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Blog do jornalista Reinaldo Azevedo: política, governo, PT, imprensa e cultura
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COMO GLORIFICAR UM HOMICIDA. OU: “ALÔ, LEITORES DO PARANÁ! VAMOS DEBATER O LEGADO DO HERÓI MARIGHELLA?

Recebo da Universidade Federal do Paraná um release que é do balacobaco. Sabe-se lá por que estou na lista, mas estou. É que meu endereço não denuncia a pessoa. Título do texto: “Grupo encena peça de rua sobre Marighella nesta sexta”. Sim, no próximo dia 12. Reproduzo o texto em vermelho, entremeado de comentários em […]

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 31 jul 2020, 15h45 - Publicado em 10 mar 2010, 13h45

Recebo da Universidade Federal do Paraná um release que é do balacobaco. Sabe-se lá por que estou na lista, mas estou. É que meu endereço não denuncia a pessoa. Título do texto: “Grupo encena peça de rua sobre Marighella nesta sexta”. Sim, no próximo dia 12. Reproduzo o texto em vermelho, entremeado de comentários em azul. Não deixa de ser uma coisa emblemática. Afinal, temos um presidente que considera os presos políticos de Cuba “bandidos”.

O grupo “Tribo de Atuadores Ói Nóis Aqui Traveiz”, de Porto Alegre (RS), apresenta nesta sexta-feira (12/3) em Curitiba o espetáculo de rua “O Amargo Santo da Purificação – Uma Visão Alegórica e Barroca da Vida, Paixão e Morte do Revolucionário Carlos Marighella”. O início da peça está marcado para as 16 horas, na Praça Rui Barbosa. Em caso de chuva forte, o espetáculo será transferido para o sábado, no mesmo horário e local.
O título já merece umas boas chicotadas intelectuais porque pretende, assim, fazer uma espécie de mistura de Glauber Rocha com a tontice universotária. Glauber, no mais das vezes, era insuportável, mas reconheço: não dava bola para essas cretinices pseudo-acadêmicas. Qualquer pessoa que escreva “alegórica e barroca” dá demonstração cabal de ignorância. Não porque o alegórico compreenda necessariamente o barroco, mas porque o barroco não existe sem o alegórico. E é sem dúvida bonita a idéia de transformar Marighella, QUE ESCREVEU UM MANUAL SOBRE AS VIRTUDES NO TERRORISMO, NUMA ESPÉCIE DE CRISTO DO NOVO HOMEM.

Com patrocínio da Petrobras, através da Lei de Incentivo à Cultura do Ministério da Cultura, o projeto percorrerá ao todo doze cidades brasileiras.
É mesmo? A Petrobrás está patrocinando a hagiografia de Marighella? Há coisa de um ano, noticiou-se que a área de apoio à cultura da empresa estava com pouco dinheiro. Aplaudi aqui as almas que estavam sendo salvas.

Na seqüência de cenas da peça, o público assiste a diversas passagens da trajetória de Marighella: origens na Bahia, juventude, poesia, ditadura do Estado Novo, resistência, prisão, democracia, constituinte, clandestinidade, ditadura militar, luta armada, morte em emboscada. “É uma história de coragem e ousadia, perseverança e firmeza em todas as convicções”, diz a sinopse. “Marighella não abdicou ao direito de sonhar com um mundo livre de todas as opressões. Viveu, lutou e morreu por esse sonho.”
Nem me digam! Quando recomendava que se assassinassem soldados e policiais só porque soldados e policiais, o que ele queria? Ora, o bem da humanidade. Quanto escreveu que hospitais eram potenciais alvos de ataques terroristas, estava se mostrando um exemplo de coerência. Quando fez a defesa do terrorismo em seu manual do guerrilheiro urbano, estava sendo apenas um humanista.

A peça parte de poemas escritos por Marighella que, transformados em canções, são o fio condutor da narrativa. Com o uso de máscaras e de elementos da cultura afro-brasileira, a encenação cria uma fusão do ritual com o teatro dança. Professor de estudos teatrais da UFPR e integrante do grupo de pesquisa Literatura e outras Artes, Walter Lima Torres ajuda a coordenar a agenda do grupo em Curitiba.
“Trata-se de um grupo bastante consolidado, um dos mais importantes da região Sul”, afirma Torres, que inclusive já assistiu à peça meses atrás em São Paulo. “Como espectador, posso dizer que eles tratam de um assunto contundente, mas de uma forma bastante alegórica, leve, com uma narrativa colorida que sensibiliza e atrai públicos de diferentes faixas etárias.”
Se o assunto é poesia, pode-se dizer que Marighella era um poeta com uma metranca na mão. Fazendo versos era um terrorista. Cometia merdas literárias como esta:

RONDÓ DA LIBERDADE
É preciso não ter medo,
é preciso ter a coragem de dizer.

