Assine VEJA por R$2,00/semana
Imagem Blog

Noblat Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO

Por Coluna
O primeiro blog brasileiro com notícias e comentários diários sobre o que acontece na política. No ar desde 2004. Por Ricardo Noblat. Este conteúdo é exclusivo para assinantes.
Continua após publicidade

A hora de fazer escolhas (Por Leonardo Barreto)

Bolsonaro chegará em 2022 em condições eleitorais competitivas?

Por Leonardo Barreto
Atualizado em 18 nov 2020, 19h57 - Publicado em 18 set 2020, 11h00

Compreende-se que o momento é difícil e desafiador. Mas também se sabe que a realidade é implacável e para não depender apenas da sorte é preciso ter capacidade de entendê-la e interagir com ela onde for possível. Dito isso, pergunta-se: Bolsonaro chegará em 2022 em condições eleitorais competitivas?

Se olharmos para seus índices de popularidade registrados nas pesquisas,a pergunta pode não fazer sentido agora. Segundo estudo XP/Ipespe divulgado nesta semana, seu governo alcançou 39% de menções ótimo + bom, igualando seu melhor momento, no início de 2019.

Quando se considera a série histórica, no entanto, percebe-se que sua melhora coincide com o pagamento do auxílio emergencial, uma transferência de renda brutal que pode chegar a R$ a 322 bilhões até o final do ano. Isso equivale a quase 10 vezes ao orçamento total do Bolsa Família em 2019.

O conforto material trazido a boa parte da população e a paciência do mercado com os gastos necessários equivalem, no entanto, à calmaria que, dizem, antecede tempestades.

Continua após a publicidade

A conta é salgada e o Tesouro Nacional já enfrenta dificuldades para rolar a dívida. Embora a tática de criar um “orçamento de guerra”, idealizada pelo presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, tenha cumprido o papel de evitar a criação de despesas permanentes durante a crise de saúde, já está claro que o país não conseguirá seguir adiante observando apenas o teto de gastos, sem executar um choque fiscal.

O tema foi exposto de forma crua por Maia em artigo publicado pela Folha de S. Paulo no último domingo (13). Mesmo debaixo do teto, o déficit primário de 2021 deve girar em torno de 3,3%. Os gastos discricionários, que podem ser alvos de contingenciamento, já estão praticamente zerados e, portanto, seria o momento de atacar as despesas obrigatórias por meio de da adoção dos três Ds: desvincular, desindexar e desobrigar.

É curioso que, no conteúdo, Maia tenha defendido algo da mesma natureza que o secretário especial do ministério da Economia, Waldery Rodrigues, advogou. De forma descuidada, mas realista do ponto de vista econômico, ele sugeriu a desindexação de aposentadorias por dois anos para viabilizar o fundo de sustentação do Renda Brasil, programa que estenderia a marca distributivista de Bolsonaro indefinidamente.

Continua após a publicidade

O mecanismo é o mesmo. Rodrigues “apenas” avançou o sinal mostrando o que seria possível fazer.

A questão de fundo é aquela que todo presidente que assumiu o país desde a aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal (2000) conhece, mas tenta evitar a todo custo: os gastos obrigatórios terão de ser enfrentados. Isto é, será preciso deixar de garantir recomposição para aposentadorias pela inflação ou pelo índice de correção do salário mínimo e extinguir percentuais mínimos do orçamento para a saúde e a educação.

Embora, na prática, isso signifique dar enormes parcelas de poder e responsabilidade aos políticos, que teriam que definir quanto dinheiro cada política pública do país receberia todos os anos, mexer nas regras de engessamento do gasto público parece um pesadelo político, como demonstrou Bolsonaro ao rechaçar violentamente Waldery, mesmo a ideia tendo como objetivo valorizar a marca social do seu governo.

Continua após a publicidade

Mas, indo ao que importa, este dilema eterno da sociedade-Estado brasileira será enfrentado? Antes de responder, é útil passear por três questões absolutamente pedagógicas sobre o funcionamento deste governo.

