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Blog do jornalista Reinaldo Azevedo: política, governo, PT, imprensa e cultura
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Haddad demoniza os carros e seus proprietários. É mesmo? Vamos ver como o PT trata o setor automotivo e por quê. E ainda: Vai, prefeito, grita: “Audi, Mercedes, BMW e Land Rover, fora daqui!”. Ou ainda: Conversa inútil para embalar tolos

Eu mal saio de casa — há bem poucas coisas que me interessam fora daqui. Minhas filhas e minha mulher andam de metrô e ônibus sempre que podem etc. e tal. Uma família exemplar mesmo, com baixa produção de carbono. Não sei quanto os meus cigarros exigiriam de compensações, mas já plantei árvores. Sou ecologicamente […]

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 31 jul 2020, 05h13 - Publicado em 9 out 2013, 19h59

Eu mal saio de casa — há bem poucas coisas que me interessam fora daqui. Minhas filhas e minha mulher andam de metrô e ônibus sempre que podem etc. e tal. Uma família exemplar mesmo, com baixa produção de carbono. Não sei quanto os meus cigarros exigiriam de compensações, mas já plantei árvores. Sou ecologicamente correto. Tenho a maior tentação de entrar também na demonização dos carros, que é a nova onda política e ecologicamente correta no Brasil. Deve ser gostoso dizer tolices — ou não haveria tantos dedicados a missão tão nobre. A Folha promove um ciclo de debates sobre mobilidade urbana. É claro que é um tema urgente e relevante. O prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), falou no evento. Usou a palavra mágica: “privatização”. Segundo ele, ao se privilegiarem os carros, o que se faz, na prática, é privatizar a superfície da cidade. Vale como poesia do irrealismo socialista. Aproveitou, claro!, para criticar a ampliação da Marginal Tietê. Se a situação já é caótica com ela, dá para imaginar como seria sem ela. Mas quem liga para a realidade?

Vamos ver. Qual é a relação do governo petista com o setor automotivo? Tanto Lula como Dilma recorreram à desoneração de impostos para estimular a produção e a venda de veículos. E não era para exportação, não! Era para o mercado interno mesmo. Que cidade absorveu boa parte desse estímulo? Resposta óbvia: São Paulo. E notem: não estou criticando Lula e Dilma, não. Nicolas Sarkozy e Barack Obama fizeram o mesmo, respectivamente, na França e nos EUA. Por que Haddad não faz a conta dos bilhões de renúncia fiscal decorrentes do incentivo concedido à indústria automobilística e não faz uma daquelas contas que encantam os trouxas? “Esse dinheiro poderia ser investido em transporte público…” Não faz porque não é burro, embora seja politicamente oportunista. É bem verdade que, sem incentivo, a economia teria crescido menos, o desempego seria maior, teria havido queda de arrecadação, o consumo (âncora principal do crescimento) teria sido menor. Mas quem liga? Trouxas querem soluções, não fazer contas.

Reitero: não acho que Lula e Dilma fizeram mal em tentar preservar empregos. A indústria automobilística mobiliza uma cadeia produtiva gigantesca, que acaba envolvendo outros setores, como construção civil (obras viárias e de infraestrutura) e energia (combustíveis). Por que Haddad, este gênio do pensamento estratégico, não pediu que seus aliados no governo federal estimulassem o crescimento incentivando o uso de bicicletas, patins e carrinhos de rolimã?

Leiam:
“Quando nós disponibilizamos dinheiro para as financiadoras das empresas automobilísticas venderem carro, o que aconteceu? Aumentou a entrada do carro de 20% para 30%, diminui o número de prestações, de 70, 72, para 36. Ou seja, ao invés de se facilitar, se dificultou a compra do carro”.

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É Luiz Inácio Lula da Silva em 4 de dezembro de 2008, dando um pito nos bancos, que, segundo disse, estavam dificultando a compra dos carros. Em 2012, no ano passado!, a Caixa Econômica Federal, um banco púbico, anunciou a redução de juros para a compra de automóveis. Por que não criou uma linha especial para vender patinetes?

