A semana começa com o orçamento aprovado pelo Congresso como o principal elemento de obstrução na pauta política. O ministro da Economia, Paulo Guedes, não ficou bem no episódio.
O ministro fez coro ao diagnóstico de que a peça aprovada pelo Congresso é inexequível, mas há sinais de que não a desconhecia e, mesmo, de que participou dos acordos que levaram à versão final.
Sua crítica ao orçamento soou como quebra de acordo entre os parlamentares e registrou o primeiro atrito grave com o presidente da Câmara, Arthur Lira. Mais cedo ainda do que ocorrera com seu antecessor, Rodrigo Maia, a quem Guedes creditou o fracasso da agenda econômica no Congresso no primeiro biênio do governo Bolsonaro.
Tudo leva a crer que Guedes, de fato, não desconhecia a versão final. Se não a aprovou expressamente silenciou, o que explica o ministério não ter enviado mensagem para corrigir os parâmetros da primeira proposta de Orçamento enviada, com índice de inflação e valor de salário-mínimo defasado.
Além disso, como demonstra artigo publicado no Valor na última quinta (1), do jornalista Ribamar Oliveira, por ocasião da tentativa de retirar o Bolsa Família da regra do Teto de Gastos, Guedes teria acertado R$ 16 bilhões em emendas adicionais. Subestimou assim R$ 17,5 bilhões em despesas obrigatórias – o que resultou nos R$ 22 bilhões que sobraram depois que o relator anunciou o corte de R$ 10 bilhões.
Por isso, a responsabilidade, agora, é do governo. Além da pressão política sobre Guedes – Lira e outros ficaram irritados com a posição dúbia do ministro e da sua equipe -, é importante observar a reação do mercado à percepção de que o ministro, no mínimo, flexibilizou sua postura fiscalista e colaborou para o Orçamento que, depois, tentou questionar.
O resultado é um impasse. O governo conta com alguma margem orçamentária e acredita, de fato, que gastará menos com a Previdência em 2021, mas sem saber quanto. A incerteza fiscal alertada pelo Banco Central está presente e dificilmente a solução será contábil, mas política.
Em entrevista ao Estadão no domingo (4), o presidente do Banco Central, Campos Neto, afirmou que a percepção de que o Orçamento da União é inexequível “confirma o risco político já presente no aumento para 0,75% da taxa de juros pelo Conselho de Política Monetária (Copom).
O Orçamento aprovado pelos congressistas confirmou esses temores ao escancarar seu viés eleitoral, combinando a subestimação das despesas obrigatórias com o aumento das emendas parlamentares. Para corrigir o rombo, alertaram os técnicos do governo, seriam necessários contingenciamentos tão profundos que poderiam paralisar a máquina pública.
Paulo Guedes tem um papel central no impasse. Quando as primeiras matérias deram conta idiossincrasia orçamentária, um analista de mercado afirmou que o episódio era tão absurdo que não se surpreenderia se a equipe econômica se demitisse a partir dele. Mais à frente, no entanto, revelou-se a participação da Economia na sua gênese.
Calamidade pública
É improvável que Lira volte atrás e faça uma redução adicional das emendas parlamentares no Orçamento em relação ao corte já anunciado por Bittar, de R$ 10 bilhões. Ir além o obrigaria a desfazer acordos com deputados por ocasião da aprovação de medidas difíceis e, mesmo, que alcancem sua eleição para a presidência da Câmara.
Sem a possibilidade de aumentar impostos para cobrir o rombo e sob ameaça de irregularidade fiscal, cresce a probabilidade de o presidente Jair Bolsonaro propor e de o Congresso aprovar novo estado de calamidade pública.
Leilões
Os leilões previstos entre 7 e 9 deste mês testarão o humor e a segurança dos investidores no país nessa fase de turbulência política e de pandemia. O governo, como se sabe, leiloará no período um conjunto de ativos que pode atrair R$ 10 bilhões em investimentos. Para ser ter uma ideia de grandeza, o orçamento do ministério de Infraestrutura para 2021 é de R$ 7 bilhões. São 22 aeroportos, 5 terminais portuários e a Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol), entre Ilhéus e Caetité, na Bahia.