Primeiro, o ministério da Economia vive buscando brechas para aprovar suas teses, criando espécies de “pegadinhas”. Valdery, possivelmente combinado com o ministro Paulo Guedes, quis aproveitar a missão de achar dinheiro para financiar o Renda Brasil e tentou emplacar uma desindexação. O mesmo tipo de estratégia verifica-se, por exemplo, quando se busca desonerar a folha de pagamentos na reforma tributária, já que na da Previdência não deu.

O segundo aspecto é a dificuldade aparente que o presidente Bolsonaro tem de compreender as necessidades da economia e medidas correspondentes (o que talvez estimule Guedes a montar pegadinhas). Também por mais de uma vez, Bolsonaro demonstra surpresa e recua em cima da hora de ações que o ministério da Economia já estava debatendo publicamente há tempos. O caso da unificação dos benefícios sociais em apenas um – de novo o Renda Brasil – é outro exemplo.

Continua após a publicidade

Parece haver uma dinâmica funesta na forma que Guedes e Bolsonaro tomam decisões. O ministro apresenta uma ideia o presidente não entende completamente, mas autoriza o seu prosseguimento. Quando ela finalmente vira um projeto e algum setor grita, Bolsonaro cai em si e, verdadeiramente surpreendido, recua na iniciativa.

Essa hipótese combina com o movimento realizado na semana passada de colocar mais gente na conversa entre Guedes e Bolsonaro, como os ministros Luiz Eduardo Ramos, Braga Netto e o líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros. Talvez seja necessária a presença de tradutores na sala, que tenham capacidade de compatibilizar raciocínios políticos e econômicos, para que Planalto e Economia passem a cooperar (e não competir!).

Por último, pode ser que Bolsonaro também não tenha se despido completamente da roupa de deputado e vestido a de presidente. Um parlamentar luta por grupos, por segmentos, porque o tipo de eleição que ele disputa o estimula a fazer isso, pois ele ganha uma cadeira com o apoio de pequenas parcelas da sociedade. Um presidente é escolhido pela maioria absoluta dos participantes e precisa pairar sobre os grupos, muitas vezes contrariando-os.

Continua após a publicidade

O fato é que Bolsonaro tem muito receio de enfrentar grupos, mesmo que isso favoreça o todo. Na reforma da Previdência, por exemplo, foi grande o seu esforço para salvar categorias específicas, mesmo correndo o risco comprometer a aprovação do projeto como um todo. Talvez isso indique uma dificuldade de pensamento abstrato, que só repara nos gritos dos grupos de interesse e não consegue projetar os benefícios gerais de uma política.

De todo modo, como disseram Maia e Waldery, o momento de desafiar os gastos obrigatórios chegou. A capacidade de administrar o problema está no limite e calhou de a missão cair no colo de Bolsonaro. O teto de gastos obriga a fazer escolhas. Não se trata de se, mas quando.

Daí volta a 2022 e ao futuro de Bolsonaro. É preciso responder questões objetivas. Ele reconhece o limite das contas públicas? Provavelmente, sim. Ele tem condições de endereçar soluções ao Congresso Nacional? Possivelmente, considerando a natureza reformista dessa geração de parlamentares e a recomposição empreendida nos últimos meses.

Tem sofisticação para entender o caminho? Talvez precisa se cercar de assessores capacitados a traduzir os dilemas e explicar-lhe francamente os desafios e soluções. “Pegadinhas” não são o caminho. Tem coragem política para fazer o que é necessário? Aí ele precisa se libertar da pressão dos grupos e não pensar em reeleição por um momento.

Se continuar imobilizado – esta é sua posição atual – permitirá um agravamento do problema. Se deixar de usar a popularidade que tem agora para aprovar medidas importantes, perderá o tempo da ação. Com problema de solvência e inflação, perderá sustentação e pode até não chegar a 2022. Os liderados podem dar-lhe as costas – e provavelmente o farão – quando acabar o auxílio emergencial e perceberem que não há emprego disponível.

Leonardo Barreto é doutor em Ciência Política pela Universidade de Brasília (UnB);  https://capitalpolitico.com/

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Domine o fato. Confie na fonte.

10 grandes marcas em uma única assinatura digital

MELHOR
OFERTA

Digital Completo
Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 2,00/semana*

ou
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba Veja impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 39,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$96, equivalente a R$2 por semana.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.