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Skank: uma banda que foi coerente até no anúncio de seu fim

Em 30 anos de trajetória, o quarteto mineiro nunca se pautou pela obviedade. O anúncio do término de suas atividades não poderia ser diferente

Por Sérgio Martins Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 30 jul 2020, 19h20 - Publicado em 4 nov 2019, 18h53

Numa entrevista publicada no domingo, dia 03 de novembro, o guitarrista e vocalista Samuel Rosa anunciou o fim do Skank depois de três décadas de atividade. O quarteto mineiro fará uma turnê comemorativa até o final de 2020 e depois para por tempo indeterminado para que seus integrantes deem vazão aos seus projetos pessoais. A decisão é coerente com a trajetória do grupo, que nunca apelou para ideias mirabolantes ou para uma fórmula fácil para atingir o sucesso. Além disso, fazia tempos que o coração de Rosa, um dos nomes mais talentosos surgidos no pop/rock, não habitava as trincheiras do Skank. Não que ele fosse displicente: o quarteto mineiro compete com Lulu Santos o posto de artista com mais hit radiofônico por metro quadrado e sua performance de palco é sempre acima da média. Não havia com o Skank, no entanto, uma alegria perceptível na turnê dele com Lô Borges, que durou de abril a novembro de 2016. Ou mesmo a empolgação de participar de um tributo ao Who, organizada pelo guitarrista Zé Antônio, do grupo paulistano de rock alternativo Pin Ups (que, pena, ainda não viu a luz do dia).

 

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O Skank faz parte da minha trajetória jornalística. O primeiro contato se deu em 1991, quando eles participaram do Disco Reggae Night, festa dedicada ao ritmo jamaicano comandada pelo jornalista Otavio Rodrigues na casa de shows Aeroanta. Eram tão desconhecidos que a matéria da Folha de S. Paulo preferiu atentar pelo fato de Henrique Portugal (teclados) ter tocado num disco do Sepultura ao definir o som da banda. Naquela noite, era decisão de campeonato de futebol e o Skank tocou para mirrados 8 espectadores (eu entre eles). Houve mais alguns encontros desse tipo: duas outras noites micadas no Aeroanta – nova decisão do mundo da bola e Hollywood Rock, respectivamente em 1991 e 1993 – e um show na festa de lançamento de um selo de reggae pilotado pelo mesmo Rodrigues. O grande artista, diga-se, a gente reconhece em momentos como esse. E ali tive certeza que presenciava algo grande. Dois anos depois da estreia em palcos paulistanos, Fernando Furtado, empresário da banda, me liga para avisar que o Skank tinha lançado seu disco de estreia de maneira independente. Gostei tanto que escrevi uma resenha para o caderno Ilustrada, da Folha de S. Paulo. Poucos meses depois, os conheci no show de lançamento do disco, em Belo Horizonte.

Nossos caminhos voltaram a se cruzar em 1994 quando eu, contratado da revista BIZZ, os entrevistei para falar de Calango, seu segundo álbum. O Skank, que já tinha me conquistado pela qualidade musical, me surpreendeu pela coerência e crença no seu repertório. Calango teve uma gestação difícil, na qual a Sony (gravadora do grupo) quis fazer uma série de imposições, que iam do produtor ao repertório. O quarteto preferiu apostar nas composições de sua própria lavra e aceitou trabalhar com Dudu Marote, uma das opções sugeridas pela companhia. Marote ajudou muito na concepção de Calango, principalmente em relação aos timbres – ele ressaltou, por exemplo, o baixo de Lelo Zaneti e a bateria de Haroldo Ferretti, tornando-os mais próximos da sonoridade da Jamaica dos anos 90. A parceria de Skank e Marote se firmaria ainda com O Samba Poconé, de 1996, até hoje um dos álbuns mais celebrados do quarteto mineiro (embora prefira o conjunto das canções de Calango). O grupo se tornou um fenômeno de shows e vendas, inaugurando um período de esperança para o pop nacional – que tinha sido ofuscado inicialmente pelo sertanejo e pela axé music. Me lembro de uma apresentação no Olympia, uma casa de shows de São Paulo, onde eles receberam o disco de platina pelas 500 000 cópias de O Samba Poconé. Brinquei com Rosa sobre como o grupo evoluiu do ‘reggae intimista” dos primeiros anos para as grandes multidões. Ele então me disse que era muito legal ouvir isso de um jornalista que acompanhou a evolução do grupo. A performance no Olympia me apresentou outra atração de Belo Horizonte que me deixou encantado – o Jota Quest, que assinava como J. Quest e cuja linha musical ia mais para o soul e para a disco do que o pop de hoje em dia.

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Fernando Furtado gosta de usar uma linguagem futebolística para explicar as escolhas artísticas do Skank. Ele lembra de um gol do ponta esquerda Éder Aleixo na Copa do Mundo de 1982. Conhecido pelo chute potente, ele mandou uma bola colocada, de difícil defesa para o goleiro. Na visão de Furtado, o grupo nunca pode deixar de surpreender. O Skank, verdade seja escrita, não prima pela obviedade. O álbum Siderado, de 1997, marcou o início do distanciamento do quarteto dos gêneros jamaicanos – que àquela altura tinha assimilado por ene bandas brasileiras, numa tentativa de repetir a aura de sucessos como Garota Nacional e Te Ver. O “gol de Éder” atendeu pelo nome de Resposta, balada escrita em parceria com Nando Reis (aliás, rendeu um belíssimo podcast do radialista Marcos Vicca, que pode ser escutado aqui https://open.spotify.com/episode/40CKEMNosUXofGop8HLZIN?si=jObO5946SUawa6UQ1LxZfA).

Os álbuns posteriores do Skank nunca em encantaram da mesma maneira do que a tríade inicial (que tem sido revista em sua mais recente turnê), mas nunca deixei de admirar a coragem do quarteto em ir além das expectativas. E tenho de admitir que Cosmotron, de 2003, é um belíssimo disco. Num período em que bandas até mais novas que o quarteto mineiro se apresentam na base do piloto automático, a decisão de encerrar as atividades é mais uma lição de coerência de um grupo que mostrou ao Brasil como se faz música pop de qualidade. Que os novos rumos dos quatro meninos do Skank (Samuel Rosa, Lelo Zaneti, Haroldo Ferretti e Henrique Portugal) sejam tão brilhantes quanto à sua trajetória das últimas três décadas.

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