Qual é a pronúncia correta de Roraima?
“Tenho ouvido principalmente na rede Globo que o nosso estado do Norte, Roraima, está sendo pronunciado como ‘Roráima’, e me causa espanto, pois sempre pronunciei e ouvia ‘Rorãima’. Você pode me tirar esta dúvida?” (Humberto Sorrento) Dizer que as duas pronúncias estão corretas – ou melhor, que o conceito de correção simplesmente não se aplica […]
“Tenho ouvido principalmente na rede Globo que o nosso estado do Norte, Roraima, está sendo pronunciado como ‘Roráima’, e me causa espanto, pois sempre pronunciei e ouvia ‘Rorãima’. Você pode me tirar esta dúvida?” (Humberto Sorrento)
Dizer que as duas pronúncias estão corretas – ou melhor, que o conceito de correção simplesmente não se aplica a variações desse tipo – é ao mesmo tempo óbvio e frustrante, porque não esgota a questão. Então vamos refletir um pouco sobre a maciça adoção da opção prosódica Roráima pelo jornalismo da TV Globo.
Situado entre falantes mineiros e cariocas, eu também cresci, como Humberto, ouvindo o estado do Norte ser chamado de Rorãima. É como ainda falo, pelo mesmo motivo que me leva a chamar o Jaime de Jãime e o andaime de andãime. Pode-se até dizer que isso corresponde a uma vocação prosódica dominante no português brasileiro. Em Portugal, andaime é andáime e Jaime é Jáime. Aqui, a tendência à nasalização dos ditongos seguidos de m ou n é tão forte que a maioria de nós ignora a pronúncia recomendada pelos sábios e transforma o adjetivo ruím em rúim.
Mas uma coisa é identificar uma linha de força, ainda que dominante, e outra bem diferente é tentar transformá-la em regra universal. Seria absurdo dizer que os nórdéstinos estão “errados” em sua tendência à abertura das vogais pretônicas. Tão absurdo quanto afirmar que a única verdade prosódica está com aqueles sulistas que ainda se apegam ao l da palavra Sul, em vez de falar Súu como a maioria dos brasileiros.
Explicada por fatores regionais, culturais ou educacionais, a variação prosódica é um fato em qualquer língua. A pronúncia universal não passa de um delírio totalitário. Sem optar por nenhuma das formas, o Houaiss registra que no início do século XX ainda havia três pronúncias de Roraima em circulação no país: Rorãima, Roráima e, acredite se quiser, Roraíma.
A última parece ter caído naturalmente em desuso, mas a segunda, um tanto artificialmente, deve gozar hoje de mais saúde do que nunca, de tão martelada pela rede de televisão hegemônica nos últimos anos. É aí que reside meu incômodo com a Roráima global. Seja porque consultou um foneticista lusitano, seja porque essa é (não é mesmo?) a prosódia preferida pelos próprios roraimenses, o fato é que com ela, em vez de refletir a diversidade dos falares brasileiros, a Globo contribui para achatar diferenças em busca de uma impossível pronúncia universal. Roráima não está errado. Errado é imaginar que só se possa falar assim.