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Brasil não aprendeu nada com a greve dos caminhoneiros de 19 anos atrás

Em 79, categoria ameaçou sem sucesso outra paralisação nacional: em todos os episódios, houve filas, pânico e pedidos exagerados

Por Marcos Rogério Lopes Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 30 jul 2020, 20h27 - Publicado em 31 Maio 2018, 21h47

Parte de uma reportagem de VEJA de 39 anos atrás bem poderia ter sido reproduzida nos últimos dias, na cobertura das manifestações que deixaram os brasileiros desnorteados. “Os caminhoneiros, principalmente os que transportam combustível têm um considerável poder de fogo: eles podem parar o país se resolverem suspender suas atividades”. O trecho acima foi extraído da edição 570, e referia-se à greve que tumultuou Minas Gerais em agosto de 1979.

“O cenário escolhido foi a assustada Belo Horizonte. (…) Nas imediações da Refinaria Gabriel Passos, próxima à capital mineira, dezenas de caminhões-tanque desligaram seus motores e estacionaram na rodovia Fernão Dias. Quando o movimento já contava com mais de 800 adesões, os grevistas expuseram suas reivindicações: nada menos que 100% de aumento nas taxas de frete, para compensar a alta de 50% nos preços do óleo diesel, a diminuição das comissões cobradas pelas empresas transportadoras e ‘melhores condições de trabalho’.”

Curioso ver que também lá atrás faziam pedidos ousados e colocavam o governo contra a parede. A reação da população também lembra muito a que se viu na greve recente. “A notícia da paralisação se espalhou rapidamente pela cidade de Belo Horizonte provocando o pânico numa população sobressaltada por passeatas, tumultos e cenas de violência nas ruas da cidade. Imediatamente formaram-se longas filas nos postos de gasolina, como se fosse um antecipação de uma sexta-feira que prometia ser catastrófica para os proprietários de automóveis em todo o país [havia a ameaça de a greve se tornar nacional} — e que afinal não houve. Inevitavelmente, os supermercados foram invadidos por senhoras convencidas de que era chegado o momento de estocar comida e esperar pelo pior.”

Em 1979, um ensaio de como parar o país fechando as estradas (reprodução/VEJA)

A matéria mostra o susto que a população sofreu com o risco de se ver sem alimentos e combustível e entrava no drama dos caminhoneiros tentando entender que sujeito é esse que conhecemos (e conhecíamos) tão pouco. “Quem são esses indivíduos anônimos que vivem distantes dos grandes centros de decisão, mas que de repente se mostraram capazes de alterar profundamente a rotina de vida do país? É certo, desde logo, que sua vida é dura”, diz o texto, que traz ainda dados, hoje obviamente desatualizados, sobre a realidade desses profissionais: “63% deles são proprietários” dos veículos, por exemplo.

Tudo muito parecido com a situação atual, inclusive numa análise que, como tudo o que é escrito em VEJA, o Brasil leu 39 anos atrás. E mesmo assim pouca coisa foi feita. “Um colapso perfeitamente previsível pelas estatísticas. O Brasil possui apenas 30 000 quilômetros de ferrovias (só 10% a base de energia elétrica) contra 200 000 quilômetros de rodovias. E, embora os trens carreguem cinco vezes mais peso, por litro de combustível, que os caminhões, sua importância continuou sendo ignorada pelas autoridades nos últimos anos. Mesmo depois da crise do petróleo, de 1973, o transporte rodoviário de carga continuou crescendo mais do que o ferroviário: 34,6% e 10,8%.”

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A greve dos anos 1970 acabou dias depois após acertos estaduais garantirem aumentos dos fretes. Em Minas, a elevação oferecida pelo governo foi de 21%.

Se em 1979 houve um ensaio de greve nacional, ela ocorreu mesmo vinte anos depois. Na edição de 4 de agosto de 1999, com o título “A força do caminhão”, VEJA mostrou as lições deixadas pela paralisação daquele ano. Entre as quais: “o Brasil depende demais das estradas”, “o sistema ferroviário é pequeno”, “a hidrovia é subutilizada” e “o risco de greves continua”. Aprendemos com o passado, mas ignoramos o aprendizado.

O mote da reportagem foi destacar a força que a categoria provou ter em 1999. “No Brasil, o movimento está aprendendo a descobrir a própria força, tanto que precisou de seis meses para preparar sua primeira grande greve. Há uma dezena de associações e sindicatos e não surgiu até agora nenhuma liderança sólida.”

“As grandes paralisações ocorridas no Brasil sempre foram conduzidas posenr sindicatos fortes. A greve dos caminhoneiros foi uma exceção. Nasceu em uma categoria sem nenhuma tradição sindical e totalmente desorganizada. Ainda assim, acabou paralisando o país.”

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Em outro trecho, ao narrar o encerramento do protesto daquele ano, a matéria deixou um alerta. “Com a mesma rapidez com que os caminhoneiros entupiram as estradas, eles voltaram à vida normal depois de fechar um acordo. No entanto, o governo não atendeu plenamente às exigências do movimento e empurrou a solução para a frente. Atenção: tudo pode recomeçar.”

Edição de VEJA de agosto de 1999 deu destaque à greve dos caminhoneiros (Reprodução/VEJA)

Assim como a edição de 79, a de 99 poderia ser copiada e colada na cobertura de 2018. “O brasileiro descobriu tardiamente a força do caminhão. O governo também foi apanhado de surpresa e durante dias ficou catatônico, incapaz de se decidir por algum tipo de ação que coibisse o abuso que os caminhoneiros cometiam contra o resto do país. Entre outras coisas, acabou por descobrir quais eram as queixas desses homens que levam a vida na boleia. Considerando as principais economias do mundo, o caminhoneiro brasileiro dirige o veículo mais velho, tem o menor vencimento e atua nas piores estradas. Apesar disso, paga pedágio e combustível relativamente caros para a renda que tem e as condições de trabalho em que sobrevive.”

Na paralisação de 19 anos atrás, havia três reivindicações basicamente: redução das tarifas de pedágio, novo cálculo para definir o valor do frete, que cobrisse custos como alimentação, pedágio e manutenção do veículo, e a aprovação de uma lei que abrandasse as punições de trânsito à categoria.” Diante dos pedidos, VEJA não teve receio em analisar assim as propostas:

“A maior parte da lista de pedidos dos caminhoneiros é uma sucessão de absurdos. Em nenhum país do mundo calcula-se o pedágio de acordo com a profissão do motorista, mas em razão de modelo e tipo de veículo. (…) Qualquer diferenciação é subsídio a ser pago pelo resto dos usuários da rodovia. No caso do cálculo do valor do frete de forma que os beneficie, o pedido é estapafúrdio. (…) O pedido referente às multas chega a ser indecente, pois os caminhoneiros querem uma licença para delinquir.”

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