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Por Kelly Miyashiro
Críticas e análises sobre o universo da televisão e das plataformas de streaming
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‘Brincando com Fogo’: reality é analogia perfeita do namoro pós-pandemia

Na onda dos programas de pegação, atração da Netflix explora com sadismo a privação do sexo - e propõe que participantes priorizem interações emocionais

Por Eduardo F. Filho 28 abr 2020, 14h43

É antiga a tradição do reality show que busca unir pares, apostando no romance e na química entre duas pessoas como um atrativo para ser observado pelos espectadores do outro lado da TV, sejam estes solitários ou românticos incuráveis, também ávidos consumidores de roteiros folhetinescos. A evolução do formato “reality de namoro” desembocou recentemente no “reality de pegação”. Nessa nova cartilha, o compromisso está fora de cogitação. A regra é beber, dançar, beijar quantas bocas puder, e, quem sabe, ir para debaixo do edredom — isso, quando se escondem com o edredom. São programas como De Férias com Ex Brasil, da MTV, e Soltos em Floripa, do Prime Video, da Amazon, que refletem o cotidiano da geração dos aplicativos de relacionamento: a escolha de pretendentes é feita em segundos, baseada na aparência física, e raramente vai além do encontro de uma noite. A pegação descompromissada, porém, é um hábito que o coronavírus chegou para mudar.

E quem acompanhou a mudança, quase sem querer, foi o reality da Netflix Brincando com Fogo. Desde a sua estreia em 17 de abril, o programa (gravado antes da pandemia) cavou trincheira no ranking de mais assistidos da plataforma. Confinados em uma mansão à beira-mar, 14 jovens com aversão a relacionamento sério são especialistas em usar a beleza como arma de sedução para conquistar o sexo oposto (ou o mesmo sexo). Enquanto brindam suas qualidades físicas (literalmente, eles brindam pelo poder da beleza), os participantes são avisados que estão lá para concorrer a um prêmio de 100.000 dólares – cerca de 500.000 reais. Porém, há uma pegadinha: para levar a bufunfa, os jogadores não podem ter nenhuma relação sexual – nada de beijo, sexo, até masturbação. A grana é um incentivo para que eles aprendam a ter relações genuínas, baseadas na amizade, na conversa e no companheirismo. O que era para ser um paraíso se transforma em uma clínica de reabilitação sexual para compulsivos da fornicação.

A missão é difícil para o grupo. Cada infração isolada desconta um tantinho do prêmio final geral. Um beijo, por exemplo, custa 3.000 dólares, o equivalente a pouco mais de 15.000 reais. O ato sexual desconta 20.000 dólares (100.000 reais). No terceiro episódio, o valor do prêmio já caíra para 50.000 dólares (a série tem oito capítulos) – e não foi com amor verdadeiro e puro que os participantes chegaram a este resultado.

Elenco de 'Soltos em Floripa' o reality show foi obrigado a apagar dois episódios da Amazon Prime Video
Elenco de ‘Soltos em Floripa’ o reality show foi obrigado a apagar dois episódios da Amazon Prime Vídeo (Amazon Prime Video/Reprodução)

É difícil, em plena pandemia que limitou e muito o contato físico, não assistir ao reality e pensar como o coronavírus já tem afetado relações do tipo. Qualquer toque entre os desconhecidos nas cenas causa pensamentos que vão do “nossa, não é saudável fazer isso. E o corona?” até o “que saudade de fazer isso”. A dita geração Z e seus precursores, os millennials, agora são obrigados a namorar à moda antiga. Cada um na sua casa, com mais conexões emocionais do que físicas. Se o “cardápio deslizante” dos aplicativos, que expõe pessoas como produtos do supermercado, promovia perguntas como “qual sua altura?” e “quer beber algo hoje?”, agora as conversas são substituídas por “está se cuidando?”, “sentiu febre?”, “me indica um filme na Netflix?”, “tá usando álcool em gel?”.

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Por essa ótica, um De Férias com o EX parece datado: o namoro na vida real vai mudar, e os próximos realities terão de se adaptar. Claro, a vida pós-coronavírus pode até voltar ao que era antes, com pessoas aglomeradas em festas e beijos em estranhos. Mas, com certeza, vai levar um tempo. Até lá, resta ao jovem assistir ao sufoco dos participantes de Brincando com Fogo e pensar que, na vida real, o prêmio de 100.000 dólares nada mais é que a própria saúde.

 

 

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