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O Brasil dos bebês chorões à espera do estado-babá

Eu realmente não me importo de ter de voltar a alguns fundamentos do que é uma democracia, do que é um estado de direito. A cada dia, estou mais convicto de que o pilar do regime democrático é a liberdade. Um país livre tende para a justiça e a igualdade. Uma nação que tivesse a justiça […]

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 31 jul 2020, 06h31 - Publicado em 9 abr 2013, 14h01

Eu realmente não me importo de ter de voltar a alguns fundamentos do que é uma democracia, do que é um estado de direito. A cada dia, estou mais convicto de que o pilar do regime democrático é a liberdade. Um país livre tende para a justiça e a igualdade. Uma nação que tivesse a justiça ou a igualdade como o seu fundamento primeiro tenderia para a tirania. Aliás, esses verbos nem precisam estar no futuro do pretérito. Conhecemos essas experiências.

No dia 1º de abril de 2011, escrevi aqui um texto cujo título é o que vê ali no alto. Eu o reproduzo abaixo, com algumas alterações, para dar conta da situação presente. O curioso é que o deputado Marco Feliciano, cujo nome nem cito, já é personagem do artigo. Leiam.
*

Há uma igreja no Kansas, nos Estados Unidos, chamada Westboro Baptist Church. É composta por um bando de malucos liderados por um tal Fred Phelps. Ele teria recebido uma mensagem divina informando que Deus está castigando as tropas americanas no Iraque e no Afeganistão por causa da… tolerância com o homossexualismo!!! A missão de sua igreja seria anunciar isso ao país. E o que faz Phelps e seu bando de lunáticos, boa parte gente de sua própria família? Cruza o país de norte a sul, de costa a costa e, onde houver o funeral de um soldado, lá estão eles brandindo cartazes como o que se vê acima: “Obrigado, Deus, pelos soldados mortos”, “Obrigado, Deus, pelo 11 de Setembro” e “Você vai para o inferno”.

Fiéis da Westboro Baptist Church num protesto em frente à Suprema Corte no dia 6 de outubro do ano passado: ali está o cartaz infame

Eles são asquerosos? Não tenho a menor dúvida. A direita americana os despreza. Os liberais (a esquerda de lá) não menos. Albert Snyder, pai de um fuzileiro naval processou a Westboro. Numa primeira instância, a Justiça lhe concedeu uma indenização de US$ 11 milhões, reduzida depois a U$ 5 milhões. O caso foi parar na Suprema Corte. Atenção! Por 8 votos a 1, os juízes decidiram que a Primeira Emenda garante à canalhada o direito de dizer o que diz (leia reportagem na Time). Se bem se lembram, a Primeira Emenda é aquela que proíbe o Congresso até de legislar sobre matéria que diga respeito à liberdade de expressão e à liberdade religiosa.

Em entrevista à VEJA, o economista Walter Williams, que é negro, professor de economia na Universidade George Mason, na Virgínia. sintetizou muito bem:
“É fácil defender a liberdade de expressão quando as pessoas estão dizendo coisas que julgamos positivas e sensatas, mas nosso compromisso com a liberdade de expressão só é realmente posto à prova quando diante de pessoas que dizem coisas que consideramos absolutamente repulsivas”.

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Williams, um negro que se negou a servir no Exército num tempo em que havia discriminação racial nos EUA, é contra leis que proíbem a discriminação. Contradição? Ele explica:
“Sou um defensor radical da liberdade individual. A discriminação é indesejável nas instituições financiadas pelo dinheiro do contribuinte. A Universidade George Mason tem dinheiro público. Portanto, não pode discriminar. Uma biblioteca pública, que recebe dinheiro dos impostos pagos pelos cidadãos, não pode discriminar. Mas o resto pode. Um clube campestre, uma escola privada, seja o que for, tem o direito de discriminar. Acredito na liberdade de associação radical. As pessoas devem ser livres para se associar como quiserem.”

Williams, admito, é um desafio e tanto para a cultura dos chorões autoritários que se está formando no Brasil. Então fiquemos com a Suprema Corte, insuspeita de ser composta por libertários radicais. Pode haver coisa mais desprezível do que faz aquela igreja? Estou certo de que vocês, como eu, ficaram um tanto nauseados ao ler a história. Fico imaginando como é o tal pastor, seu universo mental. Notem que o pai do soldado não recorreu a Justiça para mandar a turma para a cadeia ou impedi-la de se manifestar — isso seria impensável. O que a Suprema Corte decidiu é que o grupo pode dizer suas maluquices SEM SER MOLESTADO PELO ESTADO.

Será que a cultura da liberdade acabará nos Estados Unidos antes que possa chegar aqui? A pressão pelo politicamente correto é grande por lá também — aliás, é a pátria desse tipo de abordagem. Mas é algo que se resolve entre os indivíduos, entre os cidadãos. Aqui, já há gente apelando quase às Forças Armadas! Caetano Veloso, inconformado com um vídeo na Internet — visivelmente uma dessas bobagens sem consequência —, botou pra fora  o lado carcará-pega-mata-e-come e chegou a perguntar onde estava a Abin que não tomava providências.

(…)

Ontem [no dia 31 de março de 2011], um deputado tuitou uma mensagem relacionando o sofrimento na África a castigos divinos etc. Ganhou destaque na imprensa. Tenta-se fazer um deus-nos-acuda do que falou. Cria-se a impressão de que há um grande e gigantesco movimento homofóbico, de que a intolerância está em todo canto, de que marchamos para o esmagamento das minorias etc. Poderia haver melhor propaganda para a aprovação da tal lei que pune a homofobia — junto com a liberdade de expressão?

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Esse suposto clima de discriminação é absolutamente falso. O que há no país, aí sim, é um bando de gente em busca do Estado patrão, do Estado juiz, do Estado polícia, do Estado babá — para usar a expressão do jornalista americano David Harsanyi, que lançou livro recentemente no Instituto Millenium — mesmo em matérias que devem ser resolvidas pelo confronto de ideias.

Brincando com fogo
Os tolerantes intolerantes estão brincando com fogo! Já há hoje no Supremo quem considere que “moralidade” pode ser incompatível com “segurança jurídica”. No dia em que isso triunfar, coleguinha, os donos da moralidade da hora, sejam quais forem, poderão suspender os seus direitos alegando a defesa da… moral! Já há hoje, no Supremo, quem ache que os direitos individuais estão esvaziando os coletivos — e seria, preciso, pois, dar menos importância ao indivíduo. Se isso triunfar um dia, coleguinha, é você que poderá ser esvaziado de seus direitos constitucionais em nome do que as maiorias da hora ou as minorias influentes acharem que compõem o bem comum.

A democracia é um troço difícil mesmo! Ela também existe para as pessoas que detestamos, capazes de erguer cartazes infames no momento de nossa maior dor. A questão é saber se os pilares da sociedade democrática estão sustentados no princípio da liberdade da palavra ou no princípio da censura. Lembro que uma associação em Pernambuco, num termo de ajustamento com o Ministério Público, foi obrigada a divulgar outdoors afirmando sobre o MST o exato contrário do que  pensa. “Que se dane aquela associação! Eu gosto do MST!” Pois é… Se você delega a um ente estatal o poder de operar essa transformação, está se oferecendo para ser coelho do mágico.Os militantes das chamadas “minorias” poderiam parar de se comportar como bebês chorões, que apelam à mão forte do estado diante da primeira contrariedade. E nada disso, rigorosamente nada!, nem no mérito nem no resultado de sua militância, torna certas as ideias de Marco Feliciano.

A questão é saber se ele tem ou não o direito de dizer as coisas consideradas erradas.

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