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Por que não vou à rua: pauta é ruim, e ato é oportuno a esquerdas

É claro que haverá pessoas na manifestação — tomara que seja a maioria! — que eu jamais classificaria de “xucras”. Mas, sem dúvida, os xucros estarão lá

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 26 mar 2017, 09h38 - Publicado em 26 mar 2017, 08h29

Por que não vou às ruas neste domingo? Em razão de uma combinação de fatores. E expô-los aqui é parte do meu compromisso com os leitores. Comecemos pela pauta, que não é unificada (e não há pecado nenhum nisso), embora haja, sim, um núcleo comum.

Em defesa da Lava Jato
Todos irão às ruas, segundo entendi, em defesa da Lava Jato. Como já escrevi aqui, não creio que ela esteja sob ataque. Ou me digam de quem parte. A propósito: não tocar na operação corresponde a defender ilegalidades como entrevistas coletivas para vazamentos em off?

Fim do foro especial
Também isso parece ser pauta de consenso dos que vão. Bem, infelizmente, postas as coisas assim, não é uma boa ideia. Acho, sim, que é preciso mudar as regras. Mas extinguir o foro especial, que nada tem de privilegiado, seria conduzir o país à ingovernabilidade, dada a estrutura do Poder Judiciário no Brasil.

Se um juiz do Findomundistão do Sul puder mandar prender um ministro de estado, aí vem o caos. Comparar o modelo brasileiro com o americano, por exemplo, é de uma estupidez alarmante justamente porque não se levam em consideração as diferenças de arcabouço jurídico. Foro especial para autoridades existe em praticamente todas as democracias do mundo, ainda que não seja a Corte Constitucional, como aqui. Reduzir o número de pessoas sob tal estatuto, ok. Extinguir? Seria uma asnice.

Pela reforma da Previdência
Tal item está na pauta do Movimento Brasil Livre, mas não na do Vem Pra Rua. Como já noticiou a imprensa, parte considerável dos que se identificam com o grupo é contra a reforma. Sim, é claro que sou a favor, mas acho um despropósito que se defenda uma mudança que depende basicamente da adesão de políticos num ato contra… políticos! Não faz sentido. E, se não faz sentido, não é bom. Ou a direita agora vai marchar para malhar políticos, cobrando que estes, no entanto, se insurjam contra as esquerdas?

Contra o financiamento público
Isso foi acrescentado de afogadilho, pegando carona no noticiário. Todos os grupos estão nessa. Bem, a minha tradição contra essa modalidade de financiamento é mais longa do que a de qualquer outro brasileiro. Mas pergunto: restou alternativa, já que o financiamento de empresas não voltará para 2018? Deixar a lei como está corresponde a entregar as eleições federais e estaduais nas mãos do crime organizado. Afinal, quem vai protestar quer o quê?

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Contra o voto em lista
De novo, ninguém me vence em quilometragem de texto contra o expediente. Ocorre que, se houver o fundo público, não resta outro caminho. Ou digam qual. “Ah, mas não queremos também o fundo público.” Entendo! E devem ansiar pela quadratura do círculo e se opor ao teorema de Pitágoras… Afinal, o que é que se vai cobrar dos políticos? Que eles votem zero de financiamento público, ficando apenas com o fundo partidário, e que a lista seja aberta?  Até o Marcola ficaria corado de defender essa proposta.

Contra a anistia ao caixa dois
Bem, no dia em que convocarem uma concentração em defesa do surrealismo e de propostas fantasmas, aí, então, eu vou. Integra a parte unificada da pauta, mas não passa de um delírio coletivo inspirado pelo Ministério Público Federal. Não há caminho legal para isso. O MPF continuará a acusar os investigados com o mesmíssimo arbítrio de antes. Ocorre que, para atribuir a alguém que recorreu ao caixa dois o crime de corrupção, será preciso evidenciar ao menos a promessa da contrapartida. Assim é a lei hoje. E assim continuará. Ocorre que o anseio do MPF é definir que “caixa dois” é, por si, corrupção e lavagem.

Contra a anulação de provas vazadas
Parece que até isso vai à rua. Bem, é só contaminação da pauta pela militância de extrema direta contra o ministro Gilmar Mendes. Obviamente, o tribunal terá de discutir, sim, a invalidação de provas vazadas — mas quando vazadas pela acusação. Atribuíram ao ministro o que ele não disse porque, parece, isso excita a fúria de alguns.

Em favor da revisão do Estatuto do Desarmamento
Que eu saiba, o Vem Pra Rua não endossa o item, que é defendido pelo Movimento Brasil Livre e pelo Nas Ruas — nesse caso, até com um vídeo de Jair Bolsonaro, em que ele se diz contra o “mimimi do feminicídio” e a favor de que as mulheres tenham armas para praticar “homicídios”. De todas as propostas, é a mais estranha, extemporânea e incompreensível. Por que isso agora? Sei lá. Há um projeto de lei (PL 3722/12) propondo a extinção do Estatuto e a adoção de uma tal Lei do Controle de Posse de Armas.

A íntegra do Estatuto está aqui. Como resta claro, inexiste a proibição de a pessoa ter uma arma em casa ou na empresa. As restrições bastante severas dizem respeito ao porte. Acho tecnicamente injustificável a mudança da lei. E esse papo de que desarmar a população é coisa de ditadura e tirania é uma bobagem gigantesca. Ou a Venezuela, um dos países mais armados do mundo, seria um paraíso. Caracas é hoje a cidade com a maior taxa de homicídios por armas de fogo do mundo.

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O IDH da Europa desenvolvida (0,926 na Alemanha) e dos EUA (0,920) são compatíveis. A taxa de homicídios por 100 mil habitantes no primeiro país, onde armas não circulam, corresponde a um quinto da americana. Dia desses, um rapaz me mandou um comentário: “Os carros matam mais! Vamos proibi-los?.” Eis o que poderia ser um clássico da falácia, muito repetido em sites americanos pró-armas. Em primeiro lugar, se eliminados fossem, ninguém mais morreria por causa deles, certo? Acho que não preciso explicitar o segundo termo da comparação. Em segundo lugar, cumpre indagar se carros e armas expressam necessidades sociais e econômicas idênticas, em especial nas democracias mais avançadas do mundo.

Mas cada um marche por aquilo que achar melhor.

Encerrando
Eis as razões por que não vou. Discordo da pauta. Acho que o que nos faz falta é um pouco de tranquilidade para criar espaços institucionais. Infelizmente, os que existem estão um tanto esgarçados. Os indicadores econômicos já melhoraram bastante. Conseguimos mandar para bem longe o desastre para onde nos empurrava o petismo. Mas o perigo segue lá no horizonte.

E não! É claro que haverá pessoas na manifestação — tomara que seja a maioria! — que eu jamais classificaria de “xucras”. Mas, sem dúvida, os xucros estarão lá e tendem a ter, desta feita, um peso relativo superior ao de outras manifestações. E isso, por si só, já desaconselharia a realização do evento.

Que tudo transcorra em paz e que o ato não seja mais uma pecinha no jogo dos que estão apostando tudo no fim do governo Temer. Um ato contra os políticos, hoje, não há como, colabora para a metafísica das esquerdas.

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