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Disque-Pedrinhas: uso de celular é comum em presídio

Site de VEJA flagrou mulheres de detentos conversando com os internos pelo celular ao lado dos agentes de segurança da penitenciária

Por Felipe Frazão 10 jan 2014, 14h36

“(sic) Ó, teu processo já está na procuradoria. Em nome de Jesus, antes do Carnaval vocês já vão estar na rua. Liga lá para o meu celular mais tarde [à noite] para a gente conversar”.

No esforço para tentar estancar a crise no sistema prisional, o governo do Maranhão anunciou que a Polícia Militar tem revistado as celas do Complexo Penitenciário de Pedrinhas, na Grande São Luís, com rigor e diariamente. Na semana passada, a Secretaria de Segurança Pública do Maranhão montou uma bancada para exibir o sucesso da vistoria: 300 armas improvisadas, serras, facas, uma pistola 380 e pelo menos quarenta aparelhos celulares. Não é possível afirmar se, desde então, os presos voltaram a se armar – espera-se que não -, mas é possível constatar que pelo menos a farra dos telefones está longe de acabar. Nesta quinta-feira, o site de VEJA flagrou duas mulheres de presos conversando ao telefone com detentos, que as aguardavam dentro das celas para a visita íntima. Pior: a conversa ocorreu a poucos metros dos funcionários terceirizados responsáveis pela segurança do local.

As duas mulheres conversavam com detentos das unidades I e II de Pedrinhas – nenhuma delas tem bloqueadores de celular. A Polícia Civil diz que dentro de São Luís I e II estão encarcerados os líderes da facção Bonde dos 40, que aterrorizou as ruas da capital em ataques selvagens a ônibus – um deles terminou com a morte da menina Ana Clara, de seis anos, queimada.

Por volta das 12 horas de quinta-feira, a secretária Fabiana*, de 29 anos, conversava com a reportagem sobre as visitas ao marido, preso há 13 anos no presídio, quando a entrevista foi interrompida pelo toque do seu celular: “Tá me ligando!”. Fabiana atendeu o telefone e teve início um diálogo: o detento perguntou se ela havia chegado fora do horário de visita, porque estava demorando para entrar, e se já tinha lanchado. Ela respondeu: “Que tarde, doido? Eu cheguei cedo, sô. O negócio é que a pessoa anda demais para chegar nesse fim de mundo aqui que é Pedrinhas”. Do outro lado da linha, o detento continuou reclamando da demora. “Meu filho, eu passei até aqui [da primeira revista] e agora preciso esperar até duas horas para fazer o cadastro”, disse Fabiana.

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A demora ocorreu porque Fabiana foi obrigada a trocar de roupa para entrar no presídio: uma das regras recentes impede, por exemplo, que alguém vestido com roupas escuras ingresse no complexo. Somente mães e mulheres podem entrar, por decisão da administração.

Diante da pressa do marido, Fabiana pede instruções para entrar. O preso, então, indica uma funcionária que poderia ajudá-la. “Ah, eu tô olhando… É ela, é? Mas parece que ela já está indo embora, meu filho… Tá, vou dar uma ‘chave’ nela, vou chamar ela aqui.”

Fabiana não conseguiu entrar na cadeia. Depois de abordar a funcionária, ela voltou a telefonar para o marido, que então passou o celular para um segundo detento conversar com a dona de casa Adriana Silvia*, de 39 anos. O marido dela foi condenado a 33 anos em regime fechado por dois homicídios e um assalto. Adriana disse à reportagem que ele está “no castigo há 15 dias” – ou seja, sem receber visitas – por causa de recentes mortes dentro da ala em que fica na unidade II. “A gente estava aí na hora da visita em que aconteceu essa morte. Eu só vi o cara morto no corredor e os dedos de outro jogados no chão. Eles ficam com raiva e se vingam nos mais fracos”, relatou a dona de casa.

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Quando pegou o telefone, Adriana também começou a responder pela primeira pergunta de todos os presos: por que não ainda entraram para visitá-los?

“Não está tendo [visita], não. Só [estão entrando] as coisas [comida e objetos de uso pessoal]”, respondeu Adriana. Em seguida, ela deu uma notícia ao preso: “Ó, teu processo já está na procuradoria. Em nome de Jesus, antes do Carnaval vocês já vão estar na rua. Liga lá para o meu celular mais tarde para a gente conversar”.

Em diálogo entre elas, na frente da reportagem, Fabiana perguntou a Adriana sobre o como estava o “processo”. Ela respondeu que “já está na corregedoria e vai baixar a pena deles para 12 ou 15 anos”. “Será que daqui para fevereiro eles estão na rua?”, perguntou Fabiana. “Ô, colega, tomara. Não veja a hora de eles saírem, porque o perigo está mais aí dentro do que fora. Aí todo mundo se faz de amigo, mas na hora que acontecem os problemas ninguém tem amigo.”

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Bloqueadores – Somente duas unidades prisionais das oito de Pedrinhas – a Casa de Detenção e o Centro de Detenção Provisória (CDP) – tiveram bloqueadores de sinal de celular instalados. Mas os aparelhos nunca funcionaram durante a fase de testes.

O secretário de Justiça e da Administração Penitenciária do Maranhão, Sebastião Uchôa, disse que mais de 1.000 celulares já foram apreendidos nos últimos dez meses em todas as unidades prisionais da Região Metropolitana de São Luís, da qual Pedrinhas é o maior complexo. Uchôa afirmou que servidores do Estado e funcionários terceirizados já foram flagrados tentando entregar celulares a detentos. Os servidores estão respondendo a processo administrativo e o contratado foi demitido, segundo o titular da pasta.

“Iniciamos um processo de implantação de bloqueadores de celulares nas unidades prisionais da capital a título de teste. Foram implantados inicialmente no Centro de Detenção Provisória e na Casa de Detenção, onde, até a presente data, não têm funcionado a contento, de forma que estamos analisando outras empresas do ramo a fim de instalarmos em definitivo bloqueadores de celulares em todas as unidades”, disse Uchôa.

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Policiais militares e civis que atuam na força tarefa afirmaram que “todos os dias” encontram novos celulares em Pedrinhas. O comandante do Comando de Policiamento Especializado, coronel Ivaldo Barbosa, estima que mais de quarenta aparelhos já tenham sido apreendidos após a entrada da PM, no fim de dezembro.

(*os nomes foram trocados)

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