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Blog do jornalista Reinaldo Azevedo: política, governo, PT, imprensa e cultura
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Mas por que Palocci fez aquilo? Ou: Lula quer impor a Dilma o que nem ele conseguiu fazer

Há uma questão relevante nesse imbróglio todo envolvendo Antonio Palocci que parece ser de natureza subjetiva (a subjetividade dele), pessoal mesmo, mas que é, no fim das contas, a mais política de todas elas: POR QUE PALOCCI FEZ AQUILO TUDO? Vou tentar dar a resposta política; a outra, que remete ao fundo de sua consciência, […]

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 31 jul 2020, 11h45 - Publicado em 6 jun 2011, 07h03

Há uma questão relevante nesse imbróglio todo envolvendo Antonio Palocci que parece ser de natureza subjetiva (a subjetividade dele), pessoal mesmo, mas que é, no fim das contas, a mais política de todas elas: POR QUE PALOCCI FEZ AQUILO TUDO? Vou tentar dar a resposta política; a outra, que remete ao fundo de sua consciência, bem, essa não tenho como saber. Antes, porém, que responda, seguem algumas considerações que me parecem importantes.

Vai ou fica?
Os repórteres de Brasília dos diversos veículos, como vocês podem ver abaixo, dedicaram o fim de semana a um exercício de quase adivinhação, com base no que lhes disseram os políticos ouvidos: Palocci vai ou fica? Há diferenças aqui e ali, mas uma coisa é comum: a avaliação de representantes do governo e da oposição é a de que ele não tem como continuar. Ou tem — e Dilma terá uma crise mais ou menos permanente nas mãos, sem contar o risco de sempre de que vaze “a lista”. Se e quando isso acontecer, o jornalismo vai cumprir a sua tarefa, por mais que Palocci lastime, como fez na entrevista à Globo. E que tarefa é essa? Saber se o agora ministro, então ministro presuntivo, atuou para beneficiá-las.

Ele jurou de pé junto que não agiu em nenhuma demanda que dissesse respeito ao dinheiro público. Ocorre que se entende que seus clientes são potentados da economia nacional. Direta ou indiretamente, sempre têm relações com o estado. É o caso dos bancos, por exemplo. Pode não parecer, eu sei, mas eles atuam num modelo similar ao da concessão. Empreiteiras são empresas privadas, mas seu maior cliente é o governo. Chega a ser fascinante que Dilma, que tem uma oposição numericamente raquítica, como nunca antes na história da República, esteja vivendo uma crise política porque o chefe da Casa Civil é muito leal… “a seus clientes”, na especiosa síntese de Michel Temer (PMDB), vice-presidente da República.

O desfecho, convenham, deveria ser óbvio e rápido. E isso nada tem a ver com inocência ou com culpa. Se houve ou não crime, não se sabe, mas esse não é o ponto. A questão é primordialmente política. Dissesse a coisa respeito apenas à esfera privada, ninguém estaria torrando a paciência do ministro. Oposicionistas e governistas sabem muito bem que só uma ação resgata a autoridade da presidente da República: a demissão de Palocci — ainda que isso possa significar uma atrapalhação episódica.

Lula na parada
Não esqueci a questão essencial, não, aquela do primeiro parágrafo. Mas há ainda um outro aspecto relevante. Dilma falará com Lula antes de tomar uma decisão. É de todo inconveniente que pareça que é ele quem dá a palavra, não ela. A sem-cerimônia com que ele irrompeu no cenário político na semana retrasada contribuiu para desfazer aquela certa aura de seriedade e suposta competência silenciosa de Dilma. O ex-presidente alimentou a suspeita de que sua sucessora não governa. Uma coisa é ele ligar para a ministra do Meio Ambiente e soltar os cachorros: “Porra, Izabella [Teixeira], eu estou esperando essa licença ambiental desde agosto…” Outra coisa, muito distinta, é a desconfiança de que ele possa dizer: “Porra, Dilma…”

E Lula já disse que não quer a demissão de Palocci; que isso significaria ceder à oposição; que seria um sinal de fraqueza; concedida essa cabeça (na formulação lulística), outras serão pedidas etc. NOTARAM QUE LULA QUER IMPOR A DILMA O QUE NEM ELE PRÓPRIO CONSEGUIU: A MANUTENÇAO DE PALOCCI? Por que não agiu da maneira como agora recomenda? E olhem que a oposição era mais forte.

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Essa análise de Lula, de resto, vem a contrapelo da história. A demissão do então ministro da Fazenda, que era considerado o grande esteio da racionalidade econômica, acabou fortalecendo o governo politicamente. Muito poderão dizer: “Ah, mas talvez o segundo mandato tivesse sido menos estatista com Palocci…” Não sei. Não conto a história do que poderia ter sido; conto a que foi. A saída do então ministro da Fazenda evidenciou que certos compromissos do governo não dependiam de um homem, mas da escolha de um caminho.

