O bolsonarismo é o principal divisor de águas na eleição para a presidência da Câmara, disputada pelo governista Arthur Lira (PP) e pelo rodriguista Baleia Rossi (MDB), que levou o apoio da oposição. No tapete azul, porém, o fator em torno do qual as forças políticas devem se organizar na disputa pelo comando do Senado é o lavajatismo.
Ao surpreender a todos lançando a candidatura da senadora Simone Tebet, uma estranha no ninho da maior bancada na Casa e defensora da agenda da Lava Jato, o MDB entrou para confundir. Tenta dar o troco no Planalto e no PT, que apoiaram — e acabaram por viabilizar — a candidatura do senador Rodrigo Pacheco (DEM), lançada pelo colega Davi Alcolumbre depois que sua reeleição foi inviabilizada pelo STF.
O MDB velho de guerra, que há dois anos perdeu para Alcolumbre, que se lançou com um discurso de renovação, acha que a presidência do Senado lhe cabe por direito, já que tem de longe a maior bancada — agora com 15 senadores. Mas percebeu que, graças a Bolsonaro e aos petistas, Pacheco cresceu e apareceu, e passou a temer ser derrotado por ele em plenário. É por isso que seu principal candidato, o líder Eduardo Braga, recuou e retirou seu nome da disputa, em favor de Tebet.
Não que Braga, Renan Calheiros e a maioria de seus colegas, tenha um relacionamento bom ou maiores afinidades com a senadora, que é próxima do grupo Muda Senado, um dos principais defensores de Sergio Moro e da Lava Jato na Casa. Simone Tebet, que presidiu a CCJ pelas mãos de Alcolumbre, vive às turras com seu próprio partido, sobretudo nas questões relativas ao combate à corrupção. Ela defende, por exemplo, a prisão após a condenação em segunda instância, enquanto boa parte dos emedebistas no Senado é contra. Afinal, foram investigados ou andaram tendo problemas com o pessoal de Curitiba. Simone e Braga, ou Simone e Renan, por exemplo, são água e azeite. Difícil misturar.
Como, então, o MDB lançou a senadora para presidir a Casa, e por unanimidade? É que, no jogo emedebista, mil vezes mais sofisticado do que o de Jair Bolsonaro, por exemplo, Simone Tebet é uma candidata boa para ganhar e boa para perder. Ela leva o apoio do Muda Senado, com quase vinte senadores, e deve atrair também o PSDB, o Podemos e o Cidadania. Sai com cerca de 38 votos, um pouco mais do que teria já oficialmente seu adversário. E se ganhar? O partido acha improvável, mas, se isso acontecer, acredita ter meios para controlar uma gestão Tebet. — até porque o apoio interno à sua candidatura foi bem negociado por Braga e outros. Nessa estratégia, o MDB, que está extremamente irritado com o governo, terá a faca e o queijo na mão — a primeira, para encostar no pescoço de Bolsonaro; o segundo, claro, para comer.
A hipótese de vitória de Tebet é considerada improvável, embora isso não seja admitido publicamente pelos emedebistas. Eles apostam que os partidos ligados ao governo e o próprio PT — ineditamente no mesmo barco de Bolsonaro — vão se movimentar muito nos próximos dias para não perder. Afinal, temem, acima de tudo, a vitória do grupo ligado à Lava Jato e a Moro no Senado, que pode desenterrar iniciativas como a volta da prisão em segunda instância e diversas CPIs para investigar integrantes do Executivo e do Judiciário. Não por acaso, o senador Flavio Bolsonaro é um dos cabos eleitorais de Pacheco.
E o que o Planalto faz para ganhar? Isso mesmo, o que já está fazendo de forma mais evidente na Câmara: dar cargos, verbas e etc em troca de votos. Ministérios e outras coisinhas mais devem rolar para os ressentidos do MDB — e, do jeito que a armadilha foi desenhada, em caso de derrota ou de vitória de sua candidata. .
Helena Chagas é jornalista