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Os extremos se tocam (por André Gustavo Stumpf)

A luta entre o nacional e o estrangeiro é antiga

Por André Gustavo Stumpf
2 mar 2021, 11h00

Os extremos se tocam no mundo da política partidária. No Brasil contemporâneo há exemplos eloquentes. Ao longo dos trabalhos da Assembleia Constituinte, em 1988, uma das discussões mais sérias, versava sobre a reserva de mercado na área de informática, que emergia na época como a grande novidade.

Era considerada a ferramenta para alcançar o futuro. Um grupo chamado de entreguista ou coisa parecida, defendia a abertura do mercado. Militares nacionalistas e a esquerda do parlamento advogavam pela manutenção da reserva de mercado, que excluía do mercado brasileiro aparelhos produzidos por grandes multinacionais do setor.

Na época surgiram algumas empresas brasileiras que chegaram a produzir computadores bastante razoáveis, mas tecnologicamente atrasados. O projeto era perseguir caminho semelhante ao dos tigres asiáticos que despontavam naquele período.

No Brasil, a reserva de mercado fomentou o contrabando e o surgimento de máquinas montadas em fundo de quintal. Empresas importavam peças e montavam computadores com marcas nacionais. Hoje existem poderosas marcas asiáticas, até chinesas o que na época ninguém poderia imaginar.

O Brasil abriu seu mercado e foi invadido por equipamentos importados. Alguns são produzidos aqui por conveniência do estrangeiro, debaixo de condições especiais.

A luta entre o nacional e o estrangeiro é antiga e tradicional. O Brasil foi colônia por mais de três séculos. O estrangeiro foi sempre um predador. Vinha para cá levar o que que havia de valor. Açúcar, ouro, prata, café, diamantes, pau-brasil, mulatas e papagaios. O Estado nasceu antes da sociedade.

As atividades comerciais sofreram pesadas regulações destinadas apenas a facilitar a vida do europeu. O brasileiro era um acidente, resultado da miscigenação do branco com índios e negros. Nas primeiras discussões sobre a independência, Angola e Brasil seriam um único país. Foi uma esperta tentativa de manter o tráfico de escravos com o assunto interno.

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A verdade é que sem Angola, não haveria Brasil. Ou de outra maneira, sem a mão de obra escrava, a colônia portuguesa não conseguiria satisfazer as necessidades da Corte.

A Petrobras é o símbolo maior do nacionalismo. O presidente Getúlio Vargas enviou ao Congresso, em 1953, o projeto de lei para criar a empresa de petróleo genuinamente nacional. Foi uma luta política em campo aberto com passeatas, discursos inflamados e grande mobilização.

Tão grande que os nacionalistas conseguiram criar, além da empresa, o monopólio estatal do petróleo. Ou seja, só aquela empresa poderia prospectar petróleo, refiná-lo e distribuí-lo no território nacional. É claro que a empresa não possuía recursos para realizar tantas tarefas. Só no governo Geisel, nos anos 70, ocorreu a abertura para o foi chamado de contrato de risco.

Estrangeiro poderia prospectar, onde a Petrobras, não pudesse. Na prática, terminou ali o monopólio da prospecção do petróleo.

No governo Fernando Henrique ocorreu abertura maior. Mas até hoje só a Petrobras possui refinarias que abastecem o mercado brasileiro. O Brasil exporta petróleo bruto e importa seus derivados porque não tem capacidade de realizar essa transformação aqui. Tudo isso custa dinheiro. O custo aparece nas bombas de gasolina e diesel.

O presidente, sem medir consequências, anuncia que pretende meter a mão na Petrobras. De um dia para outro, a empresa perdeu R$ 100 bilhões em valor de mercado. Suas ações desabaram, em 24 horas, 20% de seu valor. Acionistas estrangeiros e nacionais se movimentam para processar a direção da empresa por gestão ruinosa.

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Mas os resultados financeiros da empresa são excepcionais. Lucro espetacular no terceiro trimestre e perspectiva de um ganho robusto líquido no último ano, além da redução significativa do endividamento. O país está diante de uma situação extravagante, para dizer o mínimo. Empresa bem-sucedida é punida por conseguir obter resultados espetaculares.

Mas a esquerda, dirigentes do Partido dos Trabalhadores, apoia a decisão do presidente Bolsonaro. Eles enxergam no general designado um perfil nacionalista, que o identifica com as lutas pela criação da Petrobras e capaz de recriar as práticas do governo Dilma Rousseff.

Se a Embraer, que começou sua vida como empresa estatal, continuasse atrelada ao governo não teria saboreado o enorme sucesso de seus produtos em todo o mundo. A empresa opera como uma multinacional. É a terceira maior fabricante de aviões do mundo. Disputa mercado dentro e fora do país.

As estatais constituem reserva de mercado para políticos que tornam possível negócios suspeitos. No Brasil, a história não é percebida. Quem não aprende com as lições do passado tende a repeti-las. Seja por obtusidade córnea, má fé ou desinteligência dos extremos da direita ou da esquerda. Ou dos dois.

André Gustavo Stumpf escreve no Capital Político. Formado em Direito pela Universidade de Brasília (UnB), onde lecionou Jornalismo por uma década. Foi repórter e chefe da sucursal de Brasília da Veja, nos anos setenta. Participou do grupo que criou a Isto É, da qual foi chefe da sucursal de Brasília. Trabalhou nos dois jornais de Brasília, foi diretor da TV Brasília e diretor de Jornalismo do Diário de Pernambuco, no Recife. Durante a Constituinte de 88, foi coordenador de política do Jornal do Brasil. Em 1984, em Washington, Estados Unidos, obteve o título de Master em Políticas Públicas (Master of International Public Policy) com especialização política na América Latina, da School of Advanced International Studies (SAIS). Atualmente escreve no Correio Braziliense.

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