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Blog do jornalista Reinaldo Azevedo: política, governo, PT, imprensa e cultura
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EUA vão às urnas amanhã: os números da disputa, o triunfo da política e o humano direito à oposição. Ou: Uma lição ao Brasil. Ou ainda: A polarização é o melhor corretivo moral da vida pública

Qualquer coisa pode acontecer amanhã nas eleições americanas: a vitória do democrata Barack Obama, que se reelegeria presidente, ou a do republicano Mitt Romney. Há até quem tema o cenário de 2000, quando George W. Bush conquistou seu primeiro mandato. Perdeu para Al Gore nas urnas (50.460.110 a 51.003.926), mas levou um maior número de […]

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 31 jul 2020, 07h29 - Publicado em 5 nov 2012, 06h55

Qualquer coisa pode acontecer amanhã nas eleições americanas: a vitória do democrata Barack Obama, que se reelegeria presidente, ou a do republicano Mitt Romney. Há até quem tema o cenário de 2000, quando George W. Bush conquistou seu primeiro mandato. Perdeu para Al Gore nas urnas (50.460.110 a 51.003.926), mas levou um maior número de delegados — 271 a 267. A Flórida decidiu o jogo em favor do republicano depois de a questão ter ido parar a Justiça. Temem alguns que os EUA estejam sob risco de ver, pela quinta vez na sua história, o vencedor nos votos absolutos não ter necessariamente a maioria no colégio eleitoral. Falarei um pouco dos números para situar a questão, mas meu ponto, neste post, como vocês verão, é outro. Saudarei uma vez mais a democracia americana e o triunfo da política. Já chego lá. Antes, alguns números.

Segundo dados do site Real Clear Politics, que faz uma média com os dados de várias pesquisas nacionais, a disputa, em votos absolutos, estava empatada ontem, com meio ponto de vantagem numérica para Obama: 47,9% a 47,4%. O site fez uma comparação com a evolução dos números da eleição de 2008, conforme se vê na imagem abaixo.

Fica claro que Obama vem enfrentando bem mais dificuldades no confronto com Romney do que no embate com John McCain há quatro anos. O Real Clear Politics faz uma tabela dia a dia de cada eleição: em 2008, como se poderá ver lá, o candidato republicano deixou de ameaçar a posição de Obama já na última semana de abril. E não passou mais à frente. Mitt Romney quase sempre esteve mais perto do adversário do que McCain. Desde 9 de outubro, o republicano já apareceu 17 vezes na liderança; Obama, 7. A diferença, em qualquer caso, é quase sempre inferior a meio ponto — 0,1, 0,2, 0,3…

Segundo o levantamento do site, com base nas sondagens feitas nos Estados, Obama tem hoje uma certeza razoável sobre 154 votos (azul escuro), e Romney, sobre 127 (vermelho escuro). Vejam mapa.

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Há os que se inclinam para o republicano (53 votos – vermelho intermediário) e para os democratas (29 – azul intermediário). Os que esboçam tendências estão assim: 18 para o democrata (azul claro) e 11 para o republicano (vermelho claro). Na soma geral, o atual presidente contaria 201 delegados, contra 191 de seu adversário. Ocorre que nada menos de 146 delegados estão distribuídos em Estados em que as pesquisas ora dizem uma coisa, ora outra, sempre com margem apertada (estados de cor cinza). Neste link, vocês podem ter acesso aos levantamentos feitos em cada um.

Destaque-se que a Flórida, que decidiu a vitória de Bush em 200o, agora com 29 delegados, está entre os indefinidos. Se vocês abrirem os dados da pesquisa no Estado, verão que, em 10 pesquisas recentes, Romney vence em seis, Obama, em três, e há um empate. A Carolina do Norte, também incerta, tem 15 delegados. Ali, Romney vence três de cinco pesquisas, e há dois empates. Em Ohaio, no entanto, 11 de 12 apontam uma ligeira vantagem do democrata — são 18 delegados. Na Pensilvânia (20 delegados), seis de sete também dão Obama na dianteira.

Agora ao ponto
Se você for como Arnaldo Jabor, mais democrata do que Barack Obama, pode ser levado a concluir que a humanidade enfrenta hoje algumas ameaças sérias: os radicais do Irã, o Taliban, no Paquistão e Afeganistão, e os… republicanos nos EUA. Seriam fundamentalismos distintos, mas, de algum modo (que nunca fica claro fora do universo das metáforas e das alegorias), combinados. A política brasileira tem perturbado a mente de alguns comentarias, que passam a ver, também nos EUA, a disputa entre o “bem” e o “mal”, o “velho” e o “novo”; o “progressista” e o “reacionário”, os que teriam uma espécie de direito divino de governar (os “bonzinhos”) e os que deveriam apenas servir de oposição consentida nesse simulacro de regime democrático.

