Ironia, ironia…
– Viu que beleza o discurso da presidente? – Beleza por quê? Onde você viu beleza naquilo? – Você está brincando? A mulher não completa uma única frase, é totalmente incapaz de fechar um raciocínio! – Ah, agora entendi. Você estava sendo irônico quando falou em beleza. – Claro que eu estava sendo irônico, cara. […]
– Viu que beleza o discurso da presidente?
– Beleza por quê? Onde você viu beleza naquilo?
– Você está brincando? A mulher não completa uma única frase, é totalmente incapaz de fechar um raciocínio!
– Ah, agora entendi. Você estava sendo irônico quando falou em beleza.
– Claro que eu estava sendo irônico, cara. Ainda não estou gagá.
– Tem que ter cuidado com a ironia, amigo. As pessoas não entendem.
– É mesmo? Tenho ouvido muito esse papo. Acho uma balela.
– Balela, nada. Pura verdade. A decodificação da ironia exige uma sofisticação que a educação brasileira não deixa ao alcance da maioria da popu…
– Sei, sei. Então imagina a seguinte cena, mais velha que a minha avó: o guarda prende o batedor de carteira em flagrante e leva o infeliz pra delegacia. Assim que o vê, o delegado diz: “Bonito, hein?”. O batedor de carteira é magrelo, desdentado e analfabeto. Sabe muito bem que bonito não é, e aquilo que faz para ganhar a vida, muito menos. Mas acaba de ouvir aquelas palavras enigmáticas: “Bonito, hein?”. E agora? O batedor de carteira pensa um pouco e conclui então que o delegado: A. é um homem gentil que tenta amenizar a dor daquele momento de vicissitude com um elogio estético hipócrita, mas bem-intencionado; B. está passando uma cantada nele; C. está sendo irônico. Qual é o seu palpite?
– Me recuso a responder.
– Difícil, né?
– Você é muito mala mesmo.
– Parabéns pela sofisticação de decodificar a minha ironia. O batedor de carteira não faria melhor.
– Vê se não enche.