
A vida de diarista não é fácil, mas não impede Iraci Oliveira, de 44 anos, de apreciar bens desejados por boa parte dos brasileiros. Moradora da zona leste de São Paulo, ela divide uma casa própria com o marido, Paulo, 46, motorista de microônibus, e os filhos Leandro, 23, e Glaucia, 22 – auxiliar-administrativa e única com carteira assinada. O lar é bem equipado: na sala, um DVD e um computador com acesso à internet. Na cozinha, um microondas para agilizar as refeições. Na garagem, um Palio 2002 comprado em 48 prestações no final de 2008. Todos têm celular. Com renda mensal de 2.800 reais, a família é símbolo da classe C, segmento que vem chamando a atenção de varejistas e fabricantes interessados em ampliar seu leque de fregueses.
Entre as companhias que estão voltando munição para os emergentes, inclusive os de classe D, estão marcas como a Coca-Cola, a Nestlé, a Procter & Gamble, o Wall Mart e o Pão de Açúcar. “Todas têm, em maior ou menor grau, estratégicas para esse nicho, o que não ocorria havia dez anos”, diz Haroldo Torres, diretor-executivo da empresa de pesquisa e consultoria Data Popular. Essas estratégias variam: vão do lançamento de bandeiras exclusivas para o segmento à abordagem porta-a-porta.
Aposta – Apostar na classe C pode ser até mesmo um bom negócio diante da crise. Para o economista Adriano Pitoli, da consultoria Tendências, o segmento não deve diminuir com a turbulência financeira, porque, da mesma forma como pode perder contingente para as classes D e E, pode receber emigrantes da B.
A opinião é dividida por Torres, da Data Popular: “A renda da classe C pode diminuir um pouco, mas não seria uma queda abrupta. Por outro lado, as classes D e E podem mesmo ter um aumento de renda durante a crise”, diz. “O salário mínimo subiu cerca de 11% neste ano, em termos nominais, e, em termos reais, deve aumentar algo como 6%”, explica. Ao mesmo tempo, nas contas dele, o Bolsa Família deve ampliar sua cobertura, atingindo 12,5 milhões de famílias até o fim do ano.
Estabilização – “Não há como não conversar com esse público”, diz o publicitário Gustavo Otto, diretor de planejamento da multinacional McCann Erickson no Rio de Janeiro. A agência acaba de lançar, no Brasil e em outros sete países da América Latina, uma unidade de negócios focada no consumidor emergente. A Bairro, como é chamada a unidade brasileira, já desenvolve dois projetos na área de alimentos. “Graças à estabilização da moeda, à queda no preço de produtos tecnológicos e agropecuários, ao maior acesso ao crédito e aos projetos sociais do governo, a classe C cresceu. Os consumidores emergentes são cerca de metade da população, e o mercado se tornou dependente deles”, avalia o publicitário.
Antes de montar a Bairro, a McCann contratou a Data Popular para traçar um perfil do consumidor com computador no segmento C-. Ser do nicho C- significa ter renda familiar mensal de 1.000 a 2.000 reais – na classe C, o valor varia entre 1.200 e 3.000 reais. Os dados levantados revelam um consumidor que, além de bom pagador, está ávido por produtos de qualidade e disposto a seguir comprando.
“A pesquisa mostrou que o consumidor emergente não quer mais uma marca B. Quando pode, ele compra a marca A”, afirma Otto. Pitoli, da Tendências, é da mesma opinião. “O brasileiro é muito receptivo a novos hábitos de consumo. A rápida penetração da telefonia celular e da internet são amostras disso.”
(Por Maria Carolina Maia)