Não pensem que a imprensa liberal (isso lá quer dizer “progressista”) americana é muito diferente da nossa (ou melhor: a nossa é que não é muito diferente da deles). Também nos EUA — especialmente no New York Times e na CNN —, pessoas naturalmente boas, como os democratas (!), têm o monopólio das boas intenções, e pessoas naturalmente perversas, como os republicanos, não cansam de, sorrateiramente, planejar o mal da humanidade, dos pobres, da natureza, dos bichinhos etc. Os americanos, no entanto, têm a sorte de contar com pluralidade de fato.

Obama, o mundo e os EUA
Obama, tratei disso em 2008, teria sido eleito presidente dos EUA pelos povos de quase todos os outros países (caso votassem) com uma vantagem muito superior à que obteve nos EUA. Do mesmo modo, seria reeleito agora. Mas a disputa se trava é naquele país que chamam por lá “América”, onde fazer oposição é considerado parte essencial do jogo. É bem verdade que o atual presidente, algo tocado pelo espírito do “fascismo de esquerda” (refiro-me, antes que as antas comecem a focinhar, à questão tratada no livro “Fascismo de Esquerda”, de Jonah Goldberg, que analisa a política americana), tentou satanizar os adversários e demonizar a política, tratando-os como sabotadores às vezes. Não colou. Amplas camadas da população dos EUA repudiam esse comportamento.

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Polarização
Quando os republicanos o fizeram dançar miudinho para aprovar o Orçamento, ele ensaiou um muxoxo, falando em sabotagem. Jabor, aqui no Brasil, sugeriu ao ocupante da Casa Branca que atropelasse o Congresso. Obama preferiu ouvir a voz do bom senso e… negociou. 
Nos EUA, por enquanto ao menos — e acho que será assim por muito tempo… —, republicanos são eleitos para ser… republicanos!!! Democratas, para ser democratas!!! Sim, os dois partidos têm seus extremos, seu centro e as suas respectivas alas à esquerda e à direita, que se tocam sem mudar de lado. Por isso a política por lá repudia mensalões e mensaleiros. Os que olham para o cenário pluripartidário brasileiro e enxergam nisso uma virtude estão com a visão distorcida. É justamente a polarização (sem prejuízo de ampla liberdade para formar partidos; até candidato independente é possível por lá, o que é vetado por nossa legislação) que faz a depuração ética e moral da política americana. Não há espaço para as, digamos, virtudes do PMDB e assemelhados. Obama estava mais à esquerda no Partido Democrata, e se pode dizer que hoje migrou para o centro (do seu partido). Romney é um centrista republicano e teve de convencer a direita do seu partido de que poderia liderar o bloco. Não há, nesse setor, grande entusiasmo com ele, mas o embate até aqui tem mostrado que foi uma escolha certa.

Aqui e ali se aponta, e não me parece que seja despropositado, que não há assim tantas diferenças entre Romney e Obama, com o que tendo a concordar. A possibilidade da vitória, de resto, sempre torna mais conservadores os progressistas e mais progressistas os conservadores. Diante do vislumbre de que se vai governar todo um país, cumpre tentar atrair a parcela recalcitrante com um discurso mais inclusivo. É parte do jogo.

O que louvo, no caso, nos republicanos é o destemor da política. Quando parecia impossível, diante da tal obamania, fazer oposição ao presidente, eles fizeram. Quando parecia impossível combater o plano de assistência à saúde de Obama — o que foi aprovado ficou longe do original —, eles se opuseram. “Tudo para sabotar o negro reformista”, poderiam dizer alguns no Brasil. Errado! Assim agiram porque a) discordavam; b) porque aqueles que os elegeram discordavam; c) porque, na democracia, é legítimo discordar — aliás, é só no regime democrático que isso é possível.

Apesar do empate, é evidente que os republicanos enfrentam algumas desvantagens. Ainda que inexista, nos EUA, o pornográfico uso da máquina que se vê no Brasil, é certo que o presidente de turno tem algumas facilidades — entre outras coisas,  atrai o noticiário. Obama é ainda o presidente mais incensado pela imprensa em muitos anos. Ainda que seja hoje o homem mais poderoso da Terra — condição que lhe confere o cargo —, sua história e sua origem fazem com que conserve o charme da resistência, do homem que supostamente luta contra o establishment. Suas eventuais gafes são sempre corrigidas para baixo; as do seu adversário, para cima…

Entendo que o Partido Republicano chegar ao dia da eleição empatado com Obama já é, por si, um elogio à política e ao direito à divergência. Embora não seja a hipótese mais provável, torço para que Romney vença. Qualquer resultado honra a democracia americana, mas a vitória do republicano lhe daria ainda mais lustro.

Texto publicado originalmente às 4h30
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