Acusam preconceito contra Lula porque não têm coragem de assumir o preconceito contra o que eles mesmos chamam “povo”
Eu sou como aquele moleque chato de O Pequeno Príncipe. Jamais desisto de uma pergunta — especialmente quando a resposta, tão presumida quanto imaterial, paira no ar, sem que alguém consiga expressá-la em palavras, no papel, na tela, na areia, não importa. É claro que Lula merece respeito, como mereceram outros tantos que vieram antes […]
Eu sou como aquele moleque chato de O Pequeno Príncipe. Jamais desisto de uma pergunta — especialmente quando a resposta, tão presumida quanto imaterial, paira no ar, sem que alguém consiga expressá-la em palavras, no papel, na tela, na areia, não importa.
É claro que Lula merece respeito, como mereceram outros tantos que vieram antes dele. Sim, penso, por exemplo, em Mário Covas, agredido por petistas-cutistas-apeoespistas em praça pública. E é uma estupidez supor que adversários do ex-presidente deveriam fazer o mesmo com ele. Mas aí alguém poderá dizer o que disse um petralha, num comentário asqueroso, que vetei:
“Lula pode sair à rua que ninguém vai querer bater nele; se queriam bater em Covas, vai ver existiam motivos”.
Entenderam o que pensa esse lixo humano? Devemos ficar longe desse tipo de gente. Não presta nem como adversário. Como se nota, ele acredita em execuções justas, desde que o tribunal seja composto por seus amigos.
Desde o primeiro dia eu afirmei aqui ser contrário a esse negócio de que Lula deve se tratar no SUS. Mas eu coloco no papel virtual — que não some nunca — por que acho que não:
a) ele não está obrigado a arcar sozinho com as disfunções da saúde pública. Como governante, foi um dos responsáveis por ela, mas não o único;
b) os indivíduos se tratam onde querem e podem. Lula já é um milionário e pode pagar pelo tratamento no Sírio-Libanês. Se lhe vai ser ou não cobrado, não sei.
Posso acrescentar a essas duas razões uma outra. Digamos que ele tivesse sido um militante incansável em favor da qualidade na saúde. Não acho que tenha sido, não, mas digamos que sim. O militante de uma causa não está, a meu juízo, moralmente obrigado a experimentar o mal com o qual, em tese ao menos, quer acabar. Sempre destacando que, quando o assunto diz respeito ao público, certos cuidados são necessários. Eu censurei aqui algumas celebridades que apareciam na televisão defendendo a proibição da venda de armas legais (o problema sempre foram as armas ilegais), mas que andavam cercadas de seguranças. Aí fica fácil…
Volto ao ponto. As minhas razões estão explicitadas. Agora eu gostaria que esses que estão escandalizados com o que chamam “ataques a Lula” — como faz, por exemplo, reportagem da Folha de hoje, com sotaque editorial — explicassem por que é uma baixaria inominável a sugestão de que se trate no SUS. Por que não tentam? O próprio ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, instado a falar a respeito pelas onipresentes franjas do petismo, saiu-se com uma batatada: seria coisa de “recalcados”. Por quê?
Eu dou aqui os vários porquês que essas pessoas todas se negam a dar, investindo, elas sim, no preconceito. É QUE A SUGESTÃO DE QUE LULA SE TRATE NO SUS TRAZ CONSIGO O DADO ÓBVIO: O ATENDIMENTO, EM REGRA, É PÉSSIMO E NÃO FOI FEITO PARA ALGUÉM COMO LULA. Serve é para uma parte do seu eleitorado. Mais: sugerir que recorra ao SUS traz a suspeita de que o tratamento será longo, demorado e, portanto, ineficaz. Os “escandalizados” temem dizer o que, no fundo, pensam: “Pô, tratar-se no SUS é o mesmo que nada…” Eu nem acho que seja assim. Em muitos casos, o sistema funciona. Mas não é, infelizmente, a regra.
Lula se trate, reitero, onde quiser. Mas é asqueroso esse negócio de, em nome de uma moral supostamente superior, tratá-lo como divindade, de quem não se pudesse lembrar nem mesmo as próprias palavras do passado — afinal, um deus absoluto não estaria obrigado nem mesmo a ser coerente.
Esses que saem por aí gritando “Preconceito! Preconceito!” deveriam explicar seus motivos. Não o farão porque se obrigariam a dizer o que realmente pensam do povaréu que se trata no SUS. E eles, afinal, são os “amigos do povo”, não é mesmo?
LULA TEM O DIREITO DE SE TRATAR ONDE QUISER, E AS PESSOAS TÊM O DIREITO DE USAR SUAS PRÓPRIAS PALAVRAS PARA CONFRONTÁ-LO. Isso não é “ataque”, não é “desrespeito”, não é “agressão”. É só democracia.