Ao contrário das primeiras leituras, o fim da interlocução do ministro da Economia, Paulo Guedes, com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, mais ajuda que atrapalha o governo. Diminui o protagonismo de Guedes, mas abre espaço para que a opção pela política feita pelo presidente Bolsonaro se desenvolva.
Ainda recente, esse movimento alça à liderança política do governo o experiente deputado Ricardo Barros (PP-PR) e marca o fim de um ciclo em que a interlocução do governo com o Congresso foi exercida pela área econômica.
Por extensão, o rigor teórico de Guedes com gastos, já atingido pela pandemia, torna-se agora preocupação secundária do governo. Vence a linha de flexibilização do programa original de ajuste fiscal e das privatizações que, malgrado sua característica errática, sucumbe ao DNA de um governo que não comunga da doutrina liberal.
Maia é político, Guedes jamais o será. Por isso, o presidente da Câmara se antecipou e anunciou que a interlocução acabara. Assim, marca Guedes como o obstáculo aos avanços no Legislativo – ou, no mínimo, responsável pela lentidão na tramitação das reformas.
A confirmar esse roteiro, o ministro da Economia diz que se recolheu e se “enquadrou” em um regime de articulação política, o que nem precisaria de tradução. Guedes explicita que a economia está, a partir de agora, submetida a uma condução política contra a qual se insurgira, mas que finalmente se impôs.
O novo líder governista na Câmara foi mais explícito: “o que estava acontecendo muitas vezes é que a economia avançava em determinados pressupostos nas negociações com o Parlamento e depois o governo, ouvindo outros ministros, tinha opinião diversa”. Ou seja, a corrente interna pró-gastos são os “outros ministros”.
O fato é que o governo precisa avançar com uma agenda que reúne o pacto federativo (que contorna o teto de gastos), a ampliação do bolsa-família, a reformulação das carreiras do funcionalismo e, ainda, decidir se avança com a ideia do novo imposto – a velha CPMF. Uma pauta que, mesmo negociada, é eleitoralmente pesada.
Muda, portanto, a linha inicial de confronto em que o governo anunciava, via Guedes, um plano de intenções e culpava o Congresso por sua frustração. Acaba também o conceito de superministro, já abalado com a demissão de Sérgio Moro, e agora sepultado com o enquadramento de Guedes.
Essa é a parte saudável da mudança, porque a ideia de personagens com superpoderes só é legal nos gibis infantis. Na vida real, fora da política não há salvação e rejeitá-la é uma forma de fuga.
Guedes é, agora, um dos ministros de um governo pouco a pouco capturado pelo pragmatismo que recusou no discurso enquanto foi possível vender ilusão.
João Bosco escreve no Capital Político.