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Higienópolis: de como a discussão sobre uma estação de metrô se transformou na maior polêmica da semana

Organizado pela internet, ato em protesto contra a mudança de estação no bairro atrai cerca de mil pessoas - bem longe dos 54.000 inscritos no Facebook, mas o bastante para fechar a Avenida Angélica

Por Adriana Caitano
14 Maio 2011, 08h44

Uma churrascada completamente inusitada ocorrida neste sábado deve pôr ponto final em uma polêmica que deixou o bairro de Higienópolis, na zona oeste de São Paulo, sob os holofotes que costumam destacar seus habitantes famosos. A decisão do governo estadual de mudar a nova estação do metrô de lugar após ser pressionado por um grupo de moradores mexeu com os brios da população. O assunto virou tema de debates acalorados na internet, piadas preconceituosas e um protesto em praça pública. Até o Ministério Público decidiu entrar na história.

A região é uma das mais nobres da capital paulista, com cerca de 80.000 moradores, imóveis valorizados, carros importados circulando em suas ruas e celebridades desfilando pelas esquinas. O bairro é conhecido também por abrigar uma das maiores comunidades judaicas de São Paulo e duas das faculdades mais caras da cidade – a FAAP e o Mackenzie -, além de estar perto do Estádio do Pacaembu. Há mais de dez anos, seus habitantes protestaram contra a construção do Shopping Pátio Higienópolis porque traria complicações ao trânsito. Hoje, o local é frequentado por mais de 1,6 milhão de pessoas.

Em agosto de 2010, um grupo de moradores organizou um abaixo-assinado para impedir a construção de uma das estações da nova Linha 6-Laranja do metrô na esquina da Avenida Angélica com a Rua Sergipe, onde atualmente fica o Supermercado Pão de Açúcar. Eles argumentavam que o metrô iria aumentar o fluxo de pessoas principalmente nos dias de jogos, já que o Estádio do Pacaembu é próximo ao local inicialmente escolhido e provocaria “ocorrências indesejáveis”. Também diziam que a estação ficaria muito próxima à Higienópolis-Mackenzie, que deve ser construída a três quadras dali.

Os críticos ao documento com 3.500 assinaturas relacionaram o pedido de mudança com a classe social dos habitantes de Higienópolis. As reclamações triplicaram na última quarta-feira com a notícia de que o governo havia cedido à pressão. O local da estação seria transferido para a Praça Charles Miller, exatamente como pediam os moradores listados no abaixo-assinado. “A minha impressão é de que esse grupo pequeno e que não representa a opinião da maioria conseguiu fazer uma grande marola”, diz a psicóloga Cássia Naves Fellet, que mora no bairro há 40 anos. “O metrô é importante para a cidade inteira e esta é uma região central onde circula muita gente que vem trabalhar ou passa por aqui porque precisa entregar coisas. Essas pessoas e muitos moradores precisam de opções de transporte.”

Encontro – O presidente da Associação Defenda Higienópolis, Pedro Ivanow, confirma que se reuniu com representantes do metrô em setembro do ano passado para apresentar argumentos sobre a desnecessária proximidade entre as estações. “Mas em nenhum momento houve sinal de preconceito ou pressão da nossa parte, apenas destacamos uma questão técnica com a qual o governo concordou, porque fazia todo o sentido”, afirma.

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Na quarta-feira, o Metrô de São Paulo divulgou uma nota oficial em que reconhece estar reavaliando a localização da futura Estação Angélica porque, no plano original, ela estaria a apenas 610 metros da Estação Higienópolis-Mackenzie e a 1.500 metros da PUC-Cardoso de Almeida, o que prejudicaria o funcionamento dos trens. “Essa reavaliação tem caráter exclusivamente técnico, em nada motivada por pressão dos moradores da região de Higienópolis, a favor ou contra a estação”, diz a nota. De acordo com o Metrô, a linha Laranja ainda está na fase de elaboração do projeto básico, que deve ficar pronto até o final do ano, prazo em que ainda são permitidas modificações. O novo local, portanto, ainda não foi definido.

O caso foi parar no Ministério Público, que exigiu explicações do governo sobre os critérios técnicos da mudança. “Pedimos também que eles informassem todas as distâncias entre as estações. Eu observei que entre a Liberdade e a Sé há um espaço menor que o das estações em questão, ou seja, esse critério métrico por si só não quer dizer nada”, argumenta o promotor de Habitação e Urbanismo Maurício Antônio Ribeiro Lopes. Ele propõe que seja feita uma audiência pública para esclarecer os critérios. “É preciso tornar mais transparente esse processo de escolha, que parece estar ao sabor dos ventos”, critica.

Discriminação – A afirmação de uma moradora ao jornal Folha de S. Paulo em 2010 foi a responsável por levantar a suspeita de que o pedido de mudança estaria relacionado ao preconceito contra pessoas que utilizam o transporte público. “Você já viu o tipo de gente que fica ao redor das estações do metrô? Drogados, mendigos, uma gente diferenciada”, afirmou a psicóloga Guiomar Ferreira ao jornal.

Quando saiu a notícia da alteração, internautas imediatamente a rechaçaram utilizando o termo “gente diferenciada”, que chegou ao ranking de termos mais citados do Twitter. A frase também nomeou o protesto realizado neste sábado. O “Churrascão da Gente Diferenciada” começou em frente ao Shopping Pátio Higienópolis e reuniu cerca de mil pessoas, segundo a CET. Bem menos que os 54.000 inscritos no Facebook, mas o bastante para fechar a Avenida Angélica.

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Na esteira da discussão, muita gente acabou exagerando no tom. O humorista Danilo Gentili causou indignação no Twitter ao tratar do assunto fazendo referência odiosa aos judeus que vivem no bairro: “Entendo os velhos de Higienópolis temerem o metrô. A última vez que chegaram perto de um vagão foram parar em Auschwitz [campo de concentração em que judeus eram exterminados durante o Holocausto]. Gentili tentou se desculpar mais tarde.

“Fui agredido pessoalmente por pessoas que interpretaram tudo errado, recebi e-mails ofensivos com palavras de baixo calão e ameaças de agressão física”, relata Pedro Ivanow, que ressalta não compartilhar da opinião de Guiomar Ferreira. “Eu acho que discutir ideias faz parte do jogo democrático, mas a gente precisa fazer isso com responsabilidade”.

Reinaldo Azevedo: À luta, higienopolitanos! Vamos botar fogo em pneus!

(atualizada às 18h38)

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