Finalmente, antes que volte ao meu primeiro parágrafo, noto que um “nada consta” do procurador-geral da República contribuirá, no máximo, para alimentar certa suspeição sobre o… procurador-geral da República, prestes a ser, ou não, reconduzido ao cargo. Nem entro no mérito se seria justa ou injusta, mas pode acontecer. Não servirá para fortalecer o ministro POLITICAMENTE. Agora vamos ao ponto da largada.

Mas por que Palocci fez isso?
É bem provável que Palocci esteja falando a verdade quando afirma que não há nada de legal ou tecnicamente errado em sua empresa. Eu acho essa afirmação coerente com os fatos históricos conforme eles se afiguravam em 2006, ano em que ele criou a Projeto, que o tornou um dos mais novos milionários brasileiros.

Querem saber? Acho que Palocci jamais imaginou que voltaria a ser um dos homens formalmente mais poderosos do Brasil. Ele mesmo deve ter pensado:
“Que diabos! Partiu do meu gabinete a ordem para violar o sigilo bancário de Francenildo, um homem humilde, um pobre-coitado. A operação foi realizada pela presidência de uma estatal subordinada a mim. Trata-se de um crime contra um direito assegurado pela Constituição da República. De todas as barbaridades feitas por gente do meu partido, essa, de certo modo, é a mais grave. Se o sigilo de um Francenildo não está assegurado, então estará o sigilo de quem? Foi horrível! O rapaz tinha recebido dinheiro do pai, que não o havia reconhecido como filho antes. A vida dele foi exposta de forma miserável! O que fizemos! Que topete o nosso! Posso me eleger deputado; continuarei a ser muito influente, MAS DUVIDO QUE O STF VÁ ME INOCENTAR. Eu era o chefe da CEF; a quebra do sigilo só interessava a mim. Ainda que eu venha a negar que tenha dado a ordem e que acreditem nisso, eu vi o extrato de Francenildo. Vi e não fiz nada para punir os violadores; no mínimo, prevariquei.”

Querem saber? Palocci só criou a sua empresa, fez tudo direitinho, registradinho, pagando os impostos porque desconfiava, em 2006, que não iria se levantar — não a ponto de ser considerado o condestável da República. E decidiu enriquecer; só não sei se esperava tanto.

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Então, queridos leitores, vem a matéria que realmente interessa à reflexão: que tipo de sistema político é esse que “perdoa” alguém como Antonio Palocci? Não! Não lhe falta competência para muita coisa da área política (na Casa Civil, noto, seu desempenho já vinha sendo pífio). Não lhe falta compromisso com a estabilidade. Não lhe falta apego à racionalidade. Todos os sensatos apreciamos muito tais virtudes. Mas calma lá! Seu nome apareceu no olho do furacão de um caso gravíssimo. A “absolvição técnica” que obteve no Supremo não anulou aquela história indecente!

Eu realmente acho que Palocci ajeitou as coisas em 2006 para ganhar dinheiro com sua consultoria, de olho, como sustentou aquela primeira nota divulgada pela Casa Civil, no fato de que o passe de um ex-ministro vale muito “no mercado”. Considerando que conhecia a administração por dentro e que dava início à sua aventura privada, o mais ético teria sido se afastar também da Câmara, é claro. Quanto Palocci evocou, estupidamente, o exemplo de Pedro Malan, esqueceu de notar que o ex-ministro da Fazenda de FHC foi para a iniciativa privada (precisava trabalhar, o que conta a seu favor!), mas sem exercer cargo público nenhum! Ele não era da “turma do governo”; não pertencia a uma bancada, não era membro de comissões da Câmara, não era relator de emendas, não tinha influência em órgãos da administração. Ao contrário: embora tivesse deixado régua e compasso a seus sucessores, era satanizado em palanques.

Acontece que o sistema político brasileiro é o que é, e Palocci, vejam que coisa!, foi vendo crescer de novo o seu prestígio — jamais abalado junto ao empresariado — até chegar à condição de principal assessor da candidata Dilma e, depois, primeiro-ministro. da presidente Dilma Eu não tenho dúvida de que, à medida que foi se tornando mais importante, também foi aumentando o faturamento da Projeto, até chegar aos formidáveis R$ 20 milhões de 2010. Empresas gostam de consultores bem-sucedidos e influentes, que “sabem” do que estão falando.

Em suma, Palocci não apostou, em 2006, que o sistema seria eticamente tão frouxo a ponto de permitir que ele se reabilitasse para ser a figura central de um futuro governo. Mas ele se tornou. E um sistema político que assimila a falta que Palocci cometeu tem um problema muito sério. É o mesmo que hesita agora em dar como causa vencida um chefe da Casa Civil, homem de estado, que é “muito leal a seus clientes”.

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