Vergonheira de brasileiros na Rússia enterra de vez o mito da cordialidade
Eis a nossa imagem lá fora: nem bons selvagens, nem bons malandros, apenas bons babacas!
O Brasil sempre teve um problema sério de autoimagem. Por um tempo nos imaginamos como bons selvagens plenamente integrados à natureza e à alegria de viver, mas essa foi uma invenção que a monarquia engendrou com a ajuda de escritores como José de Alencar e compositores como Carlos Gomes. Um mito fraquinho, na realidade, fabricado artificialmente, que não pôde se manter em pé por muito tempo. Enquanto celebrávamos esse selvagismo infantil, centenas de tribos indígenas eram dizimadas em nome do progresso material da nação etc.
Depois veio a lorota que apresentava o Brasil como um paraíso racial, conto ainda comprado por muitos estrangeiros que se apaixonam por nossas praias e nossa trajetória incruenta (um longo blábláblá para esconder que o real interesse dos gringos são as mulatas). Essa invenção cabe à consolidação de uma República autoritária e inoperante que teve seu auge na Era Vargas — e contou com o suporte intelectual de sociólogos como Gilberto Freyre e romancistas como Jorge Amado.
Uma simples olhada nos números é capaz de revelar o inferno de discriminação e preconceito que se esconde sob a capa do tal paraíso racial. Melhor, vamos dispensar os números. Basta aproveitar a Copa do Mundo para observar as arquibancadas durante os jogos do Brasil. Não parece estranho que uma seleção composta basicamente por negros possua apenas torcedores brancos? É impressionante como o apartheid em que vivemos pode saltar aos olhos num estádio de futebol.
E isso nos leva à pergunta inevitável: quem somos atualmente?
Tivemos a capacidade de misturar o bom selvagem do Império com o bom malandro da República e dali tirar o Homem Cordial de que tanto falam os livros? Somos esses especialistas na arte da alegria e do bem viver? Contagiamos o mundo com a nossa irreverência, com o nosso carisma, com a nossa criatividade? Quanta ilusão! Os vídeos — são vários! — em que torcedores brasileiros aparecem desrespeitando mulheres na Rússia revelam a verdadeira face do Brasil.
Confundir diversão com humilhação alheia através do riso cruel só pode ser produto de um país atrasado, desigual, cafona e sectário. Eis a nossa imagem lá fora. Nem bons selvagens, nem bons malandros, apenas bons babacas. Um mito que ninguém precisou inventar.