Trata-se de um discurso hipócrita, politicamente vigarista, talhado para convence a subilustração politicamente correta, os iluminados habituais que costumam ter respostas simples e erradas para problemas difíceis.

Pedágio urbano
No seminário promovido pela Folha, leio que Paulo Feldmann, professor de Economia Brasileira da FEA-USP e membro do Conselho da Cidade, fez uma defesa entusiasmada da adoção do pedágio urbano. Nem entro no mérito. Preciso pensar com cuidado a respeito. Talvez eu possa até ser favorável. Vigora em Londres, como ele lembrou, com sucesso.

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São Paulo não é virgem nesse debate. Em fevereiro de 2009, o governo de São Paulo, do PSDB, enviou à Assembleia Legislativa o projeto que instituía a Política Estadual de Mudanças Climáticas. O texto se propunha a estudar a alternativa. Quem saiu atirando contra a proposta? Ora, ora… Os petistas! Em 2008, Gilberto Kassab, ainda no DEM e candidato à reeleição à Prefeitura, enviara projeto à Câmara instituindo o pedágio urbano. O PT, partido de Fernando Haddad, fez tal salseiro que ele retirou o texto. Agora, os “pensadores” de  Haddad voltam a falar a respeito. Na eleição de 2010 (e também na 2012), os petistas atribuíam a Serra a intenção secreta de implementar a medida. E tratavam do assunto como se fosse um crime. O tema foi usado para demonizar o tucano nas redes sociais.

“Fora, Audi, Mercedes, BMW e Land Rover”!
Haddad, este pensador sem passado e, agora, sem Arco do Futuro, deveria ter aproveitado o seminário para convencer o governo Dilma a criar dificuldades para a instalação de novas montadoras no Brasil. A Audi está investindo R$ 500 milhões na sua planta industrial em São José dos Pinhais, no Paraná. Fernando Pimentel, ministro da Indústria e Comércio, atribui a chegada de novas montadoras ao Programa de Incentivo à Inovação Tecnológica e Adensamento da Cadeia Produtiva de Veículos Automotores, o Inovar-Auto. Quer saber o que é, leitor amigo? Clique aqui. É uma página oficial, do governo. Você verá quantos são os incentivos para que aumente a produção de carros no Brasil. A Mercedes já anunciou que estará de volta em breve. Orgulhoso, Pimentel comemora: “O Brasil nunca teve fábricas do segmento de automóveis de primeira linha. E temos três anunciadas: a BMW, a Audi e a Mercedes-Benz. E a Land Rover em vias de [anunciar]”.

Por que Fernando Haddad, este monumento à coragem e à originalidade, não gritou lá no seminário da Folha: “Fora, Audi, Mercedes, BMW e Land Rover!”?

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PS – Para quem, eventualmente, não tenha entendido o meu ponto: se eu estivesse no governo, teria concedido os mesmos incentivos ao setor automotivo. E acho correto que se estimule a vinda ao país de novas montadoras. A minha diferença com o petismo, nesse particular (há milhares de outras), é que não sou hipócrita nem tento enganar idiotas, o que não nos cobra nem mesmo sagacidade. Há modos de incentivar o transporte público sem demonizar o automóvel e seus proprietários. Ocorre que o petismo, mesmo quando faz a coisa certa — incentivar o setor automotivo —, só sabe falar a linguagem vigarista do confronto entre pobres e ricos e do arranca-rabo de classes. Isso não é irrelevante, como provam os acontecimentos recentes. Nessa toada, chegará o dia em que extremistas, em nome dos usuários do transporte público, vão se sentir no direito de impedir a circulação de carros, ocupando as vias públicas. A depender do juiz que encontrem pela frente, serão chamados de defensores da democracia e da cidadania.

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