Membro do Diretório Nacional do PT me atribui o que não escrevi num texto que até traz uma coisa certa ou outra. Ah, sim: para ele, protestos de rua devem forçar PT a se reciclar pela esquerda…
Valter Pomar, membro da direção nacional do PT, merece a caracterização que Karl Marx fez de um contemporâneo seu: “caos de ideias claras”. A gente lê o artigo do homem, concorda aqui e ali — mesmo sabendo que se está a ler o texto de um petista —, mas é impossível aceitar o conjunto. Petistas […]
Valter Pomar, membro da direção nacional do PT, merece a caracterização que Karl Marx fez de um contemporâneo seu: “caos de ideias claras”. A gente lê o artigo do homem, concorda aqui e ali — mesmo sabendo que se está a ler o texto de um petista —, mas é impossível aceitar o conjunto. Petistas não conseguem mais gerar teoria política, só teoria do poder, que é outra coisa. Ele escreve um texto sobre as manifestações, apresenta sua leitura dos fatos, lembra a seus companheiros que não é correto chamar os manifestantes de fascistas e coisa e tal e me cita. Pomar, é claro! acha que aquilo que eu aponto como um risco óbvio é justamente o que o PT deve fazer. Huuummm… Faz sentido! Não fosse assim, ele não seria um esquerdista, e eu não seria um liberal, que ele chama “direitista”. Para mim está bom. Eu o deixo na companhia de humanistas como Stálin e Mao Tsé-tung e escolho o grupo de assassinos contumazes como Churchill e Adenauer. O que lhes parece?
Tenho compromisso com ideias, com fatos. Irrita-me quando alguém do meu lado diz burrices. Mas folgo quando alguém do campo de adversário — nas ideias, já que não disputo o poder, mas Pomar sim — até escreve coisas consequentes. Nem tudo em seu artigo está errado. Ele afirma, por exemplo:
“(…) [os protestos] reafirmaram que os movimentos sociais existem, mas que eles podem ser espontâneos. E que alguns autoproclamados “movimentos sociais”, assim como muitos partidos “populares”, não conseguem reunir, nem tampouco dirigir, uma mínima fração das centenas de milhares de pessoas dispostas a sair às ruas, para manifestar-se.”
Pomar está certo nesse trecho. É isso mesmo! Destaco outro acerto seu:
“As manifestações (ainda) são expressão de uma insatisfação social difusa e profunda, especialmente da juventude urbana. Não são predominantemente manifestações da chamada classe média conservadora, tampouco são manifestações da classe trabalhadora clássica.
A forma das manifestações corresponde a esta base social e geracional: são como um mural do Facebook, onde cada qual posta o que quer. E tem todos os limites políticos e organizativos de uma geração que cresceu num momento ‘estranho’ da história do Brasil, em que a classe dominante continua hegemonizando a sociedade, enquanto a esquerda aparentemente hegemoniza a política.”
Só há um erro aí. Esse “aparentemente” está fora de lugar. A esquerda, de fato, e Pomar sabe disto, hegemoniza a política. Até Maluf e Delfim Netto são hoje, digamos, funcionários do petismo. Mas é claro que há erros aos montes, e não há a menor graça aqui em apontá-los porque a parte saborosa deste texto, havendo uma, está em destacar que, em alguns aspectos, o “direitista” Reinaldo Azevedo concorda com o “esquerdista” Pomar. É claro que há humor involuntário em seu texto — já que todo esquerdista é, antes de tudo, engraçado. Leiam isto:
“Mas a direita tem dificuldades para ser consequente nesta disputa. O sistema político brasileiro é controlado pela direita, não pela esquerda. E as bandeiras sociais que aparecem nas manifestações exigem, pelo menos, uma grande reforma tributária, além de menos dinheiro público para banqueiros e grandes empresários.”
Huuummm… O “sistema político é controlado pela direita”? Pomar teria de definir, então, o que é o “sistema político” — dominado, como se sabe, pelo PT. Quanto a dar menos dinheiro para banqueiro e grandes empresários, convenham, isso tem de ser negociado com seus companheiros, né? Ou o PT não está no poder há dez anos? Se a memória não me falha, e nunca falha, Lula, quando presidente, se orgulhava do fato de que o sistema financeiro nunca havia lucrado tanto como em seu governo, o que é uma das poucas verdades inquestionáveis que disse.
Muito bem. Pomar só precisa corrigir a frase que me atribui. Eu não escrevi o que ele disse que escrevi. E isso é coisa feia. Sustenta ele:
“Não há como deslocar a correlação de forças no país, sem luta social. A direita sabe disto tanto quanto nós. A direita quer ocupar as ruas. Não podemos permitir isto. E, ao mesmo tempo, não podemos deixar de mobilizar.
Se não tivermos êxito nesta operação, perderemos a batalha das ruas hoje e a das urnas ano que vem. Mas, se tivermos êxito, poderemos colher aquilo que o direitista Reinaldo Azevedo aponta como risco (para a direita) num texto divulgado recentemente por ele, cujo primeiro parágrafo afirma o seguinte: ‘o movimento que está nas ruas provocará uma reciclagem do PT pela esquerda, poderá tornar o resultado das urnas ainda mais inóspito para a direita’.
Num resumo: a saída para esta situação existe. Pela esquerda.”
Errado!
Eu escrevi isto:
“Os liberais do miolo mole coloquem o burro na sombra: movimento que está nas ruas provocará uma reciclagem do PT pela esquerda, poderá tornar o resultado das urnas ainda mais inóspito para a democracia e para a racionalidade e tentará deixar o país à mercê de grupelhos organizados”.
Pomar fraudou meu texto. Ele substituiu, por sua conta, “democracia” por “direita”. É claro que ele não considera “direita” e “democracia” palavras sinônimas. De todo modo, não tem por que ficar chateado. Dilma decidiu levar para o palácio os “movimentos sociais”. Com eles, vai tentar pressionar os outros dois Poderes, buscando, inclusive, impor a reforma política malandra do PT.
Ô Pomar, veja aí. Para concordar ou discordar, não preciso fraudar o que você escreveu. Corrija o seu artigo. Eu não me importo de ser chamado pelo “esquerdista Valter Pomar” de “o direitista Reinaldo Azevedo”, ainda que seu partido, não eu, seja aliado de Maluf, Delfim Netto e Afif. Você, meu camarada, forma esse consórcio de poder, não eu. Ainda que ele seja trocado por outro em 2014, continuarei do lado de fora, é bom notar. Haja dialética de segunda para explicar, né? Mas tudo bem! Mas eu me importo, sim, que você me atribua o que não escrevi. E eu escrevi que a reciclagem do PT pela esquerda, que acontecerá, é ruim “PARA A DEMOCRACIA”, não “PARA A DIREITA”.
A direita, Pomar, se vocês vencerem, continuará no poder, como sua dileta aliada.