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O direito jogado na rua e os Meninos do Brasil

O que há em comum entre José Eduardo Elias Romão (foto), o jovem chefe do Dejus (Departamento de Justiça, Classificação, Títulos e Qualificação), aquele a quem quero pagar um Chicabon, e os invasores da USP? Aparentemente nada. Na essência, tudo. Romão, se bem se lembram, é aquele jovem rapaz a quem se pretende dar o […]

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 31 jul 2020, 22h27 - Publicado em 22 Maio 2007, 07h18

O que há em comum entre José Eduardo Elias Romão (foto), o jovem chefe do Dejus (Departamento de Justiça, Classificação, Títulos e Qualificação), aquele a quem quero pagar um Chicabon, e os invasores da USP? Aparentemente nada. Na essência, tudo. Romão, se bem se lembram, é aquele jovem rapaz a quem se pretende dar o poder de decidir o que podemos ver na TV e a que hora. O Dejus, como afirmou Diogo Mainardi, é o Dops do governo Lula, mas encanta jornalistas, como direi?, recentes e antigos. Uns são arrogantes demais para reconhecer a ignorância; outros não menos arrogantes para reconhecer um erro. O que remete a uma boa frase do poeta português Antero de Quental: a gravidade numa criança é tão desagradável quanto a tolice num velho. Mas sigamos. Tentei saber que idade tem o tal Romão. Não consegui. Alguém me diz que é 32. Tendo concluído direito em 1999, pode ser até mais jovem. Ele é membro de um troço que me pareceu meio assustador chamado “O Direito Achado na Rua”. Falo dele daqui a pouco. Volto aos invasores da USP.

Como vocês sabem, a reitora da universidade, “Tia” Suely Vilela, havia dado aos invasores um novo prazo para deixar a reitoria: zero hora de hoje. Daqui a pouco vou dormir. Não sei se, ao acordar, os valentes já terão deixado o prédio. Ou se terão sido retirados de lá pela Polícia. Todos os motivos alegados para a ocupação foram solenemente desmoralizados pelos fatos. As Mafaldinhas e Remelentos, além da transgressão às normas vigentes na USP, agora cometem uma ilegalidade flagrante: negam-se a cumprir um ordem judicial. Volto a Romão.

Ele foi levado ao ministério, num cargo importante, por Márcio Thomaz Bastos. Seu currículo é este: “formado em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (1999), especialização em Direitos Humanos pela Universidade de Brasília (2001), mestrado em Direito pela UnB (2003) e atualmente doutorando na mesma instituição. É diretor do Departamento de Justiça, Classificação, Títulos e Qualificação (Dejus) do Ministério da Justiça, professor do Instituto de Educação Superior de Brasília (Iesb) e assessor Especializado do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea-DF).” Com essa experiência, ele não serviria nem para carregar a pasta de Bastos em sua banca privada. Mas o preclaro achou que o rapaz estava preparado para assumir o tal do Dejus. Não sendo a sua notória especialização a tê-lo conduzido ao cargo, restaria, então, o seu saber notabilíssimo. Quem sabe um novo gênio do direito teria surgido entre nós!? Volto aos invasores da USP.

Todo movimento estudantil é, em certa medida, político. O da USP é um pouco menos do que isso: é partidário. Conduzido majoritariamente por petistas, conta com a chama revolucionária de membros do PSTU e do PSOL. Adversário, como se vê, do PSDB, que está no governo do Estado, trata-se, no entanto, de um movimento governista se a referência for o Planalto. É evidente que nenhum deles ignora que a USP, a Unicamp e a Unesp gozam de condições de ensino e de uma legislação muito mais, vá lá, “avançadas” do que as vigentes nas universidades federais por exemplo, onde o movimento estudantil está encabrestado pelo vergonhoso oficialismo da UNE. Estes que dizem defender o “ensino púbico, gratuito e de qualidade” fecham os olhos para a maior transferência de recursos feita para o ensino privado em toda a história do país por meio do ProUni. Nunca se viu nada igual. Houvesse algum programa parecido no Estado, gerenciado pelo PSDB, não tardaria a acusação de privatização do ensino público. Não estão, como se vê e se sabe, em defesa de uma causa universal, mas a serviço da pauta do partido do poder. Movimentos violentos a favor do governo tipificam, na história, ou a juventude fascista ou a juventude comunista. Intimados pela Justiça — pelo estado de direito — a deixar o prédio, não reconhecem a autoridade de um Poder da República. Volto a Romão.

