Editorial de O Estado de S. Paulo (19/3/2019)
O alerta para que o presidente Jair Bolsonaro desça do palanque e comece a governar ganhou mais um reforço. Pesquisa encomendada pela XP Investimentos – que, ao que se saiba, não é uma perigosa organização comunista – indica uma piora da percepção da população em relação ao governo. O grupo que considera o governo bom ou ótimo oscilou, em um mês, de 40% para 37%. Já os que consideram a administração ruim ou péssima saltaram de 17% para 24%. Feita entre 11 e 13 de março, a sondagem tem margem de erro de 3,2%.
Houve também queda da expectativa em relação aos próximos quatro anos de governo. Os entrevistados que esperam uma gestão positiva passaram de 60% para 54%. Vale lembrar que, há dois meses, o porcentual era de 63%. Já aqueles que têm expectativa de uma administração ruim ou péssima são agora 20%. No mês anterior, eram 15%. É uma mudança significativa para um governo que ainda não tem três meses.
Vale destacar que, mesmo com essa situação de aumento do desgaste do governo, o porcentual dos que julgam necessária a reforma da Previdência manteve-se no mesmo patamar do mês anterior. Para 64% dos entrevistados é necessário atualizar as regras para a concessão de aposentadorias. Em relação a pontos específicos, 55% concordam total ou parcialmente com a reforma para servidores públicos em geral, 53% concordam total ou parcialmente com mudanças nas regras para policiais, bombeiros e professores e 56% concordam total ou parcialmente quanto a mudanças nas regras para os militares.
São números significativos para um tema considerado impopular. Além disso, a continuidade do apoio à reforma da Previdência, em contraste com a queda de aprovação do governo Bolsonaro, indica que a população compreende a real natureza da reforma. Não é vista como uma pauta do governo, a depender da popularidade do presidente, e sim como uma necessidade do País.
A enquete da XP Investimentos com deputados e senadores indica que a percepção sobre a necessidade da reforma da Previdência continua alta no Congresso. Para 77% dos deputados, a reforma é necessária. No Senado, o porcentual é de 64%. No entanto, apenas 27% dos deputados afirmam apoiar a idade mínima de 62 anos para mulheres e 65 anos para homens, conforme consta da proposta que o governo apresentou ao Congresso. Como se vê, há um longo trabalho de coordenação política a ser feito pelo Palácio do Planalto para viabilizar uma reforma da Previdência minimamente consistente.
Os três veículos de maior credibilidade são rádio, televisão e jornal impresso, afirmaram os entrevistados. Trata-se também de outro recado importante ao presidente Jair Bolsonaro, que, dias antes da pesquisa, compartilhou em sua conta no Twitter informação equivocada sobre repórter do Estado.
Diante de tantas fake news e informações distorcidas, a população manifesta desconfiança em relação ao que circula nas redes sociais. Por exemplo, 72% consideram que a maioria das informações compartilhadas no WhatsApp é falsa. Tal porcentual é de 70% em relação ao Facebook, de 55% em relação ao Instagram e de 52% no caso do Twitter. São números que apontam para uma maior maturidade e uma maior capacidade crítica em relação ao que se recebe nas redes sociais.
Questionados sobre a postagem feita pelo presidente Jair Bolsonaro de vídeo obsceno durante o carnaval, 72% disseram ter tomado conhecimento do assunto, o que indica a responsabilidade da qual o presidente abdica ao usar sem maiores cuidados sua conta na rede social. Ao mesmo tempo, a maioria dos entrevistados (59%) considerou inadequada a tal publicação. Ou seja, boa parte da necessária credibilidade do presidente para levar adiante as reformas de que o País precisa pode ser dizimada pelo uso irresponsável de suas redes sociais.
A população sabe do que o País precisa e está atenta ao modo como Bolsonaro vem se portando. Depois da posse, não há mais espaço para a irresponsabilidade, seja no mundo real ou no virtual. Governar responsavelmente, eis sua única tarefa.