Há os que têm vocação para escravo,
mas há os escravos que se revoltam contra a escravidão.

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Não ficar de joelhos,
que não é racional renunciar a ser livre.
Mesmo os escravos por vocação
devem ser obrigados a ser livres,
quando as algemas forem quebradas.

É preciso não ter medo,
é preciso ter a coragem de dizer.

O homem deve ser livre…
O amor é que não se detém ante nenhum obstáculo,
e pode mesmo existir quando não se é livre.
E no entanto ele é em si mesmo
a expressão mais elevada do que houver de mais livre
em todas as gamas do humano sentimento.

É preciso não ter medo,
é preciso ter a coragem de dizer.

Nada é tão ruim quanto a poesia ruim. Um poeta que escreve “gamas do humano sentimento” merece o paredão! O melhor do poema, no que concerne à moral esquerdopata, é isto: “Mesmo os escravos por vocação/ devem ser obrigados a ser livres”. Ora, aí está sintetizada a moral comuna. O sujeito pode não saber que é explorado, mas o partido sabe. E vai tentar libertá-lo mesmo que ele não queira. E, se ele resistir, dada a sua inconsciência, Lênin ofereceu a resposta: “Passa fogo no reaça”. E pronto!

E o tal professor? Como “espectador”, ele achou que o “assunto” foi tratado de “maneira bastante alegórica, leve, com uma narrativa colorida”. Estou convencido de que essa gente não sabe, definitivamente, o que é alegoria. Bem, a coisa não acabou. Agora falta a fase de “conscientização do oprimido”.

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Debate e palestra
O grupo também participa de outras três atividades em Curitiba. Na manhã de quinta-feira (11), os integrantes realizam a palestra “Ói Nóis Aqui Traveiz – 30 anos: O Teatro de Rua no Brasil”. O evento acontece às 10 horas, na Companhia Senhas de Teatro, localizada na rua São Francisco, 35. No mesmo dia, às 18 horas, integrantes do grupo participam de uma mesa-redonda sobre Carlos Marighella, política e repressão, no Teatro da Caixa, localizado na rua Conselheiro Laurindo, 280. Também estarão presentes no debate Judite Trindade, professora do Departamento de História da UFPR e ex-presa política; Silvia Calciolari, mestre pela UFPR em Sociologia das Organizações e diretora do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Paraná; e Narciso Pires, integrante do Tortura Nunca Mais e ex-preso político. A mediação cabe a Walter Lima Torres.
Ulalá!!! Isso não é debate, mas uma orgia ideológica. A única chance de haver algum desentendimento aí é haver uma competição para saber quem elogia mais o terrorista e apologista do terrorismo no Brasil. A Ação Libertadora Nacional, que ele comandava, estava entre os grupos mais violentos do Brasil. Um de seus integrantes era Paulo Vannuchi, o tal que deu à luz o que chamo “Programa Nacional-Socialista dos Direitos Humanos”.

Ai, ai… Outro dia estava em Brasília com as minhas filhas, e eis que surge um grupo de “atores de rua” — uns saltimbancos com cara de que tinham acabado de comer sucrilho comprado com o dinheiro do pai, funcionário de algum ministério ou autarquia — cantando, pulando, batendo lata, aquele ar de quem viu “a coisa”, todos prontos a nos “conscientizar”. E a minha filha: “Ai, que coisa mais triste!!!”. Caímos na gargalhada.

Pois é… O grupo “Ói Nóis Aqui Traveiz”, fazendo justiça ao nome, já tem 32 anos!!! Eles já têm mais tempo de atentados à estética do que Marighella tinha de atentado a vida humanas. Não mudaram o teatro, não fizeram a revolução, e a maior projeção conquistada é esta esculhambada que levam aqui.

“Que coisa triste!”

O teatro continua aquela coisa… Mas agora a Petrobras paga a conta.

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