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Blog do jornalista Reinaldo Azevedo: política, governo, PT, imprensa e cultura
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LITERATURA – As vozes de “A Boca da Verdade”

Este blog tem uma seção chamada Avesso do Avesso, onde eu pretendia publicar regularmente textos sobre… sobre “não-política” — assim é melhor. Mas lá me ficou a ambição pelo meio do caminho, e alguns artigos sobre literatura, cinema, cultura acabaram estacionados no meu primeiro livro, Contra o Consenso. Outros tantos se perderam por aí. Esta […]

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 31 jul 2020, 17h02 - Publicado em 21 ago 2009, 07h23

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Este blog tem uma seção chamada Avesso do Avesso, onde eu pretendia publicar regularmente textos sobre… sobre “não-política” — assim é melhor. Mas lá me ficou a ambição pelo meio do caminho, e alguns artigos sobre literatura, cinema, cultura acabaram estacionados no meu primeiro livro, Contra o Consenso. Outros tantos se perderam por aí. Esta página é hoje aquilo em que se transformou: um blog de política apenas. De vez em quando, percebe o leitor que não me contento e fujo da sina. Mas volto sempre — sei lá por quê. A Boca da Verdade, o mais recente livro de contos de Mario Sabino, é um desses bons motivos para revirar o avesso do avesso. Se a política parece lidar com o irremediável que está além de nós, este livro lida impiedosamente com o irremediável de cada um.

Sabino, como sabem, é redator chefe da revista VEJA, em cuja página eletrônica este blog está hospedado. Concordamos em muita coisa, temos outras tantas discordâncias, e é bem possível que, ao fim deste texto, ele pense lá consigo ou me telefone: “Sabe aquele finzinho do seu artigo, Reinaldo Azevedo? Pode esquecer!”. A Boca da Verdade percorre os muitos caminhos do “belo horrível” de que trata a arte e é um exemplo de elaboração culta da língua portuguesa. O autor evidencia que é possível ter uma escrita “contemporânea”, que reflita na linguagem a melodia de um tempo, sem se entregar, no entanto, a malabarismos sintáticos. Não é preciso voltar na leitura à cata de algum ponto, alguma vírgula, alguma dica que nos diga, enfim, quem fala ou do que se fala. As vozes de seu texto são sempre muito claras, ainda que possam dizer coisas um tanto assustadoras.

Em 11 contos divididos em três escrituras distintas – “Inexistências”, “Recortes” e “Representações” -, Sabino radicaliza abordagens e experiências dos dois livros anteriores, o romance O dia em que matei meu pai, de 2004, traduzido em sete idiomas, e O antinarciso (2005), de contos. E avança. Do primeiro, temos a figura onipresente do pai, aquele que nos torna a todos irmãos em Édipo. De O Antinarciso, persiste a competente elaboração metalingüística, que faz o texto olhar também para si mesmo, mas sem mostrar, como diria Olavo Bilac, os “andaimes do edifício”. Uma das maiores qualidades da literatura de Sabino é operar com referências, vá lá, da alta cultura (sei, não se deve escrever assim em tempos de guerra, não é?) sem que isso se torne um jogo aborrecido ou pernóstico, risco que sempre existe. Quem identifica a citação ganha uma chave nova. Sem ela, também é possível avançar. E sempre cabe indagar quantas pistas vão nos escapando na trajetória. Assim, os textos certamente vão sendo reescritos à medida que o leitor ganha novas referências.

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Não há confortos em A Boca da Verdade. No 12º elemento do livro, “Uma Palavra”, Sabino fala com sua própria voz, numa espécie de posfácio:
“O mundo pode ser divertido e proporcionar momentos de alegria genuína, mas o que faz a boa literatura é a infelicidade. Ela, a infelicidade, é a roda do mundo do escritor. Os melhores romances e contos são aqueles em que os protagonistas são movidos por angústia, tormento, sofrimento. A dor de existir, enfim”.
Fiquei aqui tentando discordar. Se conseguir, aviso.

Dois contos reproduzem pontos de vista espelhados de uma mesma relação: A Boca da Verdade, que dá título ao livro, e Essência, ambos em “Inexistências”. No primeiro, um filho experimenta todos os relevos da repulsa ao pai, ao seu próprio e àquele que matamos para escrever a nossa própria e nem sempre edificante história. No outro, inverte-se o ponto de vista: um pai deixa um testamento aos filhos, que considera meio idiotas, embora os ame, com o inteiro legado de sua miséria moral – que ele chama “existencial”. Somos confrontados com isto:
“(…)Nas visitas a escolas e orfanatos mantidas por mim, por trás do sorriso protocolar, nauseavam-me aqueles pequenos bichos a que ajudava a prover por força da obrigação social (…). Sempre interpretei a bondade como um desvio, uma patologia recessiva da espécie – e incurável, visto que, evidentemente, não houve nem haverá ninguém disposto a remediá-la: a colméia humana gosta de fantasias a respeito de si própria, o que torna tais doentes da bondade muito úteis, afinal.”
*
Leiam a continuação da resenha em Avesso do Avesso

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