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Li na sua biografia (ele já tem uma; a mais precoce que eu tinha lido até hoje era a de Sartre) que ele é membro daquele negócio chamado “O Direito Achado na Rua”. E eu quis saber o que era isso. E fui pesquisar. Há várias páginas na Internet. Uma delas é esta. E informa o seguinte: “O Direito achado na rua é uma linha de pesquisa do Núcleo de Estudos para a Paz e Direitos Humanos. Baseado na Nova Escola Jurídica Brasileira (NAIR), de Roberto Lyra Filho, o Direito achado na rua é o encontro dos Novos Movimentos Sociais e o Direito, indo além do legalismo, procurando encontrar o direito na ‘rua’, no espaço público, nas reivindicações do povo.” Entenderam? Nós temos um diretor do Departamento de Justiça, Classificação, Títulos e Qualificação que, segundo entendi, filia-se à corrente que acha que é preciso dar um pé no traseiro do legalismo em favor dos “direitos” daqueles que acham que têm direitos. Lembrei-me que Eros Grau, ministro do Supremo, disse em entrevista que foi comunista, que “quem foi nunca deixa de ser” e que põe um pouco de sua “utopia” nos seus julgamentos. Continuo com Romão.

Na referida página, explica-se o sentido do projeto “O Direito Achado na Rua”:
“O sentido do projeto é compreender e refletir sobre a atuação jurídica dos Novos Movimentos Sociais e:
Determinar o espaço político no qual se desenvolvem as práticas sociais que enunciam direitos a partir mesmo de sua constituição extralegal, por exemplo: direitos humanos;
Definir a natureza jurídica do sujeito coletivo capaz de elaborar um projeto político de transformação social e elaborar a sua representação teórica como sujeito coletivo de direito;
Enquadrar os dados derivados destas práticas sociais criadoras de direitos e estabelecer novas categorias jurídicas para estruturar as relações solidárias de uma sociedade alternativa em que sejam superadas as condições de espoliação e de opressão do homem pelo homem e na qual o direito possa realizar-se como um projeto de legitima organização social da liberdade.”

E aí eu comecei a entender por que aquele jovem rapaz foi guindado a posto tão importante. Mais do que isso: se ele não serve para carregar a pasta de Bastos num escritório privado — que garantiu a este gigante fama e, sobretudo, fortuna —, está muito apto a ser uma peça de uma maquinaria destinada a consolidar o poder de um partido político. Reparem que “O Direito Achado na Rua” está preocupado com “as práticas sociais que enunciam direitos a partir mesmo de sua constituição extralegal”. Vale dizer: trata-se do direito de desrespeitar a lei, entenderam? E seu viés ideológico não poderia ser mais explícito. Essa gente quer ver “superadas as condições de espoliação e de opressão do homem pelo homem e na qual o direito possa realizar-se como um projeto de legitima organização social da liberdade”. Trata-se de um trechinho de uma vulgata marxista. Volto aos estudantes da USP.

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Eles também não reconhecem os limites legais em sua ação. Como Romão, querem “enquadrar os dados derivados destas práticas sociais criadoras de direitos e estabelecer novas categorias jurídicas para estruturar as relações solidárias de uma sociedade alternativa”. Ou em miúdos: querem desrespeitar a lei e ter reconhecido o direito de desrespeitá-la. Uns promovem a desordem na base; o outro, conceitualmente ao menos, no topo. Uns mimetizam, nas roupas, nos hábitos, na música, nos aromas, aquele misto de Woodstock com São Tome das Letras; o outro veste um terninho de bom burocrata e oferece seus serviços ao Moderno Príncipe.

Com que então temos um diretor no Ministério da Justiça, pasta encarregada de fazer valer as leis, que se filia intelectualmente a um grupo que se interessa pelo extralegal e trata a ordem vigente com um esgar de desprezo: “legalismo”? A este rapaz alguns jovens graves e alguns velhos tontos pretendem entregar uma legislação lábil, sujeita a toda ordem de subjetivismos, para decidir o que devemos ou não ver na televisão? A este moço se concederá até mesmo o poder de dizer o que é e o que não é aceitável no jornalismo de TV? Ficaremos entregues à vontade juvenil de quem pretende superar “as condições de espoliação e de opressão do homem pelo homem”. Entendo: vai ver ele quer o contrário…

Eu não tenho nada contra a que o sr. Romão vá achar o direito na rua, na chuva, na fazenda ou numa casinha de sapé. Gente com esse perfil provoca em mim um tédio que seria invencível, não fosse o fato de que ele exerce a sua utopia numa diretoria do Ministério da Justiça. E, até onde entendo, nós pagamos o seu salário para que ele cumpra e faça cumprir a lei. Aliás, vou tentar falar nesta terça com o ministro Tarso Genro. Quero saber o que ele acha de ter um diretor com esse perfil, dedicado à tarefa de superar o “legalismo”. Fiquei sabendo também que, em sua vasta experiência e vida venturosa, o jovem Romão é um crítico feroz da televisão. Ferocíssimo. Ele a detesta. Como a televisão que conta no Brasil é a Globo, suponho que ele não está bravo com a programação da Band ou da PlayTV.

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Na USP, um grupo de vândalos resolveu arregaçar a porta em busca do “direito achado na Reitoria”. No Ministério da Justiça, um engravatado filia-se à corrente dos que querem o “Direito Achado na Rua”. É a geração petista no poder. São os Meninos do Brasil.

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