas existem outras versões que, em resumo, afirmam que alguns escaparam. O livro e o filme vão por aí. É o que muita gente acredita.

E o dinheiro? Existem várias teorias que podem ser condensadas em duas. A primeira defende que não existe nada mais volátil que dinheiro vivo na mão. Também dizem que outros tantos milhões podem estar enterrados. Alguns deles compraram canos de PVC grandes com tampas de vedação de ambos os lados. Eles colocaram parte do dinheiro dentro e enterraram. Foram encontrados alguns desses tubos em fazendas, uma delas no Mato Grosso. Dizem que devem existir outros tubos enterrados pelo Brasil. É uma grande história.

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Os personagens centrais, Mineiro e Barão, são uma reunião de vários criminosos? Os principais bandidos na escavação foram identificados como Alemão e Moisés. Mineiro e Barão incorporam um pouco de cada um, além do trabalho dos atores. É claro que o Eriberto Leão é uma figura muito mais interessante que os bandidos. Ele é bom de papo, sedutor, veio da classe média, foi o único entre os bandidos do filme que fez faculdade. Na vida real, bandido não é daquele jeito.

E como os atores viraram policiais e bandidos na frente de um policial federal de verdade? Acho que é mais fácil virar bandido, um sujeito que não tem disciplina. Basta o ator trabalhar um pouco que o personagem aparece. Virar policial é um pouco mais difícil. Tem um jeito de falar, de agir, a postura na hora de segurar uma arma e efetuar uma prisão. É diferente até do treinamento das Polícias Militar e Civil.

O principal delegado foi vivido pelo Lima Duarte, que faz uma figura da velha guarda. Como ele reagiu? Ele me falou que era o primeiro policial que interpretava em todas as suas décadas de carreira. Antes, Lima Duarte fez bandidos e matadores, como Zeca Diabo (em O Bem Amado). Ele me perguntava a toda hora o que um policial deveria fazer a cada situação determinada. Eu contava e, no minuto seguinte, havia um policial na minha frente. Era impressionante o modo como ele incorporava o personagem. Os outros também eram bons, mas Lima Duarte é diferenciado.

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